Como as crenças constroem o que você crê

Claudio Palmieri
ilovehumans
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6 min readOct 6, 2019

Suas crenças oferecem a você a possibilidade de navegar pelo mundo com menor gasto de energia do seu cérebro. Das coisas mais simples, como esperar o sinal vermelho para os carros pararem e você poder atravessar a rua, até filosofias de vida baseadas em doutrinas religiosas. Em tudo isso as crenças estão presentes.

Sem as crenças, o cérebro do ser humano travaria, pois você precisa de velocidade de interpretação do que acontece continuamente ao seu redor, para, assim, poder tomar decisões que garantam a sua sobrevivência, sem ter a necessidade de averiguar cada coisa no extremo detalhe.

Podemos ter as crenças triviais de senso comum, como acreditar que um objeto esférico é uma bola, de que minha mãe e meu pai ficaram juntos para eu estar aqui. Mas também podemos ter crenças contextualizadas. Isto é, crenças que vivem dentro de um mundo qualquer, como a justiça, uma seita, um partido político, um universo fictício etc, em que a base das crenças se diferenciam da crença de outros mundos.

As crenças de um advogado, que foram construídas com muito estudo na faculdade, o faz olhar um criminoso diferentemente de como a sociedade o vê. Enquanto colegas da escola fazem bullying com alguém que tem algum “problema” de comportamento, o psicólogo o vê como um paciente e consegue captar e interpretar o que passa em sua mente, graças às suas crenças profissionais construídas. Ou mesmo, pessoas que amam arte e olham para um urinol presente numa exposição e vê concepção artística onde outras pessoas vêem apenas um urinol.

As crenças contextualizadas são a base para a construção de realidades e pseudo verdades que fazem com que pessoas interpretem o mundo de uma forma específica, e assim, são direcionadas para o bem ou para o mal, ao bel prazer de quem construiu esta realidade. Vemos isso fortemente no contexto político e religioso.

Independentemente se é uma crença trivial ou contextualizada, nosso cérebro usa um algoritmo base que segue um fluxo que constrói e fixa as crenças na sua mente. Entender este fluxo, ajudará você a utilizar o metapensamento, a se entender e a se interceptar antes que uma crença, que você julga nociva, seja estabelecida no seu eu.

Etapas de construção das crenças na mente:

1) Fato ou evento
Acontece alguma coisa diretamente com você ou à sua volta. Alguém lhe apresenta algo novo. Você é impactado por algum tipo de mensagem. Quer dizer, chega a você algo que você desconhecia e você passou a ter consciência da sua existência.

2) Percepção
Dependendo do seu estado mental ou físico, da sua formação, da sua história, das suas outras crenças já adquiridas, dos seus valores ou filosofia de vida, o fato será percebido em volto a toda essa construção da pessoa, com a percepção sendo diferente, variando muito ou pouco, para cada pessoa.

3) Experiência
A partir da percepção a pessoa terá algum tipo de experiência em sua mente. Podendo ser uma construção de um novo conhecimento ou algum tipo de sensação como alegria, tristeza, medo, prazer, etc. Cada pessoa terá a sua própria experiência.

4) Conclusão e aprendizado:
Com base na experiência obtida, a mente tira algum tipo de conclusão sobre o fato que lhe foi apresentado, gerando para si um aprendizado.

5) Confirmação repetida
Quando a pessoa passa a confirmar sua conclusão interpretando diversos acontecimentos de forma a justificar e validar o que concluiu, é porque a crença já está implantada na mente da pessoa.

6) Crença
Com a crença estabelecida, sua mente tende a buscar mais e mais confirmação num loop contínuo com a etapa 5, tornando a crença mais forte, como uma raiz resistente em sua mente.

O fluxo é uma visão simples, que podemos chamar de caminho fluído da crença, onde a construção da crença flui sem nenhum percalço — de uma crença inexistente à uma crença estabelecida e que se expande.

Trabalhando para evitar crenças nocivas

Imagine que você foi morar na Índia e saiu pelas ruas para conhecer a cultura local. Seu cérebro entra num estado de sensibilidade para aguçar a percepção de tudo que tem à sua volta. As roupas dos habitantes, a arquitetura das moradias e prédios comerciais, o clima, a atmosfera local, o comportamento das pessoas, as regras estabelecidas na cidade e tudo que a local expõe para você. Com base nisso, seu cérebro constrói na sua mente um conjunto de crenças que vão lhe ajudar a navegar pela cidade, e formar em você um entendimento de uma nova cultura vinculada a este novo país.

Com o passar do tempo, sua mente vai incorporando mais ainda a cultura e o jeito de ser do indiano, e você passará a navegar naturalmente pelo país. Sem refletir, ponderar, analisar e questionar, logo você estará adorando Shiva, amando as vacas e aceitando o modelo de castas. Não estou levantando juízo de valor com a cultura indiana, mas mostrando como sua mente trabalhará.

Mesmo que você não mude de país, sua mente está constantemente incorporando novas crenças e reforçando as existentes. E para não ter uma mente formatada por qualquer tipo de crença, a pessoa deve carregar no seu padrão de pensamento 4 palavras: refletir, ponderar, analisar e questionar.

É importante julgar se uma nova crença, que está prestes a fazer parte do seu repositório de crenças, precisará estar envolta pelas 4 palavras. Crenças triviais, na maioria das vezes, não requer tanta energia mental. Mas, boa parte das crenças contextualizadas, vai pedir que você analise, pondere, reflita e questione a crença que seu cérebro irá construir.

Alguns exemplos:

1) Programas de auditório, quando recebem artistas para falar sobre sua história de vida, usam adjetivos superlativos para valorizá-los, muitas vezes tentando colocá-los como deuses acima de nós mortais. Mas se usarmos as 4 palavras, vamos observar, por exemplo, que são ótimos profissionais, que se esforçaram muito para desenvolver suas técnicas e possuem uma larga experiência profissional. Apenas isso. Nada de deuses do teatro, da televisão, da música etc.

2) Uma marca de refrigerante exibe na TV uma propaganda com pessoas praticando esporte, felizes, tomando o refrigerante com amigos, corpos magros e bem desenhados. Mas, com as 4 palavras ativadas, colocaremos em dúvida que, tomando constantemente refrigerante, seremos como as pessoas apresentadas na propaganda.

3) Em programas de igrejas na TV, os líderes religiosos apresentam pessoas que testemunham crescimento financeiro grande e rápido após entrarem para a igreja. Se não ganharam na loteria ou receberam alguma herança, com as 4 palavras, você logo percebe o teatro para ludibriar os fiés.

Os exemplos são infinitos e, diariamente, você está diante de algum acontecimento em que terá que colocar as 4 palavras em ação.

Conhecer os princípios e o caminho de como seu cérebro constrói as crenças em sua mente, e de como você pode determinar qual crença permitirá colaborar na construção da sua personalidade, ajudará você a desenvolver uma consciência de domínio só seu perante a dinâmica do mundo.

As crenças serão suas verdades e cultura, e poderão ser eternas, temporárias ou nunca terem existido para você. Mas quem deve mandar nelas não é ninguém, a não ser você. Porque se não for você, será alguém. E aí você não se controla e é controlado.

Por Claudio Palmieri
Apaixonado pelo ser humano e sua interação com o mundo.
Experiência, criatividade, UX, inovação e neurociência.

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Revisado por Natascha Lopes

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