Natal é Recomeço

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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3 min readDec 22, 2017

A esperança de um novo dia

Foto: Joao M. Pereirinha

Existe uma via aqui no Rio de Janeiro que liga as zonas norte e oeste da cidade. Apesar de ser conhecida pelos cariocas por alto índices de acidentes e constante casos de violência, proporciona aos que nela transitam uma bela paisagem, pois, passa no meio do maciço da Tijuca, praticamente dentro da floresta. Durante quatro anos tive o privilégio de passar ali cinco dias por semana.

Quantos espetáculos naturais contemplei naquelas viagens! Me lembro de um dia em que usufruí de uma experiência quase que mística. Era uma manhã de sábado na qual saia para mais um dia de trabalho. Seguia desanimado existencialmente e em meio a um cenário bem sombrio de tempo nublado, com bastante neblina, uma daquelas ocasiões em que o dia parece noite. Fazia o trajeto bastante atento às curvas, com a visibilidade turvada.

Mas, ao chegar ao topo da serra fui surpreendido com uma bela visão: do outro lado da cidade estava um imponente céu azul, com um sol que parecia nascer sorrindo para mim. Literalmente tive uma sensação de recomeço, percebi que a força do nascer do sol naquele momento me anunciava que podia começar de novo. Não apenas aquele sábado, mas existencialmente por mais sombrio que fosse o cenário momentâneo. Guardo essa experiência até o dia de hoje.

A filósofa Hannah Arendt certa vez afirmou que cada nascimento é o anúncio de que o mundo pode recomeçar.

Na tradição cristã a possibilidade de recomeço é anunciada pelo nascimento de Jesus. O Cristo que veio ao mundo aponta que o ser humano pode recomeçar em outros moldes. É o Deus que não desiste da humanidade e por isso lhe permite se reconstruir. Nesse contexto possibilidade e esperança são sinônimos.

Natal é a encarnação do Evangelho, a esperança de um novo início. O anúncio de uma nova possibilidade existencial, de que cada indivíduo pode perceber o sol do outro lado de estradas sombrias atravessadas. Sol que, na verdade, sempre está presente, mesmo quando as nuvens ofuscam a percepção, turvam a visão e impedem de enxergarmos a nós mesmos, de fazermos leituras coerentes da realidade ao nosso redor.

O recomeço encarnado em Jesus de Nazaré além de ser existencial é também estrutural. Afinal o messias anunciou que a partir Dele o Reino de Deus estaria entre nós. E no Reino de Deus a justiça deve fluir como um rio. Proclamá-lo implica denunciar e lutar contra todas as formas de injustiça, de desigualdade, anunciar que a humanidade pode e precisa recomeçar em outros termos.

Quando o Evangelho é encarnado em nós e a partir de nós, esse Reino é propagado. Então é natal… Vamos recomeçar?

Anderson José L. Baptista

Professor no município do Rio de Janeiro. Graduado em teologia pela Faculdade Teológica Sul Americana e em História pela Universidade Estácio de Sá. Mestre e doutorando em educação pela Universidade Federal Fluminense. Suas pesquisas transitam nas áreas de Educação de Jovens e Adultos, Políticas Públicas e Educação Popular.

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