Então, você fala com robôs?!

Eli Gorniak
in data we trust
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7 min readNov 28, 2020

Conheça Eliza, o primeiro chatbot da história!

Rosie, a simpática robô dos Jetsons.

Quem aqui não sonhou em ter em casa uma empregada-robô como a Rosie do desenho Os Jetsons?

Ela era super carismática, prestativa, e com uma incrível capacidade de demonstrar emoções como choro, raiva, e tristeza (robô com emoções, sim!).

Se a Rosie não lhe parece tão familiar, vamos ver um exemplo mais recente, mas não menos cool!

Se você, assim como eu, assistia Os Jetsons, então você já tem uma certa idade, mas isso não vem ao caso agora….

J.A.R.V.I.S. e Tony Stark

J.A.R.V.I.S. é a sofisticada inteligência artificial que trabalha como assistente de Tony Stark nos filmes do Homem de Ferro e Avengers (Marvel Comics). É o programa de computador que controla os sistemas do edifício de Stark e os trajes do Homem de Ferro durante suas tempestivas aventuras.

Agora observe: J.A.R.V.I.S. é uma sigla para ‘Just A Rather Very Intelligent System’ ou ‘apenas um sistema bastante inteligente’. Durante suas conversas com Tony podemos perceber nítidas demonstrações de sentimento, como sarcasmo, ironia, preocupação, sendo capaz de entender as ironias de Tony Stark e devolver na mesma moeda. Pretty cool, hum?

Um computador inteligente, capaz de interagir como se fosse um humano? Vamos ver como isso começou…

Alan Turing, um visionário

Photo by Mauro Sbicego on Unsplash

Você já assistiu ao filme O jogo da imitação (The Imitation Game, 2014)? O filme conta a história de Alan Turing, um estudante britânico da Universidade de Cambridge contratado pelo MI6 em 1939 para desvendar códigos nazistas durante a Segunda Grande Guerra, especialmente o Enigma (o equipamento na foto acima), um dos mais complexos geradores de códigos e mensagens criado pelos alemães à época. Por ter decifrado o Enigma e auxiliado o governo britânico a finalizar a guerra, Turin ganhou notoriedade e foi considerado um herói.

Alan Turing

Turing era visionário e defendia a ideia que computadores podiam pensar! Ele acreditava que se uma máquina pudesse representar um ser humano e seu comportamento convencesse a outra pessoa envolvida em uma conversa de que ela está interagindo com um humano (não uma máquina), então a máquina seria inteligente.

Em outubro de 1950 Alan publicou um artigo chamado ‘Computing Machinery and Intelligence’ (Computador e Inteligência), considerado pioneiro por introduzir o conceito de inteligência artificial e apresentar o famoso Teste de Turing ou O jogo da imitação, que deu nome ao filme.

Basicamente, o jogo da imitação consiste em uma pessoa teclar perguntas para outras duas pessoas, sem saber que uma delas é um computador. O desafio é verificar se a pessoa que faz as perguntas consegue diferenciar um ser humano de um computador pelas respostas apresentadas. Caso não haja diferenciação, então esta máquina é inteligente (pois se comporta como uma pessoa).

“Acredito que até o fim do século XX será possível falar de máquinas pensantes sem chances de ser contestado”. Alan Turing

Em junho de 2014, cientistas britânicos conversaram com um suposto garoto ucraniano de 13 anos, através de uma sala de bate-papo. O menino tratava-se na realidade de um computador. Provando a teoria de Turing, 1/3 dos cientistas acreditou que se tratava de um ser humano de verdade.

Como visto acima, o interesse em transformar a habilidade de interagir com robôs através da fala e escrita já tem quase 70 anos! Hoje falamos com extrema normalidade com a Siri, Google ou Alexa, porém tudo tem um começo e é nesse momento que surge a nossa personagem principal: a Eliza.

Eliza, a robô terapeuta

Joseph Weizenbaum, o pai da Eliza.

Foi a genialidade do trabalho de Alan Turing que despertou no cientista da computação germano-americano Joseph Weizenbaum o interesse em desenvolver um programa de computador capaz de ler nossa interação, compreender o que estamos falando e replicar respostas compatíveis com o esperado.

Entre os anos de 1964 e 1966, trabalhando no Laboratório de Inteligência Artificial do MIT ( Massachusetts Institute of Technology), Weizenbaum desenvolveu o programa de computador ELIZA, cujo objetivo era fazer os usuários acreditarem que estavam conversando com um ser humano. ELIZA foi projetada para imitar um terapeuta que faria perguntas abertas e responderia com acompanhamentos.

O nome Eliza é uma homenagem à personagem Eliza Doolittle, da obra Pygmalion de George Bernard Shaw. Uma heroína trabalhadora que aprende a falar o sotaque da classe alta.

O programa já possuía respostas prontas de forma a fazer com que os usuários acreditassem que por trás da máquina houvesse um terapeuta analisando a situação e estabelecendo uma conversa formal. Estas respostas eram acionadas por meio de palavras-chave que o programa previamente recebera como inputs, devolvendo ao usuário frases relacionadas a essas palavras-chave.

Devido à forma rudimentar dos computadores à época, o usuário interagia remotamente através de uma máquina de escrever elétrica, digitando uma frase que era enviada para o computador mainframe onde Eliza estava instalado. A mensagem era examinada, Eliza procurava as palavras-chave e devolvia a resposta por meio de frases. O usuário recebia então a resposta impressa. A ideia de transformar Eliza num terapeuta foi para encorajar uma conversação, um diálogo contínuo entre o usuário e a máquina. Inclusive, Weisenbaum chamou de DOCTOR o conjunto de scripts programados para Eliza.

Por exemplo, se o usuário digitasse a frase “Eu tenho problemas com meus pais”, Eliza poderia responder “Me conte sobre sua família”.

A figura abaixo é uma ilustração de uma conversa fictítica que tive com um modelo do programa Eliza, disponível nesta página web:

Conversando com Eliza sobre problemas familiares.

Observe que as respostas do Eliza são precedidas do símbolo ‘>’ e não são respostas diretas, mas abrangentes, pois são devolvidas com base nas palavras-chaves que digitei.

O programa tinha limitações de conversação em função dos scripts inseridos no programa. Assim, os diálogos não poderiam se extender com maior profundidade, a não se que essas frases pré-concebidas já estivessem no conteúdo do programa.

É por esta razão que Eliza é considerado o primeiro chatbot ou robô de conversação da história da ciência da computação, pois ele foi concebido especificamente para interações com humanos!

A base do desenvolvimento do programa vem de uma área da Inteligência Artificial chamada Processamento da Linguagem Natural ou NPL (Natural Processing Language), originalmente chamada por Weizenbaum de Natural Language Communication (Comunicação da Linguagem Natural), assim, o cientista é considerado um dos pais da Inteligência Artificial.

Desenvolvendo uma conexão emocional com Eliza

Weizenbaum observou que alguns alunos e colegas convidados para testar começaram a desenvolver uma conexão emocional com Eliza, falando sobre problemas reais que enfrentavam em suas vidas. Até mesmo sua secretária pedia que ele saísse da sala para que ela pudesse falar com Eliza em particular.

Por conta dessa constatação, no artigo publicado por ele em 1976 “Computing Power and Human Reason: from Judgement to Calculation”, Weizenbaum fala com preocupação sobre a possibilidade das pessoas desenvolverem a crença de que uma máquina pode ser capaz de compreender emoções humanas e creditar a essa máquina alguma forma de solução ou apoio emocional. Nada mais atual em tempos de redes sociais…. Ele chamou esse comportamento de ‘efeito Eliza’, referindo-se a uma patologia que afligiria o homem moderno.

Após Eliza, muitos outros chatbots foram criados. Hoje nós fazemos uso deles com uma facilidade e naturalidade incríveis. É comum ver um popup saltar na tela dos websites que visitamos perguntando “Faça uma pergunta!” ou “Como posso ajudar?”. Esses chatbots utilizam o mesmo fundamento de Eliza: processar a forma como nos comunicamos (linguagem natural) por meio de padrões no que falamos ou digitamos (palavras-chave), indicando caminhos ou soluções para nossas solicitações.

E eles são tão precisos que quase nos fazem acreditar que estamos conversando com outra pessoa. Turing tinha razão…

Weisenbaum passou o resto da vida preocupado com o caminho que a inteligência artificial iria tomar no relacionamento entre humanos e máquinas. Transformou sua missão de vida em alertar as pessoas que máquinas são máquinas e não é possível a substituição do pensamento crítico e sensibilidade humana pelo julgamento de um programa de computador, especialmente quando envolvesse questões relacionadas à psiquê e comportamento humanos.

Bem, a inteligência artificial está tomando conta de uma parcela muito relevante do nosso dia a dia e só nos resta observar o quanto mais seremos capturados pela sedução em dizer: “Alexa, boa noite!

Uma curiosidade: os Jetsons foram exibidos originalmente entre 1962 e 1963. Apenas 1 ano antes de Eliza ser apresentada à comunidade científica.

Caso queira ler a publicação original de janeiro/1966 sobre a Eliza, clique aqui.

Caso queira ler a publicação original de outubro/1950 do artigo de Alan Turing, clique aqui.

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Eli Gorniak
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happy person | enthusiastic of technologies and very curious about everything | author of “in data we trust” and “another ordinary day” blogs | Minnesota-USA.