Entrevista com Mussolini
O fascismo é de Direita
Benito Mussolini morreu em 1945. Não poderia, portanto, ser entrevistado agora, mais de meio século depois de seu falecimento. Esta entrevista, então, é obviamente falsa.
No entanto, ela também é verdadeira, no sentido de que todas as frases atribuídas a Mussolini foram efetivamente escritas por ele, em seus numerosos discursos e artigos de jornal.
E, numa época em que a direita anda tão enrustida, vale a pena relembrarmos a linguagem do Duce, ainda que na forma de uma brincadeira.
Para que a brincadeira seja mais divertida, sugiro que ao ler as perguntas e respostas formuladas a seguir, os leitores imaginem a figura ultraconhecida do ditador revirando os olhos, estufando o peito e gesticulando muito, com os punhos fechados, a cada ocasião, expressando suas opiniões, rudes e francas. De repente, neste Brasil que nós vemos atualmente, todas as vozes se dizendo de centro-esquerda, vale a pena a gente ouvir uma voz inequivocamente de direita.
- O que é exatamente o fascismo que o senhor fundou?
- O fascismo é antes de tudo uma fé. O fascismo é uma grande mobilização de forças morais e materiais.
- Qual é a concepção fascista do Estado?
- O Estado é o absoluto. Não pode existir nenhum indivíduo, nenhum grupo, fora do Estado. O Estado fascista é vontade de potência e de domínio. Nesse sentido, o Estado fascista é totalitário.
- Qual é o ideal de vida dos fascistas?
- A vida, tal como o fascismo a concebe, é grave, austera, religiosa. O fascismo despreza a vida cômoda, acredita na santidade e no heroísmo. Mais vale viver um dia como leão do que cem anos como carneiro.
- O que é mais importante, o arado ou a espada?
- O arado abre o sulco na terra, mas é a espada que o protege.
- Como o fascismo encara a guerra?
- A guerra é para o homem o que a maternidade é para a mulher. Prefiro que o mundo se surpreenda com a agressividade dos italianos em vez de se divertir com as nossas canções.
- O que o senhor pensa do imperialismo?
- É uma manifestação de vitalidade, uma tendência inerente à natureza humana.
- Os homens não podem mudar e se tornar mais pacíficos?
- Enquanto vive, o homem é imperialista. O impulso na direção do imperialismo só cessa com a morte.
- Quando as massas pensam, elas não se opõem às políticas imperialistas?
- O raciocínio jamais será o motor das multidões. A multidão ama os homens fortes. A multidão é mulher.
- O que o senhor acha do feminismo?
- A mulher é, e não pode deixar de ser, uma criatura passiva. É analítica e não sintética. Minha concepção a respeito do papel da mulher no Estado é oposta à de todo e qualquer feminismo.
- O que os fascistas pensam sobre a violência?
- A violência é imoral quando é fria e calculada, mas não quando é instintiva e impulsiva.
- Então a violência fascista não deve ser planejada?
- A violência fascista deve ser pensante, racional, cirúrgica.
- Não me parece muito coerente, mas vamos adiante. O capitalismo na Itália não precisa da democracia?
- É possível que no século 19 o capitalismo tenha precisado da democracia. Hoje, pode muito bem passar sem ela.
- A oposição ao governo fascista não pode contribuir de maneira importante para o conhecimento dos problemas da realidade política?
- A oposição realmente importante é aquela que eu crio dentro de mim mesmo.
- Com liberdade, a imprensa não ajuda a apontar as contradições?
- Atualmente, os jornais não servem a idéias e sim a interesses. Os jornais só publicam o que a grande indústria ou os bancos que os financiam querem que seja publicado.
- O Poder Judiciário deve ser independente?
- Os fascistas controlam a maioria dos juízes no país. Os juízes sabem que são vigiados. Assim, o que não fizerem por lealdade a minha pessoa, farão por medo.
- O Estado fascista é um Estado policial?
- A polícia deve ser respeitada e receber todas as honras. Antes de precisar da cultura, o ser humano precisa de ordem. Em certo sentido, pode-se dizer que o policial precedeu o professor.
- E a liberdade, Duce?
- O fascismo já passou — e se for necessário passará tranquilamente ainda outras vezes — por cima do cadáver mais ou menos decomposto da deusa Liberdade.
Por Leandro Konder, no Jornal do Brasil de 25/01/2003