A Celebração e a Doutrina do Batismo

Philip Schaff

Instituto Aletheia
Instituto Aletheia
14 min readJun 13, 2020

--

A CELEBRAÇÃO DO BATISMO

LITERATURA

A Literatura, ver no vol. I, § 54, p. 465, segs., especialmente Wall e Höfling. Sobre a arqueologia do batismo, ver Bingham: Antiquities; Augusti: Denkwürdigkeiten; o volume I de Binterim e o artigo Baptism em Smith e Cheetham, I, 155–172. Também Schaff, sobre a Didaquê (1885), p. 29–56. Para ilustrações pictóricas, ver as obras monumentais de Cav. De Rossi, Garrucci, Roller, sobre as catacumbas, e Schaff, l.c.

A “Instrução dos Doze Apóstolos” (cap. 7) ordena o batismo, após a instrução catequética, nessas palavras: “Batiza em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo em água viva (corrente). Porém, se não tiveres água viva, batiza em outra água; e se não puderes em água fria, faze-o em água morna. Entretanto, se não a tiveres, derrama (ἔκχεον) água sobre a cabeça três vezes, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”.

Justino Mártir dá o seguinte relato do batismo: [1] “Todos quantos convenceram-se da verdade de nossa doutrina, e prometeram viver conforme a mesma, são exortados a orar, jejuar e arrepender-se pelos pecados passados; com eles nós oramos e jejuamos. Em seguida, eles são conduzidos por nós a um lugar onde há água, e assim são regenerados, como nós também fomos regenerados; isto é, eles recebem a água batismal em nome de Deus, o Pai e Soberano de todos, e do nosso Redentor Jesus Cristo e do Espírito Santo. Porquanto Cristo diz: A menos que nasçais de novo, não podeis entrar no reino dos céus (João 3.5). Assim, de filhos da obrigação e da ignorância, tornamo-nos filhos da escolha e da sabedoria, e participantes do perdão dos pecados de outrora. […] A lavagem batismal é também chamada iluminação (φωτισμός), pois aqueles que a recebem são iluminados no entendimento”.

Este relato também pode ser complementado pelos detalhes seguintes de Tertuliano e escritores posteriores.

Antes do ato, o candidato era obrigado em voto solene a renunciar ao serviço do diabo, isto é, todo o mal, [2] entregar-se a Cristo e confessar a suma da fé apostólica em Deus Pai, Filho e Espírito Santo. [3] O Credo Apostólico, portanto, é propriamente o símbolo batismal, uma vez que se desenvolveu, na verdade, da fórmula batismal.

Este ato de desviar-se do pecado e voltar-se para Deus, ou do arrependimento e da fé, por parte do candidato, era seguido por uma oração apropriada do ministro, e então pelo próprio batismo no nome triuno, com três imersões sucessivas em que os diáconos e as diaconisas auxiliavam. A imersão consistia em mergulhar três vezes a cabeça do candidato que permanecia nu na água. [4] A imersão única parece ter sido introduzida por Eunômio por volta de 360, mas foi condenada sob pena de aviltamento, conquanto tenha reaparecido mais tarde na Espanha, e o Papa Gregório I tenha declarado válidas ambas as formas: a imersão trina como demonstrando a Trindade, e a imersão única, a Unidade da Divindade. [5] A Igreja Oriental, todavia, ainda adere estritamente à imersão trina. [6] O batismo por derramamento de água de um casco, de um vaso ou da mão sobre a cabeça do candidato ocorre muito cedo também, e provavelmente foi considerado equivalente à imersão. [7] A Didaquê permite a aspersão em casos de escassez de água. No entanto, mais tarde esse modo foi aplicado apenas a pessoas doentes ou enfermas; daí ser chamado batismo clínico. [8] A validade deste batismo foi até questionada por muitos no terceiro século; e Cipriano escreveu em sua defesa, assumindo o argumento de que o modo da aplicação da água era uma questão de menor importância, visto que a fé estava presente no receptor e no ministrante. [9] De acordo com a lei eclesiástica, o batismo clínico pelo menos incapacitava para o ofício clerical. [10] Não obstante, Fabiano, bispo de Roma, ordenou Novaciano um presbítero, embora ele tivesse sido batizado por aspersão quando acamado. [11]

A ação de graças, a bênção e o beijo fraternal encerravam a cerimônia sagrada.

Afora estes elementos essenciais do rito batismal, nós encontramos, antes do terceiro século, vários outros costumes subordinados, que têm, com efeito, um belo sentido simbólico, mas, como todas as redundâncias, poderiam facilmente obscurecer a simplicidade original deste sacramento, como se mostra na descrição de Justino Mártir. Entre esses apêndices estão o sinal da cruz na testa e no peito do sujeito, como um soldado de Cristo sob o estandarte da cruz; dar-lhe leite e mel (sal, também) como sinal da filiação com Deus e da cidadania na Canaã celestial; também a unção da cabeça, o círio aceso e o roupão branco.

O exorcismo ou a expulsão do diabo, que não deve ser confundida com a fórmula essencial da renúncia, era provavelmente praticada, a princípio, apenas em casos especiais, como de possessão demoníaca. Entretanto, depois do Concílio de Cartago, 256 A.D., encontramo-lo em uma parte regular da cerimônia do batismo, antecedendo o batismo propriamente dito, e, em certos casos, ao que parece, várias vezes repetido durante o decorrer da instrução catequética. Para compreender plenamente este costume, devemos lembrar que a igreja antiga remontava todo o sistema da idolatria pagã, que é corretamente abominada como um dos maiores crimes, [12] à agência de Satanás. As deidades pagãs, embora tivessem sido homens eminentes durante suas vidas, eram, com respeito ao seu princípio animador, identificadas com demônios — ou com anjos caídos ou com sua progenitura. Acreditava-se que esses demônios, como podemos inferir de muitas passagens de Justino, Minúcio Félix, Tertuliano e outros, percorriam o ar, vagueavam pela terra, enganavam e atormentavam a raça humana, apoderavam-se dos homens, encorajavam os sacrifícios, espreitavam as estátuas, falavam por intermédio dos oráculos, dirigiam o voo dos pássaros, operavam ilusões de encantamento e necromancia, ludibriavam os sentidos por meio de falsos milagres, incitavam perseguição contra o cristianismo, e, na verdade, sustentavam toda o arcabouço do paganismo com todos os seus erros e vícios. Porém, mesmo esses espíritos malignos eram sujeitos ao poderoso nome de Jesus. Tertuliano desafia abertamente os adversários pagãos a trazerem endemoninhados perante os tribunais, e afirma que os espíritos que os possuíam dariam testemunho da verdade do cristianismo.

A instituição dos padrinhos, [13] mencionada pela primeira vez por Tertuliano, surgiu, sem dúvida, do batismo infantil, e destinava-se a assegurar a formação cristã, sem com isso escusar os pais cristãos de seu dever.

O batismo poderia ser administrado em qualquer momento, mas estava comumente conectado com a Páscoa e o Pentecostes, e no Oriente, também com a Epifania, para conferir-lhe a maior solenidade. A hora favorita era a meia-noite, iluminada por tochas. Os homens eram batizados primeiro; as mulheres, depois. Durante a semana seguinte, os neófitos trajavam vestes brancas como símbolos de sua pureza.

As capelas separadas para o batismo ou batistérios surgiram primeiro no século IV, e muitas delas ainda subsistem no sul da Europa. O batismo podia ser realizado em qualquer lugar onde, como diz Justino, “houvesse água”. Ainda assim, Cipriano, em meados do terceiro século, e as Constituições Pseudoapostólicas, exigem que o elemento seja previamente consagrado, a fim de que possa tornar-se o veículo da energia purificadora do Espírito. Isso correspondia à consagração do pão e do vinho da Ceia do Senhor, e não envolvia transformação alguma da substância.

A DOUTRINA DO BATISMO

Esta ordenança era considerada na igreja antiga o sacramento do novo nascimento ou regeneração, e como o rito solene de iniciação à Igreja Cristã, recebendo todos os seus benefícios e comprometendo-se às suas obrigações. Devia ser precedido, no caso de adultos, pela instrução por parte da igreja, e pelo arrependimento e fé (i.e., conversão) por parte do candidato, e completar e selar o processo espiritual de regeneração, o velho homem sendo enterrado e o novo homem levantando-se da sepultura aquosa. Seu efeito consiste no perdão dos pecados e na transmissão do Espírito Santo. Justino chama ao batismo “o banho para o perdão dos pecados e a regeneração”, e “o banho da conversão e do conhecimento de Deus”. É também amiúde chamado de iluminação, circuncisão espiritual, unção, selo, dom da graça, símbolo da redenção, morte dos pecados, etc. [14] Tertuliano descreve seu efeito assim: “Quando a alma vem à fé e transforma-se através da regeneração pela água e poder do alto, ela, após ser removido o véu da velha corrupção, descobre toda a sua luz. É recebida à comunhão do Espírito Santo; e a alma que se une ao Espírito Santo é seguida pelo corpo”. Ele já se inclina à noção de uma operação mágica da água batismal. Ainda assim, a condição subjetiva de arrependimento e fé era universalmente exigida. O batismo era não apenas um ato de Deus, mas, ao mesmo tempo, a mais solene rendição do homem a Deus, um voto para a vida e a morte, para viver doravante somente para Cristo e seu povo. O cumprimento deste voto era a condição de permanência na igreja; sua quebra devia seguir-se ou de arrependimento ou de excomunhão.

De João 3.5 e Marcos 16.16, Tertuliano e outros pais argumentaram a necessidade do batismo para a salvação. Clemente de Alexandria supunha, com o romano, Hermas, e outros, que mesmo os santos do Antigo Testamento foram batizados no Hades por Cristo ou pelos apóstolos. Mas a exceção foi feita em favor do batismo sangrento do martírio como compensando a carência do batismo com água; e isto levaria ao princípio evangélico, de que não a falta, mas apenas o desprezo do sacramento é condenatório. [15]

Pensava-se, contudo, que o efeito do batismo se estendia tão somente aos pecados cometidos antes de recebê-lo. Daí a frequente postergação do sacramento, [16] que Tertuliano recomenda de maneira demasiado séria, conquanto a censure quando acompanhada de leviandade e presunção moral. [17] Muitos, como Constantino, o Grande, o adiavam para o leito de enfermidade e de morte. Preferiam o risco de morrer não batizados ao de perder para sempre a graça batismal. Os batismos em leito de morte eram então o que são hoje os arrependimentos em leito de morte.

Entretanto, levantou-se, então, a questão: como o perdão dos pecados cometidos após o batismo podia ser obtido? Este é o ponto de partida da doutrina romana do sacramento da penitência. Tertuliano [18] e Cipriano [19] foram os primeiros a sugerir que a satisfação por tais por tais pecados deve ser feita por meio de exercícios penitenciais autoimpostos e boas obras, como orações e esmolas. Tertuliano defendia que sete pecados graves, os quais denotava como sendo pecados mortais, eram imperdoáveis depois do batismo, entregues às misericórdias que Deus não prometera; mas a Igreja Católica assumiu uma visão mais branda, recebendo de volta mesmo os adúlteros e apóstatas em seu arrependimento público.

OBSERVAÇÃO

Ao recapitular a doutrina patrística do batismo que foi sancionada pelas Igrejas Grega e Romana, e, com algumas modificações importantes, também pela Luterana e pela Anglicana, nós devemos nos lembrar que, durante os primeiros três séculos, e mesmo na era de Constantino, o batismo de adultos era a regra, e que a conversão real do candidato era exigida como uma condição antes da administração do sacramento (como é ainda o caso em campo missionário). Daí na instrução catequética precedente a renúncia do diabo e a profissão de fé. Mas quando a mesma vista de cima é aplicada sem qualificação ao batismo infantil, somos de imediato confrontados com a dificuldade de que os infantes não podem cumprir com essa condição. Eles podem ser regenerados (sendo este um ato de Deus), mas não podem ser convertidos, i.e., não podem se arrepender e crer, nem sequer precisam de arrependimento, não tendo eles ainda cometido nenhuma transgressão atual. O batismo infantil é um ato de consagração, e antecipa a instrução e a conversão pessoal posteriores como uma condição para a plena membresia da igreja. Por isso a confirmação entrou como um suplemento para o batismo infantil.

O estrito dogma católico romano, enunciado claramente pela primeira vez por Santo Agostinho, embora com um coração relutante e na forma mais branda, destina todos os infantes não batizados para o inferno em virtude do pecado de Adão e da necessidade absoluta do batismo para a salvação. Um dogma horribile, mas falsum. Cristo, que é a verdade, abençoou os pequeninos não batizados, e declarou: “Dos tais é o reino dos céus”. A Confissão de Augsburgo (artigo IX), por outro lado, ensina contra os anabatistas: “quod baptismus sit necessarius ad salutem”, mas os principais teólogos luteranos reduzem a necessidade absoluta do batismo a uma necessidade relativa ou ordinária; e as igrejas reformadas, sob a influência do ensino de Calvino, foram além fazendo a salvação depende da eleição divina, não do sacramento, e agora geralmente defendem a salvação de todos os infantes que morrem na infância. A Segunda Confissão Escocesa (1580 A.D.) foi a primeira a declarar sua aversão ao “cruel juízo [papista] contra os infantes que se partem sem o sacramento” e à doutrina da “necessidade absoluta do batismo”.

_____________________________________

[1] Apologia, I, cap. 61 (I, 164, ed. Otto).

[2] Abrenunciatio diaboli. Tertuliano: “Renunciare diabolo et pompæ et angelis cjus”. Const. Apost.: Ἀποτάσσομαι τῷ Σατανᾷ καὶ τοῖς ἔργοις αὐτοῦ καὶ ταὶς πομπαῖς αὐτοῦ, καὶ ταῖς λατρείαις αὐτοῦ, καὶ πᾶσι τοῖς ὑπ’ αὐτόν. Esta renúncia ao diabo era feita, pelo menos no século IV, como somos informados por Cirilo de Jerusalém, no vestíbulo do batistério, com o rosto em direção ao oriente, e a mão erguida na postura de repulsão, como se Satanás estivesse presente (ὡς παρόντι ἀποτάσσεσθε Σατανᾷ), e era por vezes acompanhada por exsuflações ou outros sinais de expulsão do espírito maligno.

[3] Ὁμολόγησις, professio. O credo era dito, ou pelo catecúmeno depois do sacerdote, ou confessado em resposta a perguntas, e com o rosto voltado para o oriente em direção à luz.

[4] Ver as autoridades citadas em Smith e Cheetham, I, 161, e, de forma mais completa, em Augusti, l.c. “Ter mergitamur”, diz Tertuliano. A imersão era bastante natural nas regiões do sul. Os batistérios da era nicena, dos quais muitos subsistem na Ásia, África e no sul da Europa, foram construídos para a imersão, e todas as igrejas orientais ainda aderem a este modo. Garrucci (Storia della Arte Cristiana, I, 27) diz: “Antichissimo e solenne fu il rito d’ immergere la persona nell’ acqua, e tre volte anche it capo, al pronunziare del ministro i tre nomi”. Schultze (Die Katacomben, p. 136): “Die Taufdarstellungen vorkonstantinischer Zeit, deren Zahl sich auf drei beläuft, zeigen sämmtlich erwachsene Täuflinge, in zvei FälIen Knabent von etwa zwölf Jahren, im dritten Falle einen Jüngling. Der Act wird durch Untertauchen vollzogen”. Dean Stanley deleita-se no exagero pitoresco da imersão batismal nos tempos patrísticos em contraste com a aspersão moderna. “O batismo”, diz ele, “era não apenas um banho, mas um mergulho — uma submersão completa nas águas profundas, um salto como no mar revolto ou no rio caudaloso, em que, no momento, as ondas encerram a cabeça daquele que se banha, e ele emerge outra vez como que de uma sepultura momentânea; ou era um impacto de um chuveiro — o jorro de água atravessava a pessoa inteira vindo de amplos vasos, de modo a cobrir o receptor como estando dentro do véu de uma catarata a espadanar. Esta era a parte da cerimônia à qual os Apóstolos davam demasiada ênfase. Era-lhes como um enterro do velho eu de outrora e o ressurgir do novo eu”. Christian Institutions (1881), p. 9. Ver Schaff, l.c. p. 41, ss.

[5] Ep. I, 41, em resposta a Leandro, bispo de Sevilha. Tomás de Aquino (Summa Theol., Tomo IV, f. 615, ed. Migne) cita esta carta com aprovação, mas dá a preferência à trina immersio, como expressando “triduum sepulturæ Christi et etiam Trinitas personarum”.

[6] O Catecismo Ortodoxo Russo define o batismo como “um sacramento, no qual, um homem que crê, tendo seu corpo três vezes mergulhado na água em nome de Deus Pai, Filho e Espírito Santo, morre para a vida carnal do pecado e nasce de novo do Espírito Santo para uma vida espiritual e santa”. No caso de infantes, o ato é geralmente realizado derramando-se água sobre a cabeça, com o resto do corpo sendo imerso. Assim fui informado por um bispo grego.

[7] O derramamento ou a afusão é a prática atual da Igreja Católica Romana. É encontrada pela primeira vez nas catacumbas romanas, uma das quais De Rossi atribui ao segundo século (no Cemitério de Calisto). “É notável que, em quase todas as representações mais antigas do batismo, esta tenha sido preservada para nós, este [a aspersão de água dos vasos sobre o corpo] é o ato especial representado”. Marriott apud Smith and Cheetham, I, 168. Mas a arte da pintura pode representar somente uma parte do ato, não todo o processo; e, em todas as imagens da Catacumba, o candidato está com os pés na água e despido como para a imersão, total ou parcial.

[8] “Baptismus clinicorum” (κλινικοί, de κλ́ίνη, cama); Clinicus ou grabbatarius designava aquele que era batizado quando acamado.

[9] Ep. 69 (tb. 75), ad Magnum. Ele respondeu a questão o melhor que pôde na ausência de alguma decisão eclesiástica naquele tempo. Esta Epístola, ao lado da oposição de Tertuliano ao batismo infantil, é o documento mais antigo na polêmica literatura batismal. Cipriano cita (cap. 12) diversas passagens do A.T. onde a “aspersão” é mencionada como um ato de purificação (Ez 36.25, 26; Nm 8.5–7; 19.8–13), e então conclui: “Donde parece que a aspersão também de água prevalece igualmente com a lavagem salutar (adspersionem quoque aquae instar salutaris lavacri obtinere); e que, quando isto é feito na igreja onde a fé, tanto do receptor como do ministrante, é sã (ubi sit et accipieatis et dantis fides integra), todas as coisas se mantêm e podem ser consumadas e aperfeiçoadas pela majestade do Senhor e pela verdade da fé”. No entanto, na mesma Epístola Cipriano nega a validade do batismo herético e cismático em qualquer forma. Ver abaixo, § 74.

[10] O duodécimo cânon do Concílio de Neocesareia (após 314) ordena: “Todo aquele que recebeu o batismo clínico não pode ser promovido ao sacerdócio, porquanto sua [profissão de] fé não foi de livre escolha, mas por necessidade (ἐξ ἀνάγκης, medo da morte), a menos que ele se sobressaia adiante em zelo e fé ou que haja uma insuficiência de homens [capazes]”. Este cânon passou para o Corpus Juris Canonici, cap. 1, Dist. 57. Ver Hefele, Conciliengeschichte, I, 249 (2ª ed.).

[11] O derramamento e a aspersão ainda eram excepcionais no século IX, segundo Valafrido Estrabão (De Rel. Eccl., cap. 26), mas fizeram um progresso gradativo com a difusão do batismo infantil, como o modo mais conveniente, especialmente nas regiões do norte, e chegaram ao uso comum no Ocidente no final do século XIII. Tomás de Aquino († 1274) diz que, conquanto possa ser mais seguro batizar por imersão, também são admissíveis a afusão e a aspersão (Summa Theol. P. III, Qu LXVI. De Bapt. art. 7: na edição de Migne, Tomo IV, f. 614): “Si totum corpus aquâ non possit perfundi propter aquæ paucitatem, vel propter aliquam aliam causam, opportet caput perfundere, in quo manifestatur principium animalis vitæ”. Na Irlanda, a aspersão parece ter sido praticada muito cedo junto com a imersão. “A imersão trina, com a alternativa da aspersão, é ordenada no Ofício Batismal Irlandês mais antigo, em cuja elaboração, porém, a influência romana é fortemente acentuada”. F. E. Warren, The Liturgy and Ritual of the Celtic Church, Oxford (Clarendon Press), 1881, p. 65. O prof. Norman Fox e outros escritores batistas pensam que, “nem o batismo infantil, nem o uso da afusão e aspersão para o batismo, jamais teriam sido considerados senão para a ideia supersticiosa de que o batismo era necessário para a salvação”. Todavia, esta ideia predominou entre os pais e na igreja grega completamente tanto quanto na romana, enquanto que é rejeitada na maior parte das igrejas protestantes em que a aspersão é praticada.

Lutero buscou restaurar a imersão, mas sem êxito. Calvino assumiu uma visão do assunto semelhante à de Tomás de Aquino, mas foi mais além e declarou que o modo de aplicação era uma questão indiferente, Institutas, IV, cap. 15, § 19: “Quer a pessoa que é batizada seja completamente imersa (mergatur totus), três vezes ou uma, quer a água seja apenas derramada (infusa) ou aspergida sobre ela (aspergatur), não tem importância (minimum refert); porém, isto deve ser deixado a critério da igrejas, conforme as diferenças de países. Não obstante, a própria palavra batizar significa imergir (mergere); e é certo que a imersão era a prática da igreja antiga”. A maioria dos protestantes concorda com Calvino, exceto os batistas, que resgataram a prática antiga, mas apenas em parte (imersão única em vez de trina), e sem as ideias patrísticas da regeneração batismal, do batismo infantil e da necessidade do batismo para a salvação. Eles consideram o batismo um mero símbolo que expõe o fato de que a regeneração e a conversão já aconteceram.

[12] Tertuliano chama-o de “principale crimen generis humani” (De idol. cap. 1), e Cipriano, de “summum delictum” (Ep. X).

[13] Ἀνάδοχοι, padrinhos, fideijussores.

[14] Os termos patrísticos para o batismo expressivos da doutrina são ἀναγέννησις, παλιγγενεσία (e λουτρὸν παλιγγενεσίας, Tito 3.5), θεογένεσις, regeneratio, secunda ou spiritualis nativitas, renascentia; também φωτισμός, φώτισμα, illuminatio, σφραγίς, signaculum, selo, μύησις, μυσταγωγία, iniciação aos mistérios (os sacramentos). O sinal era praticamente identificado com a coisa em si.

[15] “Non defectus (ou privatio), sed contemtus sacramenti damnat”. Isso deixa aberta a porta para a salvação dos quakers, dos filhos não batizados, e pagãos eleitos que morrem com um desejo pela salvação.

[16] Procrastinatio baptismi.

[17] Assim o autor da Apost. Constit., VI, 15, desaprova os que dizem: ὅτιὅταν τελευτῶ, βαπτίζομαι, ἵνα μὴ ἁμαρτήσω καὶ ῥυπανῶ τὸ βάπτισμα.

[18] De Pænitentia.

[19] De Opere et Eleemosynis.

--

--