Pela primeira vez na Eternidade

por Giovana Morais Chaparro

Giovana Morais
Iandé
4 min readApr 15, 2020

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Ao ser humano foi dada a capacidade de simbolizar. Antigamente, simbolizar para sobreviver; hoje, para satisfazer. Satisfazer o desejo de nos sentirmos, ou até mesmo de sermos, eternos.

Se há algo simbólico na existência dessa tão idealizadora espécie, é o aniversário. Comemorar um ano de existência, parabenizar-nos por termos enfrentado mais um ano e, principalmente, fazer projetar na mente a linha do tempo de nossas vidas, e assim, fazer-nos refletir sobre os nossos próprios passos (passados, e agora os futuros).

Para as garotas, há uma espécie de rito de passagem da infância para a vida adulta: os 15 anos. Nesta fase, as debutantes, como costumam ser chamadas, costumam fazer festas com vestidos longos e curtos, saltos altos e danças para mostrar a sua transformação de menina para mulher. A comemoração é marcada por muita emoção, nostalgia e confiança no futuro que está por vir.

Todavia, há algumas garotas que não lidam muito bem com o luto da infância perdida e decidem, então, comemorar a passagem para a vida adulta justamente revivendo esses momentos. Eu e minha amiga fomos uma delas.

Eu e Mayra, crianças.

Eu conheci a Mayra ainda muito criança, nós morávamos na mesma rua e logo eu descobri que ela é apenas um dia mais velha do que eu. Isso significa que todos os nossos aniversários seguintes foram comemorados juntos. Conforme crescemos e fomos conhecendo o mundo, juntas criamos o nosso próprio refugio, o nosso próprio universo onde as coisas aconteciam conforme a imaginação pedia.

Se o lado direito do cérebro é o grande responsável pela imaginação, para nós ele era o único lado existente. Juntas enfrentamos aventuras perigosas, estávamos dentro das mais malucas histórias dos filmes de animação, criamos músicas desafinadas e coreografias desengonçadas para mostrar aos nossos pais. Tudo isso até que… crescemos. E doeu, como doeu o peso das responsabilidades. Mas nem tudo estava perdido.

Embarque do aeroporto das duas famílias.

De todas as histórias que criamos, restou apenas uma que não poderíamos viver com ajuda da nossa imaginação, pois desta vez a própria história iria concretizar tudo o que um dia sonhamos ser real: sonhávamos em comemorar os nossos 15 anos na Disney. E assim foi, com muito planejamento e dias de reuniões e pizza para fazer o roteiro. Acabou que nossas famílias abraçaram tanto nossa ideia que o sonho se torno geral.

A viagem foi marcada por uma única palavra: gratidão (clichêzinho batido, eu sei, mas foi assim mesmo). Gratidão por termos condições de tornar aquilo viável, pela nossa amizade, por estarmos indo, juntas, sonhar “Where The Dreams Come True”.

Uma das formas que a espécie humana encontrou de expressar a gratidão foi por meio do choro, mas acho que as coisas saíram um pouco do controle quando a ficha caiu que de fato aquilo estava acontecendo, era choro e emoção pra todo o lado.

Jantar Bela e a Fera

Ficamos no hotel da pequena sereia, a minha princesa preferida quando criança, e íamos ter o jantar da Bela e a Fera, princesa da Mayra. Sim, o “reviver o passado” foi levado muito a sério.

No geral, os dias estavam sempre preenchidos com uma série de atrações. Era correria pra lá e pra cá, almoços rápidos, dor nos pés… mas a cada ponto cumprido a sensação trazida pela experiência fazia valer a pena. Para as mentes que sonham (e para aquelas que não tem medo de altura) é muito fácil acreditar que você está de fato no meio de uma batalha no espaço ou voando por Hogwarts. Alguns dias tinham recompensas para a correria das manhãs: as tão famosas queimas de fogos no castelo.

Queima de fogos do 4 de julho — Magic Kingdom

Aqui, é onde sinto que a simbolização da experiência encontra o seu auge. Elevar a cabeça e os olhos aos céus sempre teve grande importância simbólica para toda e qualquer sociedade humana. O estouros dos fogos sincronizados com a batida da música fazem parecer que o coração bate no mesmo ritmo; ou melhor: que há fogos coloridos dentro do nosso próprio peito.

Hoje, eu e a Mayra completamos um pouco mais de três anos sem nos ver, ela mudou de país. E assim como doeu perder nossa infância, doeu perder a presença dela. A viagem aconteceu apenas seis meses antes dela se mudar e eu não poderia ter pedido melhor despedida, como se o nosso “adeus” fosse o reviver todos os nossos longos anos de amizade de uma só vez.

Agora, mesmo maiores de idade, o sonho continua o mesmo: poder nos rever e poder acrescentar novas páginas ao nosso eterno mundo de fantasia. Retomo aqui, no fim desta publicação, a primeira ideia apresentada: foram momentos em que nos sentimos, e até mesmo fomos, eternas.

Mayra, Marisa (irmã da Mayra) e eu — Magic Kingdom

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