Um mês “isolado”

Leonardo Asvolinsque
Iandé
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5 min readNov 23, 2019
foto tirada na primeira semana.

Após passar anos e anos inserido no meio das redes sociais, decidi tomar um passo para trás e me abster desses ambientes. Confesso que ficar horas e horas dos meus dias atualizando os feeds do twitter e do instagram me gerava uma ansiedade incalculável. Essa ansiedade vinha na forma de vários fatores como imagem própria, produtividade e relações pessoais. Porém eu estava tão acostumado com esse sentimento, que me retirar das redes parecia uma ideia extremamente distante. Entretanto, indo contra todas minhas vontades, resolvi me desprender dessa dependência que controlava todo meu tempo livre (até momentos onde eu devia estar com a cabeça focada em alguma atividade como uma aula, um filme, ou um disco).

O motivo desse desprendimento foi a busca pela retomada de uma certa clareza mental que, em minha lembrança, só era presente em momentos bem distantes. Momentos onde eu tinha a capacidade de efetivamente aproveitar meu tempo livre, ocupando minha cabeça com pensamentos que de fato me traziam algo de relevante. Então, no dia 10/10/19, eu Leonardo Asvolinsque deletei todas as minhas redes sociais e me joguei de cabeça nessa jornada que durou um mês. E isso foi feito na esperança de retomar sensações tão antigas para mim, que relembrá-las seria como senti-las pela primeira vez.

Então, lá fui eu, quinta-feira a noite. Não podia ver o que meu amigos estavam fazendo ou qual era o meme do momento. Então botei meu celular no modo avião e iniciei a leitura do livro “Poética” de Aristóteles e automaticamente pensei “wow, leonardo, fazia meses que você não pegava um livro sem uma certa procrastinação, você está de parabéns”, lembro que esse acontecimento me fez sorrir. Na Sexta-feira, experienciei meu primeiro evento social sem estar com os ladrões de atenção baixados no meu celular. Devo dizer que minha vontade de retomar uma sensação antiga foi atingida no segundo dia de experimento. Eu conversei com as pessoas como não conversava a anos, e de fato me senti presente naquele lugar. Quando meus amigos trocavam o foco para a tela do celular, eu fazia de tudo para roubar de volta a atenção para que a conversa continuasse. É extremamente estranho relatar mas, enquanto estava conversando com eles, eu sentia que tinha algo relevante a dizer. Não estava comentando uma foto que a menina x publicou ou o vídeo engraçado que o menino y compartilhou. Eu sentia uma certa inquietação que vinha de dentro de meu peito, inquietação que devia ser liberada sobre meus amigos. Era uma vontade extremamente pura, era a vontade de me comunicar. A noite tinha sido realmente memorável. No caminho para minha casa encostei a cabeça vidro do carro e coloquei a belíssima “something to believe” da cantora Weyes Blood para tocar em meus fones de ouvido. Isso pode até parecer romântico demais mas eu me lembro nitidamente de ter apreciado essa música no caminho para minha casa. Talvez essa memória tão nítida do acontecimento seja fruto da presença no aqui e agora da situação.

Tédio. Ao longo dessa experiencia eu senti dois tipos de tédio. O tédio positivo e o tédio negativo. Primeiramente vamos abordar o positivo. Antes, quando eu estava entediado (basicamente maior parte do meu dia), minha primeira reação era puxar o celular do meu bolso e abrir o twitter na busca de uma recompensa neuronal instantânea. Porém, durante a experiência eu não tinha permissão para fazer isso. Nos primeiros dias o hábito de puxar o celular e checar meu Feed de notícias ainda estava enraizado em minha rotina. Porém com o passar dos dias me livrei desse hábito e comecei a transformar o ”tédio” em momentos de extremo lazer, já que usava do mesmo para fazer coisas que sou apaixonado, como escutar um disco, assistir um filme ( nunca vi tanto filme na minha vida, françois truffaut ficaria orgulhoso ) , ler um livro ou produzir música. Havia anos que eu não tinha esse ímpeto de produtividade. A ultima vez que ele havia se manifestado foi quando decidi ser cineasta em 2013 (período da minha vida que gastava todo meu tempo vendo filmes ou lendo sobre cinema).

Entretanto, também experienciei o tédio desagradável. Sem as redes sociais, fiquei completamente isolado, Eu moro sozinho e meus amigos paulistanos moram relativamente longe. E, quando essa essa solidão não estava sendo utilizada para estímulo de produtividade ela estava sendo um caminho para pensamentos desagradáveis. Como já diz o ditado popular: mente vazia é oficina do diabo. Meu ponto é que com a falta de estímulos anestesiantes que eram causados pela minha constante atenção à redes sociais, eu era obrigado a ficar cara a cara com minhas questões mais obscuras . Mas eu digo que isso é um fator desagradável porque fui de certa forma obrigado a lidar com essas questões internas que me assombraram por anos. Porém, sem impasses, nem sequer saberíamos oque é uma passagem. Logo esse tédio foi fundamental para que eu achasse meios eficientes de lidar com esses problemas. Então, até quando o tédio era desagradável, ele era uma experiencia extremamente rica para meu crescimento pessoal.

Na terceira semana comecei a realmente sentir falta de uma coisa. Não das redes sociais mas sim de minhas interações com amigos de minha cidade natal, Cuiabá MT. Falta que não senti em relação aos meus amigos de São Paulo, já que os vejo praticamente todos os dias. A interação por meio das redes era a única maneira de me manter conectado com meus amigos de Cuiabá. E o fato de eu ter abandonado as redes, estava me afastando das pessoas que eu amo. Outra coisa que me incomodou profundamente nessa experiência foi a falta de informação em geral. Por exemplo um dos meus artistas contemporâneos prediletos “Earl Sweatshirt” lançou um álbum inteiro e eu só fiquei sabendo três dias depois de seu lançamento. Esses dois fatores foram determinantes para que minha vontade de voltar às redes sociais aumentasse.

Alcancei o fim do experimento. Destravei minhas contas e baixei todos os aplicativos. Foi uma experiência assustadora. Confesso que tive que me forçar a ficar com os aplicativos em meu celular para que eu pudesse analisar a situação e escrever uma conclusão para essa experiência estética. Novamente fui bombardeado por estímulos inúteis que não me levam a nada. Só que dessa vez jurei fazer uso de uma abordagem mais inteligente em relação ao meu uso. Para evitar esses estímulos inúteis eu parei de seguir qualquer fonte de informação que considero irrelevante e comecei a seguir páginas ou pessoas que me estimulam positivamente. De fato ficar sem as redes sociais por um mês foi uma experiência libertadora e de enorme importância para meu crescimento como pessoa. Essa experiência fez com eu retomasse sensações que eu podia jurar que tinha perdido pra sempre e me mostrou valores que estavam escondidos dentro de minha personalidade. Personalidade que estava sendo tolida pelas redes sociais. Valeu a pena.

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