Homem Aranha: Super-Herói buscando recolocação no mercado

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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3 min readJan 9, 2019

Por Valdemar Figueredo (Dema)

Foto: Valdemar Figueredo

O que estaria fazendo na Quinta da Boa Vista, em pleno sábado ensolarado, com roupa de trabalho, o poderoso Homem Aranha? Considerando que o parque público deixou de ter a atração do Museu Nacional e poucas são as opções de subir paredes, não estaria o Super-Herói subutilizado naquele lugar?

Alguém poderia objetar dizendo que o herói é também uma pessoa e tem todo o direito ao ócio em dia de folga. O argumento faria sentido, não estivesse ele com roupa de trabalho e devidamente mascarado.

Uma boa maneira de obter respostas é ainda perguntar. As interpretações são devidas, mas, por favor, simplifique, pergunte. Fiz isso.

O Homem Aranha estava fazendo hora extra literalmente por conta própria. A missão não era arriscada, muito menos glamorosa. Estava ali exausto, num calor infernal, para ser fotografado em troca de uns trocados.

Não era atração do circo local, muito menos do Jardim Zoológico. Eu diria que ele era uma atração à parte.

O Homem Aranha não é o Homem de Ferro nem o Superman. Numa época de retração com alto índice de desemprego e precarização de vínculos formais, lá estava ele se exibindo para as crianças dando demonstrações das suas “garras”.

Assim o conheci: um homem com altas habilidades e amplos poderes vivendo a realidade da precarização do emprego formal. Na falta de oportunidades, o Spider-Man se desdobra, pula, flexibiliza, inova e improvisa.

Não disse diretamente, mas deu a entender que está buscando “recolocação no mercado”.

Tirei as fotos e fui adiante deixando para trás um sujeito cansado e abatido dentro de uma fantasia asfixiante. Já no carro, os meus filhos indagaram o porquê da exposição e da fotografia. Respondi dizendo que é raro encontramos um Super-Herói tão perto.

Enquanto dirigia na Avenida Maracanã, enroscado numa teia de pensamentos, cantei baixinho a música do Gonzaguinha:

Guerreiros são pessoas tão fortes, tão frágeis

Guerreiros são meninos no fundo do peito

Precisam de um descanso, precisam de um remanso

Precisam de um sono que os torne refeitos

É triste ver esse homem, guerreiro, menino

Com a barra de seu tempo por sobre seus ombros

Eu vejo que ele berra, eu vejo que ele sangra

A dor que tem no peito, pois ama e ama

O homem se humilha se castram seus sonhos

Seu sonho é sua vida e vida é o trabalho

E sem o seu trabalho, o homem não tem honra

E sem a sua honra, se morre, se mata

Não dá pra ser feliz…

Valdemar Figueredo (Dema). Professor, escritor, pastor e editor do Instituto Mosaico. Doutor em Ciência Política (IUPERJ) e doutorando em Teologia (PUC-RJ)

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