Enter The Void

B Pilgrim
Iandé
Published in
5 min readApr 15, 2018

O que é uma “experiência estética” ?

Para começarmos a falar em “experiência estética” é preciso, primeiramente, definir o que é e como se manifesta. A meu ver, tem como definição “uma manifestação essencialmente artística que estabelece uma relação com o espectador”. Se tomarmos as definições do dicionário de “experiência” e “estética” separadamente e as juntarmos, teremos; “um conhecimento obtido por meio dos sentidos da arte da filosofia voltada para a reflexão a respeito da beleza sensível e do fenômeno artístico”, ou até mesmo, de forma mais simplificada; “uma beleza harmoniosa das formas e/ou das cores, a qual é captada por meio dos sentidos”. Em ambas as definições, podemos destacar três palavras-chave; “sentidos”, “beleza” e “arte”. Uma vez que “beleza” é algo dificílimo de definirmos, prefiro deixá-la de lado e falar apenas em “arte” e “sentidos”.

Deste modo, podemos dizer que qualquer manifestação artística pode ser chamada de uma “experiência estética”. Porém, enfrentamos outro impasse; cabe ao juízo de gosto de cada um definir o que é “arte”. Eu, diante desta questão, procuro sempre considerar tudo o que se diz arte como arte, ou seja, se o indivíduo classifica sua produção como uma obra de arte, quem sou eu para julgá-la e tirar dela esta classificação.

Minha experiência estética

Como exemplo daquilo que defino como experiência estética, escolhi o filme “Enter the Void” escrito e dirigido por Gaspar Noé. Uma vez que, para mim, o cinema é a experiência estética mais completa, pois promove um diálogo entre diversos sentidos, como a visão e a audição, optei por um filme que acredito ser extremamente rico nesse aspecto e quanto à conexão que estabelece com o espectador.

O que o define, a meu ver, tão fortemente como uma experiência estética está, em um primeiro momento, já é apresentado em sua premissa. O filme tem como personagem principal Oscar, um jovem traficante de drogas que reside em Tokyo com sua irmã Linda, a qual trabalha como stripper. O filme, porém, se desenrola de fato, a partir do fim do primeiro ato, momento em que Oscar é traído por um de seus amigos e morto por policiais, na perspectiva de sua alma, a qual observa as repercussões de sua morte além de buscar por reencarnação. A narrativa estabelece portanto uma conexão com a espiritualidade e com a crença do pós-morte, no caso, budista. Deste modo, podemos observar que, apesar de apresentar uma narrativa, pode ser considerado como um filme experimental, especialmente ao analisarmos as cenas (como a inicial), nas quais Oscar está sobre efeito de drogas.

O filme inicia-se com um letreiro o qual, assim como o restante do filme, é extremamente caótico, apresentando cores neon e palavras que se movimentam com rapidez. O fator mais impressionante neste letreiro é sua duração de 2:20, uma vez que, embora chegue a ser cansativo, é de extrema importância ao analisarmos o filme por completo. Além disso ele é acompanhado por uma música bem “marcada” e igualmente caótica.

(https://www.youtube.com/watch?v=wNtxgxYY7sI)

Desde seu início podemos observar que o roteiro é acompanhado por uma decupagem interessantíssima, a qual nos permite ver o rosto de Oscar apenas quando ele se olha no espelho, uma vez que a câmera o segue sempre de costas ou subjetivamente. Além disso, há a utilização de diversas câmeras aéreas, reforçando, portanto, a ideia de que o espectador segue a visão da alma do personagem, a qual divaga através da história, contada de forma não-linear, apresentando inclusive cenas da infância do personagem com sua irmã, Linda.

Enter The Void (2009)

A utilização destas câmeras aéreas nos faz ter uma sensação de “inclusão” no filme, deste modo, somos colocados de fato no lugar de Oscar.

Enter The Void (2009)

Outro fator que é de extrema importância para a concretização de seu objetivo de não somente ser um filme essencialmente narrativo como também uma experiência estética é sua paleta de cores. Ela, a meu ver, é uma das mais incríveis que já vi no cinema, uma vez que utiliza quase majoritariamente de cores contrastantes, vivas e neon, porém sem anestesiar o espectador de modo que ele não deixa de perceber em nenhum momento a presença da narrativa.

Estudo da Paleta de Cores

Cinematografia por Benoît Debie

HOME.

O filme Enter the Void é muito importante para mim não somente por ter mudado completamente minha visão sobre o cinema produzido no século XXI, mas por ter me servido de inspiração no processo criativo de escrever o roteiro do curta que pretendo dirigir no próximo semestre.

Além de haver pontos em comum em seus objetivos, uma vez que ambos tratam de uma experiência espiritual, porém sem haver uma narrativa clássica em HOME., decidi utilizar da mesma paleta de cores do filme, não somente por achá-la incrível, mas para prestar homenagem tanto ao diretor quanto ao cinematógrafo, artistas que admiro profundamente.

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