paris no verão
sentimentos sobre a minha primeira viagem internacional
Senti frio na barriga quando desembarquei no aeroporto de Orly naquele junho de 2019. Não era medo e não era sobre estar apaixonada. Um pouco de ansiedade, talvez. Mas foi um frio na barriga diferente, como se algo estivesse despertando dentro de mim, uma faísca crescendo e se espalhando por cada célula do meu corpo que chamo de lar; uma eletricidade, um arrepio. Poucas vezes na vida senti algo parecido, e só depois de ter sentido que entendi: esse frio na barriga era porque estava prestes a conhecer uma nova versão de mim mesma ainda não explorada.
Eu havia acabado de desembarcar em Paris e ainda não fazia ideia do que me aguardava. Cheguei naquela cidade luz tão desejada por tantos não por ter dinheiro e poder sair viajando para onde me desse na telha sempre que quisesse, longe disso. Essa foi minha primeira e única viagem internacional e eu batalhei muito para conseguir pagar. Paris entrou no meu caminho de uma forma irrecusável e quando menos esperei, estava lá.
E se tornou tudo que eu sempre sonhei e nem ao menos sabia.
Paris é sim um sonho, mas antes de realizá-lo não sentia que fosse meu. Há uma parte obscura de mim que tem essa mania de se auto sabotar e acha que não merece a felicidade plena de alguma coisa. Respiro fundo e tento me convencer de que sou digna. “Não sinta vergonha das coisas que você sente”, mentalizo.
Logo no primeiro dia que dediquei a explorar a cidade com minhas amigas, eu senti uma necessidade incessante de correr. Apenas sair correndo para poder ver e tocar tudo; para poder estar em todos os lugares ao mesmo espaço/tempo. Mas em vez disso, andei devagar, respirando e sentindo; fotografando com o olhar toda aquela imensidão. Queria poder parar o tempo naquela semana, porque ali eu entendi que não precisava ter medo, nem pressa, nem culpa.
Minha retina está acostumada a ver poesia em cada detalhe e tudo que eu sinto e percebo a minha volta se intensifica e se potencializa. Por isso, eu tenho certeza de que Paris é uma cidade que vibra em uma frequência compatível com minhas pulsações vitais. O ar carrega tanta intensidade que eu juro que sentia que estava flutuando enquanto andava. É tudo muito lindo, cheio de história, de manias, de tradições e de vida. Acho que era muita gente junta realizando sonhos ao mesmo tempo.
O sol quente do verão tocava minha pele e me fazia sentir como se estivesse sendo abraçada pelo universo. Eu não saberia explicar de outra forma; eu que sempre fui uma completa apaixonada por palavras, fiquei muda. Deve ser porque palavra nenhuma chega perto do que é viver e eu, sinceramente, "não tenho referência para expressar algo tão fora da linguagem".
Fiquei encantada com as ruas, com as construções, com a arte, com a magnitude, com os sons, cores, luzes e como cada canto parecia um cenário de filme. Eu me senti dentro de um filme sendo a atriz principal e ao mesmo tempo a roteirista e diretora.
Acho que no verão parisiense as pessoas são mais felizes. A luz é clara e a sombra é morna. O dia é longo e ao mesmo tempo é curto demais.
Ainda sobre o primeiro dia, fui em um parque de diversão perto do Louvre e voei — literalmente — não conseguia parar de sorrir enquanto girava no brinquedo e via a cidade do alto.
A liberdade tem jeitos peculiares de se manifestar.
Paris é a minha definição de magia. É incrível como alguns momentos nos transportam para além de nós mesmos, nós faz dançar sem sair do lugar, nos preenche de poesia. Paris vive dentro de mim e me fez sentir infinita.
Dizem que quando a gente está próximo de morrer, vemos um filme inteiro de nossas vidas passando diante dos olhos. Não sei se é verdade, mas em um domingo à noite, em frente a Torre Eiffel, vendo as luzes piscando assim que o relógio bateu meia-noite, eu me enxerguei no passado, tudo o que eu vivi até aquele momento passou como um vendaval em minha mente e eu chorei. Chorei muito, daqueles choros que não tem início, nem fim, nem meio.
Meu coração bateu tão forte que eu sentia ele palpitando em todos os membros do meu corpo.
Me senti renascendo ali mesmo, uma nova versão de mim pedindo passagem onde já mora tantos eus. Me alargando. Entendi o frio na barriga incessante desde o primeiro segundo e todas aquelas borboletas voando. Naquele instante agradeci a Amanda do passado por toda paciência, por ter aguentado firme todos os dias e por ter se permitido arriscar e viver aquele sonho. Pude também confirmar algumas suspeitas: a felicidade habita em mim mesmo com todos os demônios.
Queria ser capaz de descrever cada dia, cada lugar visitado como em um diário de bordo, dando dicas de lugares e passeios — as blogueiras de viagem fazem parecer tão fácil — Mas eu só posso crer no que sinto. E esse texto foi para tentar colocar em frases desconexas tudo que eu senti durante oito dias em Paris, em que eu celebrei a mim mesma.