O QUE FAREMOS PARA, AO MENOS, MINORAR O DESASTRE?

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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3 min readDec 31, 2019

Por Fernando Roberto de Freitas Almeida

Foto: Felix Ramirez, Canva

Há sessenta anos, em 1959, o sociólogo e filósofo alemão Ralf Dahrendorf publicou o livro Classes e Conflito de Classes na Sociedade Industrial. Até hoje é obra de referência, analisando abordagens do Marxismo e do Funcionalismo Estrutural. Dahrendorf faleceu em 2009 e por toda a vida estudou as tensões sociais e políticas nas sociedades modernas. Em 1998, afirmou que “o século XXI poderia se tornar o ‘século do autoritarismo’”. Um ano depois, o filósofo neopragmático estadunidense Richard Rorty analisou aspectos da globalização, acelerada nos anos 1990, que lhe pareciam “perigosos” para a civilização. Listou vários possíveis retrocessos: ascensão de “demagogos ordinários”, aumento da desigualdade social e econômica, irromper de um mundo “orwelliano”, revolta dos mais frágeis, retorno do “sadismo”, do ressentimento e dos comentários depreciativos sobre mulheres e membros de minorias.

Cabe prestar muita atenção a tais considerações, elas têm vinte anos. Esta compilação foi feita por Heinrich Geiselberger, outro autor alemão, no prefácio de “A Grande Regressão”, publicado no Brasil em 2019. Dois alemães estão aqui citados e é na Alemanha onde mais se procurou combater o retorno do Fascismo, lá ainda mais pervertido, na forma do Nazismo. Mesmo assim, ele está voltando, lá e cá — e em outros países. Por quê? Porque as sociedades modernas apenas assistem aos ataques da direita — e agora, mais uma vez, da extrema direita — a todos os avanços propiciados, por décadas, por orientações políticas socialdemocratas, socialistas, e à montagem de Estados do Bem-Estar Social, após 1945. A preocupação econômica dos governantes era gerar emprego, não usar os empregos como variáveis de ajuste. Isto foi retomado em nosso país no início do século XXI, e as previsões negativas pareciam fúteis. Os motivos de sucessos da extrema direita são diversos e uma palavra deve ser destacada entre os temores de Rorty: “ressentimento”.

Ressentir é sentir novamente, indefinidamente, mágoa, rancor, angústia. Por quê? Porque não se conseguiu obter algo desejado, porque se pensa não ter tido a devida consideração pelos esforços envidados, porque não se percebeu apoio de alguém — ou de ninguém. Também — e por tudo isso — porque se viu alguém (s) conseguir o que não se conseguiu e imaginar que isto foi imerecido. Notem-se todos os pontos listados sendo verificados aqui, e o prefácio citado foi publicado em Berlim, em 2016, ano em que fora feito, no Brasil, um “acordão” imoral para se tirar da presidência a primeira mulher a ocupa-la. Quando até mesmo o vice-presidente da República durante aquele processo declara (o fez recentemente) que “não estava participando do golpe” parece não caberem mais dúvidas sobre o ocorrido. Observemos a adjetivação usada, por um filósofo que frequentemente desafiava a Filosofia: é possível discordar dela? É possível discordar do apresentado? O que faremos, no ano que se inicia, para, ao menos, minorar o desastre em curso neste país? Tenhamos um bom 2020.

Fernando Roberto de Freitas Almeida

Carioca, economista e historiador, professor adjunto do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF). Coordenador do curso de Relações Internacionais.

www.institutomosaico.com.br

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