JÁ EXISTIU UM “PAÍS DO FUTURO”.

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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3 min readMay 16, 2018

Por Fernando Roberto de Freitas Almeida

Foto: Mariana Pina Tostes. Vigília Marielle Franco, Lisboa-Portugal, março de 2018

Em 14 de março de 2018, uma vereadora progressista, detentora da quinta maior votação para a Câmara da segunda maior cidade brasileira (e ainda uma importante caixa de ressonância para o mundo todo), foi executada.

Peritos calcularam que a operação teria custado cerca de R$ 60.000,00. Semanas depois, divulgou-se que a arma usada não foi uma pistola mas uma submetralhadora, armamento de uso muito restrito. Também se demorou a divulgar que as cinco câmeras de segurança próximas ao local da execução, nos arredores da prefeitura, haviam sido desligadas.

Passados quase dois meses, fez-se uma reconstituição do crime, pedindo-se que possíveis testemunhas comparassem o som das armas empregadas com o daquela que teria sido usada: dois meses depois!

Tudo isso ocorreu no âmbito de uma operação de “segurança”, na qual uma capital que não está nem entre as vinte mais violentas do país passou por um tipo novo de intervenção federal. Novo, por não se tratar do previsto constitucionalmente, com pedido da autoridade local, que deveria ter sido substituída, para uma reorganização politico-administrativa.

De modo irregular, interveio-se apenas manu militari, sem provisão de recursos, além de se criar um ministério específico para a “Segurança Pública”, dado a um político originário de um partido, ou ex-partido, há muitos anos tido como progressista.

A colocação de um general à frente do Ministério da Defesa igualmente configura situação inusitada, pois a pasta deveria ser — como sempre foi — dirigida por um civil. Percebe-se que, além do caráter midiático das ações federais, executadas por um governo do qual a imensa maioria da população brasileira quer distância, o governo Temer entendeu que o fato de parecer encampar parte da pregação política de um candidato protofascista poderia lhe render algum apoio. Isto porque o que no Brasil se costuma considerar como “centro” na política, esfacelou-se numa série de candidaturas sem viabilidade, fazendo com que um indivíduo antes visto como quase folclórico crescesse com propostas simplistas de mero uso da violência.

O “centro” pareceu ter alguma esperança, com a candidatura do ex-ministro Joaquim Barbosa, com a qual vários partidos flertaram. A desistência do “menino pobre que salvou o país” (citação da revista Veja), frustrou-os.

Todas estas situações têm o mesmo pano de fundo: o golpe jurídico-empresarial-midiático abalou todas as instituições e não adianta afirmar que estão funcionando normalmente. Somos uma sociedade terrivelmente desigual e violenta, estruturalmente conservadora. Não resolveremos nossos problemas enquanto não nos dedicarmos com seriedade à origem deles.

A miséria e a fome voltaram e não há planos para o futuro. Slogans não resolvem e deixar impunes assassinos, enquanto a TV pauta o comportamento de políticos e magistrados nos levará a situações piores. Parafraseando o “profeta” Gentileza, autor do belo aforisma “Gentileza gera gentileza”, precisamos atentar para o fato de que violência gera violência.

Fernando Roberto de Freitas Almeida, carioca, economista e historiador, professor adjunto do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF)

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