Cinzas

Bia Fauro
Imagine S.A.
Published in
1 min readMar 3, 2018

Ela olhava saudosa para aquela jura de amor, aquele rabisco no banco onde um dia fora o parque. O coração ainda estava lá, com as iniciais do casal unidas pelo sinal de adição, em sulcos profundos na madeira recém pintada de cinza. Inacreditável que sobrevivesse a todo esse tempo.

Hoje, havia um centro de pesquisa; mais um edifício sem graça onde um dia fora o melhor lugar da sua infância. O futuro era sem graça, quem diria? E o presente, o que será?

Do passado, bem sabia. O rabisco no banco virou aliança, casa, carro, conta. O cotidiano entrou pelas janelas, arrombou as portas, fez ruir seu pobre castelo de ilusões.

Nunca mais se viram então, os pombinhos adolescentes.

Agora eram adultos, num mundo de adultos. Ela estava dando uma última mordida no almoço antes de voltar para o trabalho. Na volta, tinha a festa de dez anos de casamento, numa pequena cantina com a turma do ensino médio.

Um discreto sorriso no canto da boca iluminou seu rosto.

Inacreditável que sobrevivesse a todo esse tempo.

--

--