despacio
Vou vivendo a vida devagarzinho… pé ante pé… pra não acordar os monstros que vivem no sótão e pra não interromper o andar do destino.
Tenho medo de pisar no calo do carma e cair no seu inevitável retorno, então respiro devagar e em silêncio e, quando quero gritar… eu escrevo.
De letras a palavras, de frases a parágrafos. Raramente chego em um texto completo e vou deixando pedaços sem par e sem fim por onde passo.
Em toda cidade que vou esqueço algo de propósito… é minha forma de falar em segredo e de permanecer em meio a minha própria impermanência.
Vou seguindo pelos cantos, nadando em águas calmas, subindo à superfície de tempos em tempos apenas para que saibam que continuo por aqui.
Cuido da minha solidão como cuidaria dos filhos que nunca terei.
E na maior parte do tempo tudo está em paz e eu posso viver minhas paixões no seguro da escuridão e posso escolher as músicas que me acompanham em minha clausura.
Eu me misturo ao ar para passar despercebida.
Vento fraquinho pra não bagunçar o que está no lugar.
Bom, quem sabe, algum dia, alguém venha a me sentir passar…
Enquanto isso, vou vivendo devagarzinho e de vez em quando até visito os monstros do sótão. Sem alarde. Sem sobressaltos.
Abraço o carma. Ele se tornou meu amigo.
E a vida segue… pé ante pé…
pra qualquer lugar onde eu possa descansar.
