Realinhando uma instituição

usando design e ciência de dados para construir uma visão compartilhada

Beatriz Ferreira
Inovação em governo e no controle
5 min readFeb 28, 2020

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Um dos vários desafios de governança das instituições públicas é criar uma visão comum entre seus órgãos e estimular a colaboração intersetorial. Não é raro que esforços sejam desperdiçados, porque foram dedicados a projetos pouco prioritários. É o que ocorre quando não se tem uma diretriz clara que norteie a atuação.

Além disso, a falta de comunicação entre setores pode significar retrabalho. Quantos órgãos não estão trabalhando em projetos que são complementares e que, por isso, poderiam estar sendo construídos conjuntamente? Quanto tempo se perde buscando soluções que já existem na própria instituição?

O ano de 2019 foi de grandes mudanças para o MPRJ. Com o objetivo de alinhar a instituição às novas demandas da era digital, criaram-se órgãos, ao mesmo tempo em que órgãos existentes foram ressignificados com novas atribuições. O tom da mudança foi a visão do Procurador-Geral, de um Ministério Público digital.

As mudanças transformaram as dinâmicas internas — surgiram sobreposições, novos desafios e oportunidades sem um responsável claro. Ficou clara a necessidade de esforços para que as estruturas se enxergassem melhor, entendessem suas novas vocações, visualizassem a sinergia possível entre si e conseguissem otimizar recursos e potencializar suas atuações.

O Laboratório de Inovação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (Inova_MPRJ) foi chamado para contribuir na solução desse desafio, usando sua caixa de ferramentas, da qual faz parte o design de serviços. Assim nasceu o projeto Vértice.

Vértice — o ponto comum de encontro entre arestas

O projeto teve como objetivo realinhar os sete órgãos do MPRJ digital — que atuam com dados e tecnologia da informação. Ao invés de trazer uma resposta pronta de atribuições e vocações para cada órgão, de cima para baixo, o Inova_MPRJ desenvolveu um método de troca e construção pelos próprios órgãos de sua identidade e de como se imaginam no futuro.

Em uma primeira fase, com cada equipe do MPRJ digital, o Inova_MPRJ as separou em dois grupos para construir a identidade do órgão. Os participantes, então, imaginaram como gostariam que o órgão fosse em 2025. Para expressar a ideia, usaram a ferramenta de persona e identificaram como o órgão personificado se vestiria e apresentaria; o que ele gostaria e não gostaria; e quais seriam seus sonhos e pesadelos.

Enxergar as visões confluentes e divergentes dentro do próprio órgão é um primeiro passo essencial para a construção de uma visão unificada. Mas, como ninguém inova ou trabalha sozinho, o segundo momento da atividade estimulou os participantes a pensarem como a vocação especial do órgão se relacionaria com a dos demais.

Por meio de cartas, os participantes atribuíram atividades aos órgãos do MPRJ digital pensando na distribuição atual. Depois, redistribuíram de acordo com como julgavam ser a divisão após o realinhamento dos órgãos. As atribuições presentes nas cartas haviam sido levantadas por meio de um questionário, no qual os órgãos responderam de forma objetiva o que fazem e o que não fazem.

Ao final das atividades com os grupos, o Inova_MPRJ registrou entrevistas com os coordenadores e subcoordenadores de cada órgão do MPRJ digital. As entrevistas foram, em seguida, processadas para destilar a visão sobre o MPRJ do futuro e o realinhamento dos órgãos.

Na segunda fase, entrou a ciência de dados. O desafio era processar toda a informação levantada na atividade de design e transformá-la em conhecimento estruturado. Como era de se esperar, não houve consenso completo sobre quais órgãos deveriam ter quais atribuições.

Assim, o Inova_MPRJ criou um algoritmo — disponível no GitHub — com o objetivo de exprimir ao máximo possível o consenso. O resultado do algoritmo foi exposto graficamente para as coordenadoras e coordenadores dos órgãos em mais uma atividade de design.

O resultado mostrou algumas surpresas. Na reunião seguinte, com todos os coordenadores, cada um votou em quais tópicos gostariam de abordar como grupo. Os mais votados foram levados para debate com tempo determinado. O objetivo foi ouvir as diversas opiniões sobre os pontos de maior discordância, na esperança de reduzi-la.

Aprendizados

Governança de projetos_ Muitas atribuições são comuns ou se integram entre órgãos do grupo MPRJ digital. Por isso, é importante ter um repositório central com informações sobre todos os projetos em desenvolvimento. Somente a partir de uma gestão transparente dos projetos será possível evitar retrabalho; gasto de recursos humanos e financeiros; e possibilitar uma atuação mais integrada.

Plano estratégico de órgãos e resoluções_ O Vértice foi um pontapé inicial para os órgãos repensarem sua atuação. A partir dos resultados do projeto, os órgãos do MPRJ digital possuem um material rico para redesenhar seus planos estratégicos e, quando necessário, redigir novas Resoluções. Para a elaboração dos planos, o Inova_MPRJ ressalta a existência de métodos robustos e próprios à tarefa.

Método de trabalho integrado_ Diversos órgãos de execução do MPRJ (promotorias e procuradorias de justiça) possuem atuação pulverizada e pouco tática. Os órgãos do MPRJ digital podem contribuir para superar esse desafio. Cada caso pode ser encarado como um convite para pensar em soluções táticas, para o mesmo tema e para casos semelhantes que se repitam no mesmo ou em outro órgão de execução.

Um dos grandes fatores de integração pode ser o desenvolvimento e uso de um método de trabalho que seja aplicável a vários desafios temáticos dos órgãos de execução. O Inova_MPRJ desenvolveu recentemente o Fluxo de Transformação, uma proposta nesse sentido.

O Vértice comprovou para o Inova_MPRJ e para todos os 113 envolvidos o potencial do uso das ferramentas de design e ciência de dados. Ao final do projeto, o sentimento predominante foi de ganho de clareza e integração entre os órgãos. Acreditamos que os próximos passos, partindo do material produzido, trará o MPRJ mais próximo da visão de uma Instituição que levou a transformação digital ao seu máximo potencial.

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