Por que aprender a lidar com sentimentos pode ser a maior inovação da sua empresa em 2018?

Lais Trajano
Inova Gente
Published in
7 min readApr 24, 2018

Engana-se quem pensa que o futuro do mercado de trabalho é apenas tecnológico. O sucesso dos negócios não depende somente do investimento em tecnologia, mas, principalmente, do cuidado com os colaboradores.

Essa não é a visão, entretanto, da grande maioria das empresas, que age como se as pessoas tivessem um botão de desligar sentimentos no instante em que entram no escritório.

Já ouviu falar sobre sessão de escutatória? Essa é uma maneira de descobrir quais emoções estão guiando seu time, seja raiva, tristeza, medo ou amor.

As organizações precisam aprender a lidar com essas questões intangíveis, subjetivas, abstratas e emocionais e olhar para o conjunto mente, corpo e coração. Essa é a chave para destravar o engajamento, a agilidade, o alcance de resultados e a criatividade, que possibilita a inovação.

1) precisamos aprender a lidar com o subjetivo porque é fundamental para PESSOAS: sentimentos são a raiz de problemas de insatisfação, baixa performance, desengajamento de funcionários, estresse e doenças.

Você acabou de entrar em uma nova empresa? Acabou de receber um aumento ou promoção? Se você não está em nenhum desses dois momentos, é bem provável que você esteja infeliz com seu emprego. Em 2017, quase 80% dos brasileiros estavam insatisfeitos com o seu trabalho. Esse número representaria quase todos os colaboradores de uma empresa, exceto os novatos empolgados, os recém promovidos e, claro, os donos.

Durante anos, fiz entrevistas de desligamento para entender o motivo pelo qual um colaborador estava pedindo demissão. Em 100% dos casos, as pessoas inicialmente justificavam a saída por questões financeiras. Mas, 90% desses casos, na verdade, não tinham nada a ver com questões racionais e sim com questões do coração.

A conversa sempre começava com o colaborador afirmando gostar da empresa, mas ter recebido uma proposta com salário superior. E mesmo que fosse um aumento pequeno, ele havia decidido sair.

Depois de pelo menos trinta minutos explorando os motivos através da escuta ativa, fazendo perguntas e abrindo um diálogo honesto, conseguia descobrir o real motivo. Já ouvi falas como: “a verdade é que meu santo não bateu com o do meu chefe”, “é que minha mulher tem ciúmes da outra analista aqui da empresa”, “estou cansado de viajar tanto a trabalho e não ser reconhecido por esse sacrifício”, “estou saindo porque não me sinto parte, não tenho amigos aqui”, “me apaixonei por uma pessoa do trabalho e preciso sair”, e por aí vai…

Através dessas experiências e de algumas pesquisas, percebemos que a maioria dos problemas que fazem alguém não performar ou não estar engajado são de origem abstrata, subjetiva, sentimental.

E com dificuldades dessa natureza, as empresas não estão nem um pouco acostumadas a lidar. Afinal, elas não entendem a relação entre profissional e pessoal. É preciso compreender que quando se contrata um profissional, a pessoa vem junto, pois o ser humano é uma coisa só, uma unidade! :)

Nas pesquisas de clima, esses pontos subjetivos consequentes da falta de comunicação entre áreas, competição entre líderes e times, insatisfação com salários e falta de inspiração até aparecem, mas de maneira muito sutil.

Afinal, essas pesquisas, geralmente, são racionais e numéricas, medidas apenas quantitativamente. Não há uma medição qualitativa para analisar os motivos por trás dos números. Por isso, além de muitos colaboradores serem descrentes em relação a elas, também parece desconfortável falar sobre sentimentos tão delicados em um questionário frio e anônimo.

Dessa forma, é necessário ter um nível acentuado de sensibilidade para identificar as pessoas que estão sofrendo dentro da sua organização. Uma dica é observar fatores como doenças, ausências, excesso de horas de trabalho, discussões acaloradas e absenteísmo.

A partir dessa análise, aposte em uma abordagem humana para conhecer os medos, raivas e tristezas dos colaboradores, deixando de fingir que esses sentimentos não atrapalham ou que não são problema da empresa. E assim, atue sempre em cima dos sentimentos para ter pessoas engajadas e saudáveis no seu negócio.

2) precisamos aprender a lidar com o subjetivo porque é importante para o NEGÓCIO: sentimentos incompreendidos atrasam projetos, confundem as decisões, fazem a empresa perder tempo e emperram inovações.

Há inúmeras situações nas quais emoções e sentimentos inconscientes ou não resolvidos atrapalham uma empresa. Por exemplo, um diretor que compete com outro e sabota um projeto interessante por raiva; um colaborador que omite informações relevantes sobre um produto em desenvolvimento por medo e atrapalha uma decisão; sócios que trocam alfinetadas em reuniões; um gerente inseguro que demora muito para tomar uma decisão importante; um colaborador triste que atrapalha uma negociação ou uma venda; um funcionário gay que se sente rejeitado no ambiente e não consegue se comunicar bem com outras pessoas.

Apesar de muitos desses sentimentos exemplificados não serem perceptíveis, eles estão dentro dessas pessoas e guiam suas atitudes que, por consequência, modelam a empresa.

Sabendo disso, para sua organização ir em direção à inovação, é ainda mais fundamental aprender a lidar com emoções e sentimentos. Muitos teóricos e referências do empreendedorismo afirmam que as pessoas devem perder o medo de errar. Porém, falta algo nesse discurso: dizer que esse medo está diretamente ligado ao ambiente.

Se o ambiente é hostil, as pessoas não vão se arriscar a tentar coisas novas por medo do apedrejamento ou da demissão diante de um erro. Por isso, para que elas saiam da zona de conforto, é necessário um ambiente leve onde prevaleça a confiança em si e nos outros. Ninguém sai do seu quadrado quando está em um ambiente hostil.

Pense bem: será, então, que sua empresa tem um ambiente seguro para que as pessoas se sintam à vontade para ousar? Como ela lida com erros, falhas e surpresas? As pessoas realmente se expressam no seu trabalho?

Diante disso, como prefiro dar exemplos em vez de teorias, e dar soluções em vez de problemas, aqui vão algumas ideias para explorar o subjetivo dentro da sua empresa:

Sessões de Escutatória: são sessões nas quais o presidente e a alta liderança da empresa reservam sua agenda para ouvir os colaboradores. De forma muito simples, o líder manda um email para todo o time dizendo que estará disponível no dia X. As pessoas, então, marcam nas suas agendas e, no dia combinado, têm a oportunidade de compartilhar o que quiserem. Um bom líder saberá escutar com atenção e identificará todas as feridas. Essa metodologia foi inventada por mim com base em uma ótima crônica do Rubens Alves, que leva esse nome.

Constelação Sistêmica Organizacional e Inteligência Sistêmica: esse processo traz LUZ para questões veladas, feridas antigas, sentimentos escondidos dentro de um grupo ou organização. As pessoas e empresas carregam com elas seu próprio sistema, suas memórias, medos, traumas, padrões de comportamento, histórias e vivências que acabam aparecendo e influenciando (MUITO) no que se passa ali no dia a dia. Recomendo a Hipertema para esse processo muito poderoso.

Comunicação não violenta: essa comunicação incentiva a OUVIR e a FALAR de sentimentos, mostrando como lidar com conversas difíceis e praticar a escuta ativa, feita com o coração. Até porque as feridas sempre surgem de necessidades não atendidas. Então, se uma pessoa reconhece a necessidade da outra, ela consegue transcender a discussão e chegar em um lugar de diálogo empático. Nesse assunto, recomendo o maravilhoso Cesar Matsumoto.

Storytelling: essa técnica auxilia em FALAR melhor e organizar pensamentos e mensagens que quer passar. Muitas pessoas têm dificuldade em contar o que fazem, explicitar uma ideia, comunicar um projeto, explicar um problema ou a importância de algum acontecimento no trabalho. Para isso, recomendo os amigos da Social Docs.

Rodas de diálogo: talvez essa seja a prática mais simples listada aqui. Trata-se de separar 30 minutos ao final de reuniões mensais de status, treinamentos e reuniões grandes para fazer um diálogo aberto, com todos os colaboradores sentados em roda, seguindo uma única regra: fazer qualquer pergunta para qualquer pessoa (claro que um por vez).

Fuckup nights: são noites de happy hour nas quais cada pessoa pode contar algo que deu errado. As pessoas se voluntariam para discursos de 15 minutos e celebram o erro com muitas risadas. O objetivo é de aprendizado em um ambiente leve e descontraído.

Meditação e respiração: além de inúmeros benefícios físicos como a melhora no sono e na disposição, a meditação ajuda a aumentar o foco e diminuir a ansiedade e o estresse, encontrando a paz no momento presente. Ao sair do modo “automático” e entrar nesse estado mental, o indivíduo consegue tomar consciência dos seus sentimentos. Indico a Dani Wang e os cursos. da Arte de Viver.

Brincadeiras de palhaço: cursos, workshops e atividades pontuais que usam jogos e brincadeiras para explorar o arquétipo do palhaço. Elas geram muitas risadas, provocações e autoconhecimento de um jeito leve. Recomendo o competente time POP, Palhaços a Serviço das Pessoas.

Esses são alguns dentre os vários outros temas importantes de explorar como relacionamento das pessoas com o dinheiro e seus Money Blocks, junto à Karinna Forlenza, a colaboração usando o jogo do capitalismo consciente, da Apoena e o equilíbrio entre energia yin e yang usando aikido e outras atividades para explorar o corpo, com a Tanzen.

Em suma, inovar na gestão de pessoas, a ponto de enfrentar os sentimentos do seu time e incluir a lógica abstrata no seu dia a dia, é o que faz uma organização ter uma cultura forte, estratégica e valiosa nesse novo mundo. Para explorar a seara do abstrato, portanto, é importante ir além da mente e pensar no corpo e no coração, ou seja, sair apenas do prático, racional, tecnológico, processual e do mundo das hard skills, que normalmente só estão preocupadas com lucro e resultado.

E na sua empresa? Como lidam com essas questões? Compartilhe com a gente :)

**artigo originalmente publicado no meu Linkedin.

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Lais Trajano
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