Três da Tarde em São Paulo: Artacho Jurado

Sofia Leonardi
Iandé
Published in
4 min readOct 13, 2018
Cobertura do Edifício Viadutos, Centro

Uma experiência estética marcante em relação a um objeto, obra, exposição, filme ou qualquer coisa que pode ser percebida através dos sentidos, pode não ocorrer apenas um vez, e sim toda vez que nos encontramos defronte ao mesmo, como no meu caso.

Pretendo expor a maneira como os edifícios do arquiteto João Artacho Jurado, me afetam diariamente, toda vez que caminho pelas ruas em que estão dispostos e paro para observá-los. A estética que envolve suas fachadas envolvem muito mais do que apenas uma camada exterior, mas sim, revelam muito do espírito da época, da forma como o modernismo arquitetônico se desenvolvia e se caracterizava. Dessa forma, a arquitetura é capaz de caracterizar uma era inteira, já que associamos os "exteriores", com objetos substanciais e palpáveis, com fatores "interiores", históricos que ocorriam na época em que foram construídos, formando assim um verdadeiro "cenário".

João Artacho começa seu trabalho nos anos trinta, mas teve a maioria de seus edifícios construídos durante as décadas de 40 e 50. O arquiteto tem um traço ímpar e exótico, marcas de estilo que tornam suas obras facilmente reconhecíveis onde quer que estejam por serem extravagantes e ao mesmo tempo minimalistas, como por exemplo, as curvas, figuras geométricas (principalmente nas varandas), cores impactantes na composição como o azul royal, amarelo, rosa e vermelho, pastilhas, grandes pilares, paisagismo repleto de verde e prédios com estrutura monumental, que se distinguem da maioria, destacando-se quase como instalações de arte distribuídas pelos bairros do centro de São Paulo.

Edifício Planalto, Centro
Pátio do Edifício Bretagne, Higienópolis
Edifício Viadutos

“Sua arquitetura reflete os sonhos hollywoodianos do pós-guerra em uma mistura de estilos e linguagens: o moderno, o nouveau, o déco e o clássico” — fonte: site urbanices.wordpress.com — a São Paulo de João Artacho Jurado.

Pessoalmente, minha experiência ao me encontrar em frente a uma obra de Artacho, limita-se às fachadas e à pesquisas para visualizar seus interiores, mas que ja me parecem suficientes para projetar significados e até mesmo romantizar as mesmas, algo que vai além da história em sim, mas que tem fundo em minha própria memória afetiva.

Por minha mãe ser arquiteta, sempre tive uma relação mais íntima com essa forma de arte, daí parte de mim, uma atenção maior à mesma, que na maioria das vezes pode passar despercebida, “ignorada” por ser parte integrante da cidade, por não ser um exposição temporária, e sim permanente. Além disso, minha família, em especial meus avós, tem uma certa “tendência” a viver em casa exóticas, com cores marcantes e fortes traços modernistas, que impactam o ambiente de tal forma, a ponto de que dizem muito sobre quem o habita, revelando os interiores subjetivos, através dos exteriores objetivos.

Parque das Hortênsias

Dessa forma, toda vez que estou junto a um desses edifícios, me vêm instantaneamente memórias de uma época em que não vivi, projetando minha subjetividade, proveniente de uma lembrança familiar experimentada apenas por fotografias, que me acrescentam histórias idealizadas que transformam a São Paulo que me rodeia, impessoal e distante, em algo íntimo e familiar, uma ponte feita basicamente por linhas, formas e cores, que de alguma forma tem a capacidade de me levar a outro plano.

Seja o Piauí, Cinderela, Bretagne, Viadutos, Planalto, Parque das Hortênsias… é sempre para mim, inevitável fazer projeções, criar histórias para os moradores, voltar no tempo como em “Meia noite em Paris”, só que “Três da tarde em São Paulo”. A fator exótico instigante e a particularidade de cada edifício tem tal efeito em mim, além de cada um, gerar uma sensação diferente, com histórias e personagens diferentes, apenas por se distinguirem esteticamente, ao mesmo tem em que não o fazem, que são “iguais”. A impressão é que, morar em um edifício assinado por João Artacho, é morar dentro de uma obra de arte, é morar em um outro tempo, em uma São Paulo em preto e branco, em uma São Paulo à parte de seus problemas, em uma São Paulo mais fresca, ao som de jazz o tempo todo, em uma São Paulo habitada apenas por avós e mães arquitetas.

Parque das Hortênsias

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