Despertando-se para os seus 10 corpos

Capítulo #3 da Kundazine, uma série de artigos relacionados à filosofia e prática da Kundalini Yoga.

Cecília Furlan
indō
6 min readOct 23, 2020

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Na Kundalini Yoga existe um conceito ao qual nos referimos como sendo os nossos 10 corpos (9 a mais do que você deve estar acostumado!). Eles podem ser considerados camadas da nossa existência, da manifestação do nosso ser. Cada corpo tem suas funções e características específicas e a filosofia e práticas da Kundalini Yoga visam trazer consciência e fortalecer cada um desses corpos para que possam agir unificados e em equilíbrio.

São eles: a alma, a mente negativa, a mente positiva, a mente neutra, o corpo físico, a linha do arco, a aura, o corpo prânico, o corpo sutil e o corpo radiante.

O conceito dos 10 corpos é mais uma forma de entendermos melhor as questões e desafios que encaramos ao longo da vida, para que possamos passar por esses processos, que são parte inevitável da jornada, de forma cada vez mais plena e tranquila. Eles são símbolos, códigos, elementos que ilustram uma história construída e contada com o objetivo de disseminar ensinamentos e reflexões.

O ponto central é o aprendizado que tiramos dessas histórias, muito mais do que nos atermos ao debate sobre a existência ou não de “corpos prânicos” ou até mesmo de uma “alma. Se as coisas existem ou não, pouco importa. O que importa é ouvir as histórias, pensar sobre elas e tentar, de alguma forma, usá-las para amenizar as dificuldades da vida.

A Kundalini Yoga, no final das contas, é uma ferramenta para nos apoiar ao longo do caminho.

Dito isso, apresento agora os 10 corpos e minhas interpretações a respeito dos significados de cada um deles.

A alma

Começando pelo mais polêmico para já sanar qualquer mal entendido e também porque é, realmente, o primeiro corpo.

O conceito de alma, nesse contexto, diz respeito a nossa individualidade. A alma é a representação do nosso ser consciente, da nossa personalidade. Os outros 9 corpos trabalham para que a alma realize seu propósito.

A metáfora é que a alma está enclausurada no corpo físico e almeja se religar à vastidão do universo. Na prática, isso ocorre quando nos conectamos a valores como a ética, a dignidade e a compaixão, quando entendemos que fazemos parte de um todo e pautamos nossas ações a partir desse entendimento.

Os corpos mentais

São a mente negativa, a mente positiva e a mente neutra.

A mente negativa é a responsável por calcular riscos — ou seja, é de extremo valor, desde que esteja equilibrada e a serviço do todo. Seu desequilíbrio é a causa da insegurança e do medo ao hiperdimensionarmos os riscos e obstáculos que encontramos.

Já a mente positiva calcula benefícios e impulsiona nossa força de vontade, nos tornando otimistas para agir e aplicar nossos talentos. Seu desequilíbrio se manifesta através da intolerância a frustrações.

A mente neutra é uma mente meditativa que pondera os riscos e benefícios calculados pelas mentes positiva e negativa e nos permite tomar decisões com consciência e discernimento — o famoso contar até 10.

Gente, não dá pra escapar. Tem que contar até 10. É obrigatório.

O corpo físico

Como o próprio nome já diz, é o corpo físico. Vocês sabem do que se trata.

A linha do arco

Ela é o meu conceito preferido, acho poético. É o ponto de equilíbrio entre os reinos físico e cósmico. É onde se manifesta a intuição.

Sabe quando estamos pensando em uma pessoa e ela nos manda uma mensagem, ou quando estamos com uma música na cabeça, entramos em um estabelecimento e começa a tocar essa mesma música?

A linha do arco representa essa sensibilidade expandida, essa capacidade de identificar coisas que ainda não entraram no campo de percepção dos nossos 5 sentidos do corpo físico.

Aura

⊙ ETIM lat. aura,ae ‘vento brando, brisa’, adp. do gr. aúra,as ‘id.’

  1. “Conjunto de elementos sutis que caracterizam dada coisa ou pessoa; ar.”;
  2. Suposto campo energético que circunda o corpo físico.

Oxford Language

Diferentes formas de tentar dizer uma mesma coisa difícil de ser explicada, mas que todo mundo consegue entender mais ou menos do que se trata — é o que os franceses chamariam de um tal je ne sais quoi.

Estamos falando, portanto, da impressão que a presença de uma pessoa causa apenas por existir e que está estreitamente vinculada ao nosso nível de autoestima. Essa aura acaba servindo como uma espécie de escudo. Quando estamos seguros da imagem que estamos passando, podemos agir com confiança e compaixão. Por outro lado, quando não nos sentimos seguros, ficamos paranóicos e negativos.

Corpo Prânico

Na simbologia indiana, o Prāna é a representação de uma energia vital que é absorvida por nós através do ar que respiramos.

Que o ar é essencial para a vida nós já sabemos, dessa forma, podemos muito bem chamá-lo de “energia vital”, que não passa de outra forma de dizer “é essencial para a vida”.

A função desse conceito de corpo é nos lembrar da importância da respiração consciente (que é o que a Kundalini Yoga fala o tempo inteiro). A respiração profunda e tranquila é sinal de equilíbrio mental e paz de espírito. Quando estamos plenos, é mais difícil de nos aborrecermos e contamos com mais energia para tocarmos nossos projetos, ao contrário de um estado ansioso ou de fadiga crônica, em que nossa respiração se torna curta e superficial.

É nesse corpo que agem os exercícios que trazem consciência para a respiração, chamados carinhosamente de pranayamas.

Corpo Sutil

É com com o qual enxergamos as sutilezas da vida.

Outro papo já batido, mas que não pode deixar de ser repetido, é toda essa questão das perspectivas. Nós inevitavelmente vemos o mundo através dos nossos próprios olhos e nossa leitura da realidade é sempre feita da nossa perspectiva individual, baseada nas nossas próprias experiências, emoções etc. Ou seja, ver a realidade de uma perspectiva geral e mais próxima do que realmente está acontecendo é um desafio para toda e qualquer pessoa.

Na Kundalini costumamos dizer que antes de tomar atitude, é preciso tomar altitude. Ver as coisas de uma perspectiva elevada. É com o corpo sutil que podemos tomar essa altitude.

Corpo Radiante

É aqui que se manifesta nossa coragem de encarar o mundo e os obstáculos que encontramos e que são parte inerente à jornada. Com os nossos 10 corpos fortalecidos, criamos resistência e tônus para assumir as dificuldades da vida sem precisarmos evitar lidar com questões que nos deixam inseguros.

A única forma de superar os desafios é passando por eles.

Enfim,

Yogi Bhajan, quando falou sobre os 10 corpos, colocou-os nos seguintes termos:

“Antes de mais nada, você não sabe que tem 10 corpos. Segundo, você não acredita que tem 10 corpos. Porque dá um trabalho enorme ter 10 corpos. Você só quer um corpo. E se você não sabe quando os corpos estão em desequilíbrio nas sequências e consequências, terá resultados terríveis na vida. Então você pergunta, “Por que isto está acontecendo comigo?” Aconteceu porque você não fez certas partes de sua vida mais fortes, mais equilibradas e mais verdadeiras.”

Os 10 corpos são representações de qualidades da psique, são aspectos da nossa vida. Ao tomarmos consciência deles e pegarmos para cuidar com carinho, podemos fortalecê-los e evitar dramas desnecessários.

Tudo que a gente quer é ficar bem. O que podemos fazer para ficarmos bem é usufruir dessas diferentes ferramentas e linguagens e tirar delas os ensinamentos que podem nos ajudar nesse processo.

Os desafios mesmo nunca vão acabar, essa é a graça da vida.

O importante é curtir o caminho.

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