“DIPLOMACIA DA SAÚDE”. COM BOLSONARO?

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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3 min readJun 7, 2021

Por Fernando Roberto de Freitas Almeida

O ex-chanceler brasileiro Ernesto Araújo e o novo ministro das Relações Exteriores, o embaixador Carlos Roberto Franco França. Foto: Marcos Corrêa / PR

Em 6 de abril, sem a presença da imprensa, tomou posse o novo chanceler brasileiro, o diplomata Carlos Alberto Franco França. Formado em Direito, França havia sido indicado por Bolsonaro em 29 de março, após intensa pressão interna e externa pela saída de seu antecessor, o também diplomata Ernesto Araújo que, estranhamente, havia, meses antes, se vangloriado por ter tornado o Brasil um pária no sistema internacional.

Araújo, desde o início, fizera declarações provocadoras de verdadeiro espanto mundial como, por exemplo, ao anunciar que nosso país se empenharia numa espécie de nova Cruzada em nível planetário. Suas sucessivas críticas e comentários non sense sobre a China vinham inquietando profundamente setores do empresariado, em especial os ligados ao chamado agronegócio

O novo responsável pela condução da política externa nunca ocupou posto destacado no exterior e esteve associado ao cerimonial do Itamaraty, tendo nele trabalhado nos governos de Fernando Henrique Cardoso, Dilma Rousseff e Michel Temer. Preocupa-se, como autor, com energia, que começa a ser associada aos grandes problemas atuais, devido à crise hídrica que se agrava a cada dia.

Ao invés de “globalismo” e negacionismo, declarou que precisamos mostrar estarmos “na vanguarda do desenvolvimento sustentável e limpo”.

Sem imprensa na posse, foi necessário distribuir seu discurso posteriormente. Nele, foram destacadas três emergências a serem, segundo o ministro, prontamente enfrentadas: a questão da saúde, as dificuldades da economia e o sempre presente — pelo menos deveria estar, mas foi esquecido desde 2018 — tema do desenvolvimento sustentável. O período de Araujo foi sumariamente ignorado em sua fala inicial.

Outras questões, criadas por um governo que nunca teve um plano estratégico (contentou-se em orbitar o governo Trump), envolvem o relacionamento com países vizinhos, com os quais passamos a praticar um misto de distanciamento com hostilidade. Afinal, não apenas com a China houve agressões gratuitas. Os diversos ataques verbais do presidente à Argentina e a observação do ministro ultraliberal da Economia, de que a Argentina não seria relevante para o Brasil repercutiram globalmente. Paulo Guedes não lembrou que o maior comprador de produtos manufaturados brasileiros continua sendo este vizinho.

Também o relacionamento com europeus foi arrasado e não só pelo pouco caso com a temática ambiental, pois o chanceler francês foi desconsiderado em visita ao Planalto, com o presidente brasileiro, incrivelmente, optando por ir cortar o cabelo no horário agendado.

Como a chancelaria atuará para tentar minorar os danos ainda é assunto em aberto, mas França denominou seu projeto de “diplomacia da saúde”, ou seja, pelo menos nisto buscará reparar as tensões desnecessariamente produzidas pelo antecessor. Contudo, um grande problema — o maior problema — persiste: a presidência continua sendo exercida por um negacionista sem nenhum conhecimento da lógica do sistema internacional contemporâneo.

Fernando Roberto de Freitas Almeida

Carioca, economista e historiador, professor adjunto do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF). Coordenador do curso de Relações Internacionais

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