ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O ASSASSINATO DE SOLEIMANI

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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3 min readJan 5, 2020

Por Fernando Roberto de Freitas Almeida

Foto: DIVULGAÇÃO DO ESCRITÓRIO SUPREMO IRANIANO / EPA-EFE / SHUTTERSTOCK

O ano 2020 começa com uma grave crise internacional, derivada de ação imperial dos EUA, que não deve ser considerada apenas ação intempestiva de Trump. Não que não o tenha sido, mas não se pode esquecer que estas intervenções são usuais. No caso do Irã, a deposição do primeiro-ministro Mossadegh, em 1953, promovida pelos serviços de Inteligência dos EUA e do Reino Unido, mudou inteiramente a política de toda a região e nunca foi — nem pode ser — esquecida.

Em tempos recentes (2008), a democrata Hillary Clinton afirmou “Quero que os iranianos saibam que, se eu for presidente, vamos atacar o Irã”. “Seríamos capazes de completamente aniquilá-los, nos próximos dez anos, caso eles sejam tolos o suficiente em lançar um ataque contra Israel”.

A Inteligência israelense, Mossad, havia apontado o general iraniano como o responsável pelo planejamento de ações contra o território de Israel e as ligações dos EUA com Israel também são históricas, tendo-se aprofundado com a ascensão da extrema-direita em Tel Aviv.

Alguns analistas creem que este ataque a Bagdá foi o segundo maior erro estratégico cometido pelos EUA em décadas, superado apenas pela própria invasão do Iraque, em 2003. Nosso ex-chanceler, considerado em 2009 o melhor do mundo, Celso Amorim, comentou ser o maior risco de III Guerra Mundial, desde a crise dos mísseis em Cuba, em 1963. Convém considerar as alterações vividas pelo sistema internacional pós-fim da URSS. Trump se comprometeu com um conflito não declarado e não poderá mais se retirar dele, nem seu sucessor.

David L. Singer, especialista em Segurança Nacional dos EUA considerou aspectos essenciais:

a) o Irã é uma potência regional, mas deverá optar por ações assimétricas, envolvendo forças pequenas, em qualquer lugar;

b) milícias, de base xiita, poderão ser usadas no Líbano, Iêmen, Iraque e Síria;

c) Trump não parece ter consultado ninguém, nem os europeus, nem Israel.

Sobre os três pontos:

a) O poder militar desproporcional dos EUA (48% dos gastos militares mundiais) impede conflitos diretos, mas não há como vencer uma “guerra ao terrorismo”, como Bush propôs, nem ações de defesa de outros nacionalismos, que Washington costuma classificar como “terrorismo”. Ataques a instalações e cidadãos estadunidenses no mundo todo são esperado. Não há como prevê-los. Dependerão, em grande medida, de indivíduos. Uma intensificação da guerra assimétrica poderia levar ao pior dos mundos: ataque ao território iraniano;

b) Terceiros países próximos, ou interessados, como Rússia e China, avaliarão todas as opções possíveis, para não haver envolvimento militar direto;

c) Soleimani era um herói nacional, e isto obrigará Teerã a dar respostas firmes, o que, sem dúvida, está sendo analisado agora

Quanto ao Brasil, a primeira declaração oficial preocupa e não temos a mais mínima credibilidade internacional para nos posicionarmos em qualquer negociação, resultado de uma política externa pífia.

Fernando Roberto de Freitas Almeida

Carioca, economista e historiador, professor adjunto do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF). Coordenador do curso de Relações Internacionais.

www.institutomosaico.com.br

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