DISCIPLINA DO SILÊNCIO

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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4 min readJul 26, 2019

Por Vladimir de Oliveira

Quando garoto, adorava ouvir música alta e barulhenta. Possuo em casa alguns discos de vinis dessa época. Estão guardados e marcam um tempo em que ouvir canções no último volume eram um convite a rebeldia e a transgressão. O mais bacana dessa fase é que alguns deles, vinham com a seguinte orientação: “Ouçam no volume máximo”. A ordem era cumprida na íntegra, para a infelicidade dos meus pais e vizinhos.

O tempo passou e para marcar essa nova fase, comecei a perceber que existem sutilezas, belezas e detalhes que cercam a nossa realidade, que são eclipsadas em função do barulho que nos persegue aonde quer que estejamos.

O jornalista Sidney Rezende declarou que: Barulho faz mal à saúde. Para confirmar tal diagnóstico, ele trouxe números de uma pesquisa realizada no EUA, onde o barulho de construção, trânsito, aviões e música alta, podem causar problemas de saúde e trazer infelicidade.

O barulho prejudica o sono, interfere no aprendizado das crianças, fragiliza o sistema imunológico, e aumenta as chances de um ataque cardíaco. Estudo realizado em uma escola primária próxima a estação de trem em Nova York, comprovou que os alunos que sentavam no lado mais barulhento da sala, repetiam de ano. Crianças que estudam perto de aeroportos, mostravam níveis mais altos de adrenalina e cortisol. Estes hormônios são liberados somente em situações de estresse.

Todas essas situações citadas, constroem um mosaico aonde o ruído em estado bruto, vai comprometendo a nossa capacidade cognitiva de discernir a vida e toda a sua riqueza e complexidade.

Mas, o pior ainda está por vir. Se o barulho possui efeitos negativos em nosso organismo, quais seriam os seus resultados, em nossa espiritualidade? Dallas Willard em sua obra: “Ouvindo Deus”, arrisca em dizer que fomos criados exatamente para ouvirmos a voz do Eterno, tabulando diálogos simples e variados com as suas criaturas. Dallas acredita que sem ouvir a voz do Senhor, a nossa existência é confusa e atormentadora, pois fomos biologicamente forjados para entender a vontade Deus através de ações sonoras reais.

O silêncio completo é uma raridade em nossa sociedade, Bernie Krause que grava sons da natureza para filme e televisão, disse que em 1968 para obter uma hora de som natural limpo, sem aviões, sem carros, demorava 15 horas de gravação, e que hoje para obter a mesma hora de som limpo, demoraria 2000 horas de gravação. Esse silêncio total é o que chamamos de “quietude”, significa um pouco menos de ruídos.

O Senhor Jesus que praticava constantemente a disciplina do silêncio, falou com maestria: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei”.

Se 183 milhões de pessoas são regularmente expostas a ruídos classificados como excessivos pela Agência Americana de Proteção Ambiental, como poderei ser aliviado, tratado e restaurado pelo Rabino-Deus, se eu não ficar quieto e não escutar a sua voz?

Talvez o milagre que tanto almejamos não virá de mais uma sessão de terapia, nem sermão ou livro de auto-ajuda, mas simplesmente de escutar a voz de Deus.

Os nossos encontros são formados por pessoas que na sua grande maioria, passaram a semana inteira interagindo com todas manifestações sonoras provocadas pelo barulho. Sendo assim, ao chegarem em seus templos, esperam com toda avidez ouvirem a voz do Senhor por intermédio do seu pastor/padre/rabino/sheik.

Mas como discernir a voz do Criador do Universo entre o prelúdio e o poslúdio? Como saber de fato que é Deus ou o orador que falou?

Como criar o hábito de ouvirmos a voz de Deus, em meio a uma rotina pautada por tanta interferência sonora?

Alguns aprenderam a levantar no meio da noite, ao fazerem isso, encontram um silêncio profícuo que ajuda a oração e o estudo sem interrupção. Claro que é também importante praticarmos o silêncio de não falar. Tiago afirma que aqueles que não tropeçam no que dizem são perfeitos, sendo também “capazes de dominar todo o seu corpo”.

O profeta Elias, quando esteve na caverna, percebeu que Deus não falava por intermédio dos ventos, terremotos e chamas, mas por meio do “cicio tranquilo e suave”.

Tal expressão pode significar “o sussurro suave de uma voz” ou “um murmúrio tranquilo”. Todos termos sinalizam que o meio utilizado para a transmissão da mensagem não chamava a atenção.

Creio que é possível fazermos uma mudança drástica de nossa relação com o Senhor, e que essa revolução passa diretamente pela disciplina do silêncio.

Que comece a revolução!

Vladimir de Oliveira

Formado em Teologia pelo STBSB e Pedagogia pela UNESA. Possuí Pós-Graduação em Gestão Escolar. É Coordenador Pedagógico/Articulador Social da Casa Semente, que fica em Jardim Gramacho. Vlad também é o Mentor/Pastor da Redenção Baixada. A Redenção é uma Igreja Simples com ênfase em Direitos Humanos & Justiça Social, que se reúne em um Co-Working na #BXD.

www.institutomosaico.com.br

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