Existe uma versão de 6 semanas para tudo
Organizando projetos e equipes com expectativas factíveis, sem microgerenciamento e fazendo uma coisa de cada vez.
Projetos intermináveis, equipes exaustas, expectativas nunca atingidas e, muitas vezes, nenhuma conquista palpável. Não investir na organização do trabalho pode custar muito caro. No setor público, mais ainda; afinal, a falta de efetividade impacta diretamente os serviços prestados ao cidadão.
No cerne do problema está a frequente concentração de esforços na execução do trabalho em detrimento da melhoria de métodos, processos e práticas para sustentá-lo. Ainda que o objetivo final seja aprimorar programas, políticas e serviços públicos, um órgão de governo (ou controle) precisa, antes de tudo, aprimorar seu próprio funcionamento.
É fundamental tratar órgãos e instituições públicas como produtos em si, que devem aprender e evoluir constantemente na forma como trabalham. É um processo contínuo que demanda olhar direcionado, experimentação e dedicação de tempo. As conquistas se tornam consequência.
O Inova_MPRJ organiza seus projetos mantendo expectativas factíveis, conferindo autonomia às equipes e valorizando o importante exercício de dizer “não”. Em homenagem à nossa inspiração, o livro Shape Up, batizamos o método como “Molda Aê”.
Ciclos de 6 semanas
O escopo se ajusta ao tempo, e não o contrário. Ou seja, fixamos intervalos de tempo e “moldamos” os escopos para eles. Sabemos que existe a Lei de Parkinson: o trabalho se expande de modo a preencher o tempo disponível para sua realização. Portanto, não há prolongamento de prazos — 6 semanas é o período máximo para os escopos que moldamos, nossas “apostas”.
Por que 6 semanas? Um pouco de ciência, um pouco de arte: pesquisamos bastante sobre organizações que admiramos, experimentamos alguns formatos e esse funcionou. Na prática, confirmamos que é tempo suficiente para construir algo relevante do início ao fim e curto o bastante para o prazo exercer influência na motivação das equipes.
Dentro de cada ciclo, podemos fazer três tipos de aposta: de 6, 3 ou 2 semanas. Assim, cada equipe trabalha com 1 aposta de 6 semanas, 2 apostas de 3 semanas ou 3 apostas de 2 semanas — idealmente com dedicação exclusiva. Entre os ciclos, separamos 2 semanas para ajustes, reflexões, livre exploração de ideias e definição das apostas e equipes para o ciclo seguinte.
Para montar as equipes, levamos em consideração os interesses de cada um e as habilidades necessárias para os diferentes tipos de desafio. Às vezes também contamos com colaboradores externos — os Fagulhas. Em geral, nos dividimos em 3 equipes, que variam entre duplas e trios.
Moldar significa direcionar sem tirar liberdade
Enquanto as equipes trabalham nos projetos, o coordenador lidera o trabalho de moldagem para o ciclo seguinte. O desafio é conseguir atingir o ponto médio entre concretude e abstração. Em outras palavras, equipes precisam saber o que fazer, mas o excesso de definições tira liberdade e potencial criativo.
Quem molda, ao invés de imaginar a duração de determinado trabalho, pensa em quanto tempo deseja separar para ele. Então, afunila a solução até que ela caiba dentro do tempo disponível. Não se trata de correria, moldamos escopos que preservam as 40 horas de trabalho semanais e boas decisões ao longo do caminho.
Apostas obviamente envolvem riscos: problemas inesperados, dependências que travam o andamento, má mensuração do tempo ou até mesmo baixa produtividade individual. Por isso, resolvemos questões em aberto antes de apresentar as apostas aos times.
Definimos os limites; rascunhamos os elementos que a solução precisa conter; ajustamos os escopos para desviar de armadilhas; e escrevemos o “arremesso” — documento que resume o problema, solução esperada, inspirações e pontos de atenção. Se alguma dessas questões ainda parecer incerta, deixamos a aposta para depois.
Morte lenta ao microgerenciamento
Quando o projeto começa, a equipe ganha autonomia para se dividir, organizar tarefas e construir as soluções. Não há trabalho mecânico nem execução acrítica de demandas. No Inova_MPRJ, trabalhamos conferindo autonomia e confiança a todos.
Quando times são autônomos, a coordenação passa menos tempo os gerenciando e, consequentemente, consegue moldar melhores apostas para o ciclo seguinte. Apostas bem moldadas, por sua vez, garantem maior convergência de visões e mais facilidade para os times trabalharem com autonomia. Quem ganha é a organização.
Por essas razões, abominamos o microgerenciamento. A coordenação não mede progresso tarefa por tarefa, nem mesmo semana por semana. A equipe é responsável por se autogerenciar de maneira fluida. De rígido, só o prazo de (até) 6 semanas para a entrega.
Isso não quer dizer que não há interação com a coordenação. Além da atividade contínua de moldagem e, sempre que preciso (mas excepcionalmente), colocar a mão na massa, o coordenador do Laboratório atua como uma espécie de analista de qualidade. Equipes têm liberdade para solicitar pontos de checagem e validações de rumo ao longo do caminho.
“Não agora, talvez depois”
Dizer sim é muito fácil. Sim para um projeto paralelo, para uma nova funcionalidade, para um cronograma super otimista… Rapidamente, a pilha aumenta tanto que deixamos de ver o que realmente deveríamos estar fazendo.
É melhor escolher o “não” como resposta padrão, mesmo para as melhores ideias. Dizer não ajuda a entender as reais prioridades e traz maior tranquilidade na execução do trabalho. Apesar de parecer mais difícil, é melhor saber que o não já está dito e poder pensar no sim como alternativa. “Não agora, talvez depois”.
Antes de estruturarmos o Molda Aê, era quase impossível colocar essas ideias em prática. Hoje, temos argumentos sólidos para dizer não às novas ideias que não param de surgir — de nós mesmos, de parceiros e principalmente dos chefes. Afinal, teremos nova chance de dizer sim em, no máximo, 6 semanas.
E se algo der errado?
Perder 6 semanas não é o fim do mundo. Ainda mais considerando que cada equipe tem apenas 2 ou 3 integrantes e que laboratórios são ambientes de experimentação. Analisamos o que deu errado, ajustamos o mais rápido possível e bola pra frente. Essa é a graça do planejamento adaptativo.
Caso uma aposta estenda seu cronograma além do prazo, o padrão é “desligar o disjuntor”, para garantir que não sigamos antes das devidas reflexões. Contudo, se a equipe entender que um projeto ainda pode render mais entregas concretas e relevantes, nada impede que ele seja escolhido em novas rodadas de apostas à medida em que evolui.
Deseja saber de onde vêm as ideias e como escolhemos o que entrará em cada ciclo? Em breve, teremos um artigo específico para detalhar esse processo de seleção de ideias.
E se tiver alguma ideia inovadora para melhorar processos e cultura de trabalho, deixe um comentário ou escreva para nós em inova@mprj.mp.br.
Com Bernardo Chrispim, Beatriz Ferreira, Daniel Lima Ribeiro, Gabriel Delman, Júlia Rosa, Leonardo Santanna, Letícia Albrecht, Manuella Caputo, Marcelo Coutinho e Matheus Donato.
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