Fadas e Duendes

Marcella Didier
Iandé
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4 min readApr 22, 2019

Ao centro da Bahia, no coração da Chapada Diamantina, há um lugar chamado Vale do Capão. Dizem ser o lar de seres exóticos e pessoas magicas, o que atrai turistas desde a própria Bahia a viajantes além mar. Não foi diferente com minha família e eu, que fugimos do carnaval de 2017 para experimentar um pouco de paz numa casa na própria vila do Vale.

O Vale, onde sempre quisera ir, deveria ser, para mim, uma fonte imensa de animação e alegria, a qual minha mãe finalmente estaria me proporcionando. Minha cabeça, entretanto, não poderia estar mais longe da viagem. Os dois meses que antecederam nossa aventura estavam sendo extremamente difíceis de lidar; Essas coisas da vida, família, decisões e si próprio: motivos não faltaram para meu estado depressivo. Havia atingido o infame fundo do poço (o fundo do poço de uma menina de 17 anos, vale ressaltar), completamente desesperançosa em relação ao meu futuro e a mim mesma. Ainda assim, fui.

Certa manhã, já no Capão, levantei ao som da minha família se arrumando para uma trilha, a fim de chegar numa cachoeira conhecida como Purificação. Levantei meu espírito e o meu corpo da cama e, sem tempo de arrumar a minha franja mal cortada, fui junto à quatro casais (um deles sendo de cachorros) ao encontro da cachoeira.

cachoeira da purificação, por Drica Oliveira

Chegamos no local da trilha; compraram doces de jaca enquanto eu esperava perto ao rio, observando os viajantes e o som do fluxo de água que seguia seu trajeto, despercebida. Adentramos a mata, subimos morros pedregosos e, após quase nos perdermos, chegamos à Cachoeira da Purificação. A água estava extremamente gélida, e todos tomamos um tempo para descansarmos à beira d’água.

Alguns minutos se passaram e o filho mais velho do meu padrasto, que conhece bem a região, apontou para uma placa de “perigo” e disse que, subindo a colina atrás do aviso, havia duas cachoeiras famosas: a Fadas e a Duendes. Alertou que o caminho era perigoso e desconhecido por muitos, mas que iria e levaria quem quisesse. Eu, que estava calada até agora, prontamente levantei e aceitei o convite, ignorando, pela primeira vez, os protestos da minha mãe. Não tinha nada a perder, pensei.

Fadas

Subimos eu, meu novo irmão, sua namorada e os dois cachorros. Subimos o monte arriscado, passamos por um despenhadeiro (do qual eu quase caí) e chegamos em Fadas, nosso primeiro destino. Pulamos por entre as pedras da cachoeira, tendo que passar os cachorros por nossas mãos para que chegássemos do outro lado. Subimos as pedras escorregadias e enfim chegamos no ponto alto da trilha: Duendes.

Duendes

Não conseguiria verbalizar a sensação que tomou conta de mim quando finalmente vi a cachoeira, escondida de tudo e de todos, em sua grandiosidade e magnitude. Me senti pequena e, ao mesmo tempo, em paz. Eu, junto a outros viajantes que percorreram o mesmo trajeto que nós, ficamos conversando e admirando as águas límpidas que caia nas rochas e em nossos corpos.

Me levou o caminho de volta inteiro, já à noite, chegando à vila do Vale do Capão e vendo aquelas pessoas, de carne e osso e franjas mal cortadas, dançando, fumando, se abraçando e vendendo pedras energizadas de amor e paz, para eu perceber que eu não apenas pertenço ao mundo, como à mim mesma. Minha experiência me apresentou à minha curiosidade, coragem, paixão; à paz que se sente ao agir em verdade ao seu ser e ao entrar em contato com pessoas que, assim como a natureza, te encontram em alma e espirito. Mas principalmente, experimentei em primeira mão a sensação de que, quando sente-se que não tem mais nada, terei sempre à natureza e à mim mesma.

Fotos tiradas na manhã seguinte, por mim mesma, de mim mesma.

Marcella Didier F. S. (Céu)

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