Eliana Camargo — Coordenadora da Comissão de Estratégia do IBGC
No dia 8 de novembro, o IBGC lançou a publicação O Papel do Conselho de Administração na Estratégia das Organizações. Organizado pela Comissão de Estratégia do instituto, o documento visa ajudar a ampliar a preocupação dos conselheiros com o pensar estratégico e de longo prazo nas empresas. Para falar sobre a obra, entrevistamos Eliana Segurado Camargo, a coordenadora da comissão e sócia-fundadora da Accepta — Inteligência Estratégica. Eliana foi executiva da Unilever, Revlon Cosmetics e Borden Group. Ela participa de conselhos de administração.
Qual era o objetivo que a Comissão de Estratégia queria atingir com esta publicação? O principal objetivo desta publicação é inspirar o pensar estratégico entre os conselheiros de administração. Outro grande objetivo é colocar a estratégia de forma consistente dentro dos conselhos, e, com isso, fazer com que o tema seja uma pauta constante nas reuniões. O que diferencia o pensar estratégico do planejamento estratégico?
Tanto o pensamento estratégico como o planejamento são necessários, mas, isoladamente, eles são insuficientes. Se o conselho não pensar estrategicamente, ele não conseguirá determinar as diretrizes estratégicas do negócio. É importante entender que o pensar estratégico é continuo, já o planejamento é um processo que acontece em determinados momentos da vida de uma empresa. O que queremos deixar claro é que é incorreto limitar o pensamento estratégico apenas no momento do planejamento.
Por que o processo de planejamento deve ser separado do processo de elaboração orçamentária? O que uma organização ganha com isso?
O planejamento estratégico deve ser desvinculado do orçamento anual. O orçamento é um plano de despesas anuais. O planejamento estratégico é uma visão de longo prazo, de 2, 3, 5 ou mais anos, dependendo do setor da economia onde a empresa atua. O orçamento deve ser feito a partir das necessidades identificadas no planejamento estratégico. Como há um desconhecimento na maioria das empresas, o que se faz é usar o momento de elaboração do orçamento para debater o planejamento estratégico. O orçamento é atribuição da gestão. Muitas empresas não têm um processo formal e técnico para desenvolver o planejamento estratégico, e acabam submetendo o processo de pensar a estratégia ao processo de elaboração do orçamento. O que é errado. O correto é o inverso: o orçamento deve ser feito a partir do plano estratégico.
Na publicação são citados alguns inibidores do planejamento estratégico. O que são eles? E como os conselheiros podem superar esses obstáculos?
Existem alguns inibidores, tais como: o excesso de atenção a assuntos operacionais, que são importantes, mas costumam ocupar grande parte do tempo dos conselhos; a inércia nos tempos de bonança, na qual o sentimento de que “se o mercado vai bem e não precisamos pensar o futuro” que acaba bloqueando o pensamento mais estratégico; projeções de crescimento com base no passado, que é quando, ao invés de analisar de maneira profunda o cenário, se diz “crescemos 10% e vamos crescer 10%”; a questão da subordinação ao orçamento, sobre a qual já falamos; e remuneração convencional, porque uma maneira de inibir a estratégia é um sistema de remuneração que não privilegia a meritocracia. Na publicação listamos alguns exemplos, mas existem milhares de outros.
No processo da elaboração de um plano estratégico, até onde vai o papel do conselho, e onde começam as atribuições da diretoria executiva?
A diretoria executiva é responsável pelo desenvolvimento do plano — pela construção e pela implementação do plano. O conselho tem a responsabilidade de aprovar o plano e de acompanhar os indicadores de performance definidos no planejamento. O conselho tem que participar de todo o processo de planejamento estratégico. Primeiro, o conselho define as diretrizes estratégicas. Seguindo essas diretrizes, a diretoria desenvolve o planejamento, cujo produto final é o plano estratégico. Durante o processo de construção do plano, o conselho deve acompanhar o seu desenvolvimento. O colegiado é responsável em aprovar o plano. A partir daí, cabe à diretoria implementar o plano e ao conselho cabe monitorar os indicadores de performance. Em muitas empresas os conselheiros esperam a diretoria elaborar um plano para eles aprovarem. Mas é justamente o contrário do como deve ser: é o conselho que precisa criar diretrizes que serão as bases para o desenvolvimento do planejamento estratégico.
Publicado originalmente em 27/10/2017 no Instante IBGC, newsletter exclusiva para associados do instituto