Mais uma reunião?

Como o Inova_MPRJ faz para reduzir sua quantidade de reuniões, trabalhar com tranquilidade e alcançar seus objetivos.

Breno Gouvea
Inovação em governo e no controle
6 min readMay 27, 2020

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Não pode ser normal trabalhar mais de 8 horas por dia e, ainda assim, não conseguir apontar ao menos uma grande realização após uma semana com tanto tempo dedicado. Mas, para muitos, esse é um retrato fiel da realidade. Talvez por dois motivos.

Por um lado, os dias costumam ser divididos em pequenas fatias de dedicação. Pequenos e espaçados momentos de foco e uma enxurrada de distrações — digitais e do próprio ambiente de trabalho.

O trabalho coletivo traz benefícios insubstituíveis, mas nossos “locais de trabalho” talvez sejam onde menos aproveitamos nosso potencial criativo individual. Por mais paradoxal que soe, muitos não conseguem de fato trabalhar no trabalho.

A causa é a enorme quantidade de reuniões e as frequentes (e acríticas) interrupções com necessidades “urgentes” a todo momento. Quem nunca desejou ir para casa ou para uma biblioteca para se concentrar?

Ao mesmo tempo, a obsessão por resultados e crescimento a qualquer custo cria expectativas irreais. Ficamos estressados, cansados e doentes. Como consequência, impactos na saúde mental, pedidos de transferência (ou demissão) e insatisfação geral.

Menos interrupções

O caminho para a mudança passa por reinventar a forma como nos comunicamos no trabalho. Passa também por questionar como, quando e por quais motivos nos reunimos. E por uma reflexão sobre as razões de privilegiarmos a comunicação síncrona na maior parte do tempo.

Tais questionamentos são a base dos livros It Doesn’t Have to be Crazy at Work, Rework e Remote, escritos pelos fundadores do Basecamp — a ferramenta de gestão de projetos e equipes que utilizamos no Inova_MPRJ. Seja o trabalho remoto ou presencial, o caminho parece ser o mesmo.

Estamos levando a sério as sugestões do Basecamp. Experimentamos novos formatos de comunicação, boas práticas para reuniões, projetos curtos com dedicação exclusiva das equipes e avaliações de desempenho 360º.

Não existe uma única fórmula ou receita de bolo, mas conseguimos construir uma cultura de trabalho que funciona para nós. Favorece nossa saúde mental e gera resultados relevantes. Por isso, dedicaremos uma série de quatro publicações para compartilhá-la.

Nesta primeira, focaremos nos 6 princípios que norteiam a comunicação do Laboratório. Por meio deles, conseguimos reduzir drasticamente nosso número de reuniões.

Princípio # 1 _ toda ideia começa por uma proposta

Em nossas críticas, comentários e sugestões, sempre começamos com uma proposta concreta de melhoria ou construção. Quando somos diretos e sugerimos uma solução alternativa, somos compreendidos mais facilmente, economizamos tempo e trabalhamos em real colaboração.

Muitas vezes a justificativa está implícita na própria proposta. Por exemplo, se alguém acredita ser importante modificar parte do texto de um relatório, é muito mais eficiente que a pessoa apresente uma nova versão em forma de proposta para a equipe — ao invés de simplesmente dizer que o trecho deveria estar diferente. A lógica se aplica para qualquer assunto.

Muito diferente de dizer apenas “não está funcionando”.

Princípio # 2 _ às vezes em tempo real; na maior parte do tempo, de maneira assíncrona

Preferimos nos comunicar por meio de texto, após as devidas reflexões e organização de ideias. No lugar de excessivas reuniões, conversas intermináveis ou chats com mensagens quebradas. Assim, reduzimos o tempo gasto com reuniões, ligações e outras oportunidades em que interrompemos o trabalho do outro ou temos o nosso interrompido.

Escrever favorece a todos: independe dos horários disponíveis de cada um e inclui quem não pôde participar. Decisões importantes começam e terminam com a troca de ideias completas, não com mensagens curtas, de uma linha por vez. Escrever solidifica, chat dissolve.

Compartilhando reflexões e abrindo para comentários. Não precisa de reunião.

Princípio # 3 _ quase nada é urgente

Tratar tudo como urgente gera enorme quantidade de interrupções no trabalho. Seja para reuniões desnecessárias ou para perguntas que precisam de respostas “o quanto antes”. Não esperamos nem exigimos respostas imediatas, a não ser que se trate de real emergência. Quando não apropriada, a expectativa por respostas imediatas é tóxica.

Além de tudo, “agora” normalmente não é a melhor hora para dizer o que acabamos de pensar. Deixamos o tempo filtrar o pensamento para que reste apenas o essencial. E reservamos tempo para desenvolver ideias e pensar nos desdobramentos de cada discussão relevante.

Outra boa prática é refletir sobre nossa abordagem ao pedir ou perguntar. É comum que abordagens ansiosas pressionem colegas de trabalho para responder rapidamente a qualquer tipo de demanda.

Princípio # 4 _ reuniões como o último recurso, não a primeira opção

É exagero utilizar reuniões como norma ou primeiro recurso para discutir, debater e buscar soluções. E não é raro que equipes caiam na armadilha de medir apenas processos, contabilizando horas de reunião como resultado. Vão para casa convencidos de que produziram, já que tiverem inúmeras reuniões.

Reunir pessoas tem valor. Podemos nos comunicar simultaneamente com um grupo e, se presencialmente, aproveitar os benefícios da linguagem corporal e do olho no olho. Porém, como o sal, se utilizarmos com excesso, podemos destruir toda a comida.

Reunir pessoas tem também um custo. Sete pessoas reunidas durante uma hora representam sete horas de trabalho; não apenas uma hora de reunião.

Princípio # 5 _ boa comunicação gera menos trabalho

Boa comunicação significa dizer a coisa certa na hora certa e no local adequado, de forma a não gerar efeitos colaterais. Discutimos e-mails apenas dentro de suas sequências e, no Basecamp, tratamos de cada assunto nas respectivas tarefas. Evitamos telefone sem fio e revisamos textos para retirar palavras, frases ou até mesmo parágrafos. Só fica o necessário.

E prestamos atenção em detalhes que fazem toda a diferença. Enviar algo após as 20h pode fazer com que alguém fique trabalhando até mais tarde. Talvez não exista momento perfeito, mas com certeza há momentos ruins para compartilhar ideias.

O final do dia costuma nos convencer de que o trabalho está bom o suficiente. Enquanto a manhã seguinte tende a nos falar a verdade. Se não temos certeza, dormimos antes de enviar o material.

Outra lição que aprendemos é que compartilhar ótimas notícias junto com notícias ruins torna as duas partes piores. As boas parecem ter menos valor e as más podem acabar não sendo tratadas com a devida relevância. É importante ser honesto com ambas.

Princípio # 6 _ nunca deixamos de comunicar

Decidir não discutir determinado assunto não significa acabar com sua existência. Queremos resolver problemas e não os ignorar. Por isso, sempre perguntamos se a mensagem está clara, se algo ficou de fora ou se alguém estava esperando um assunto não abordado.

Estimulamos que todos façam perguntas e compartilhem suas ideias. E, se queremos respostas, não guardamos as perguntas para nós.

Pior do que problemas de comunicação são problemas ocasionados por sua ausência. E quanto maior a equipe ou organização, maiores as oportunidades de haver falta de comunicação.

Não significa que a interação acabou.

Equipe do Inova_MPRJ durante retiro semestral de planejamento.

Seguimos explorando a inteligência coletiva. E muito. Planejamos atividades com as pessoas certas e focadas nos problemas que queremos resolver.

E os momentos de descontração aumentaram: cumprindo nossos objetivos, ficamos tranquilos para almoçar juntos, fazer pausas ao longo do dia, sair depois do expediente e marcar horários para falar de temas diversos ou assistir vídeos aleatórios.

A técnica do Pomodoro também ajuda bastante. Com ela, focamos e fazemos intervalos simultaneamente. Nos intervalos, vale tudo menos falar de trabalho.

Quanto às reuniões que restaram, não representam mais do que duas horas de trabalho por semana para cada integrante do Laboratório. (Na próxima publicação compartilharemos como aproveitamos o máximo delas).

Desafio: assistir o TED abaixo sem ser interrompido por nada nem ninguém (principalmente, por uma reunião).

Tem alguma ideia inovadora para melhorar processos e cultura de trabalho? Deixe um comentário ou escreva para nós em inova@mprj.mp.br.

Com Bernardo Chrispim, Beatriz Ferreira, Daniel Lima Ribeiro, Gabriel Delman, Júlia Rosa, Leonardo Santanna, Letícia Albrecht, Manuella Caputo, Marcelo Coutinho e Matheus Donato.

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