ESPETACULIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
Published in
3 min readNov 21, 2017

O Rio de Janeiro é vítima da encenação de um espetáculo muito feio

Foto: Marcelo Camargo/ABr

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública, realizado em 30/10/2017, apresentou a 11ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, com dados impressionantes.

Primeiramente, porque o governo Temer reduziu os gastos da União com essa rubrica, em 2016. As despesas com as Polícias Federal e Rodoviária, e com o Fundo Nacional de Segurança Pública, FNSP, caíram, reduzindo-se 10% em seu conjunto. O FNSP é o grande apoio federal aos estados, para reequipamento e treinamento policial, mas ficou 23% menor, em relação a 2015.

Contudo, os gastos com a Força Nacional passaram de R$ 184,1 milhões, para US$ 319 milhões, aumento de mais de 70%. Seu contingente, em torno de 2 mil pessoas, passou para 8.178 profissionais, no ano passado.

Por que? O Ministério da Justiça explicou que se deveu aos Jogos Olímpicos, no Rio de Janeiro, mas é interessante que se gastou a metade disso em 2014, quando houve a Copa da FIFA. Diferentemente da Olimpíada, ela ocorreu em doze cidades, não numa só.

Na prática, o governo está expandindo uma outra força policial, não prevista na Constituição.

A Força foi empregada em poucos lugares, com frequência no Rio de Janeiro, cuja capital é a maior vítima da corrupção em todos os níveis, de velhos grupos enquistados no poder local, centrados no PMDB. O mesmo ocupa o governo federal e, de fato, usa este estado como balão de ensaio para as reformas conservadoras que vem implantando.

Parece estar sendo esquecido, mas isso não é casual, que a Força foi criada em 2004 como instrumento rápido de mobilização federativa, à base de efetivos temporários dos estados. Definiu-se que serviria a ações pontuais, qualificadas e provisórias, em situações emergenciais. O que se viu no Rio não foi isso. Ampliaram suas atribuições e esticaram o tempo de sua intervenção. Passou a atuar, como observaram os professores Jacqueline Muniz e Daniel Misse, da Universidade Federal Fluminense, em emergência, operações especiais, patrulha, escolta, perícia, investigação e inteligência.

Operações extensas e dispendiosas, como a Missão Pacificadora II, no morro Santo Amaro, com quatro anos de duração, mostraram-se falhas e prejudicaram os estados que cederam efetivos para atuarem aqui. Com efeito, nada mais foram do que algo que a população entendeu — e continua entendendo — como “enxugar gelo”.

Por que isto aconteceu e continua? Porque é o projeto de poder de uma elite política que não tem ideias capazes de resolverem, ou apenas mitigarem, os graves problemas da desigualdade brasileira. Ao contrário, é preciso registrar sempre, está agravando-os.

Desse modo, parece atender aos anseios da população que acredita na cobertura jornalística, em geral irresponsável, para quem vivemos num estado de guerra. Ao mesmo tempo em que se leva o país de volta ao Mapa da Pobreza e se liquidam direitos sociais, a inquietação das classes médias urbanas é atendida pelo aumento de ações espetaculares. Pena que seja um espetáculo tão feio, que só poderá produzir efeitos ainda piores.

Fernando Roberto de Freitas Almeida, carioca, economista e historiador, professor adjunto do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF)

--

--