PLANTÃO MÉDICO NO FIM DO ANO

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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4 min readDec 26, 2017

Hospital é lugar de vida

Foto: Arquivo do Portal Medicina & Saúde

Talvez, a maioria dos profissionais de saúde sabem disso: hospital é lugar de quebrantamento e reflexão, especialmente nas unidades fechadas, como os Centro de Terapia intensiva (CTI) ou mesmo as enfermarias de longa duração de internação. Quebrantamento tanto para a equipe de saúde que ali trabalha, como também para os seus usuários. Dentro das quatro paredes de um hospital vemos cenas surpreendentes, pois ininterruptamente a “atmosfera” hospitalar reinante produz um profundo sentimento de reflexão sobre a vida e morte, saúde e doença, acolhimento e solidão, amor e abandono, alívio e dor, céu e inferno.

Hospital é lugar de quebrantamento, pois suas paredes já ouviram súplicas mais fervorosas e honestas do que se faz em muitos templos religiosos. Já viram e ouviram discursos e despedidas que exaltam os mais nobres sentimentos e as mais virtuosas qualidades do ser humano, contrapondo-se sobremaneira ao embrutecimento emocional que se vê nesse século. Seus corredores transmitem uma mensagem de quebrantamento que reverbera no interior do paciente rumo a sua cirurgia seja essa eletiva ou de emergência. Seus quartos são verdadeiros spa´s mentais onde seus pacientes exercitam uma autoavaliação digna das melhores técnicas psicoterápicas existentes.

Hospital é lugar de quebrantamento, porque o orgulhoso se torna humilde, o prepotente pede socorro, o milionário pede ajuda, o intelectual de notório saber que está internado no CTI, por exemplo, se rende aos conselhos e orientações da equipe de saúde. Hospital é lugar de trabalho em equipe. Juntos e misturados em prol da vida.

Hospital é lugar de quebrantamento, pois nos faz enxergar nossa pequenez, nossa fragilidade e dependência social. Não há espaço para autosuficiência muito menos arrogância. Por exemplo, numa enfermaria oncológica se vê normalmente tanto na equipe de saúde como em seus pacientes ali internados os mais nobres sentimentos de altruísmo, compaixão e resiliência. Nesses “guetos” de bondade em nossa sociedade, cada vez mais embrutecida e egoísta, somos inclinados a exercitar o que temos de mais nobre e divino em nosso interior: o amor.

Hospital é lugar de quebrantamento, porque em seu solo sagrado se desconstrói e reconstrói a percepção da vida e, para alguns, de uma eternidade.

Rico e pobre convivem e experimentam os mesmos sentimentos de medo e ansiedade ao entrarem no centro cirúrgico para uma intervenção de emergência.

O religioso se vê dependente da ajuda humana da equipe de saúde.

O ateu pede oração.

O cético sussurra em seu coração e clama pelo socorro da divindade.

Esse universo de experiências e cenários palpitantes faz do hospital uma escola de lições de vida. Uma universidade do saber. Um tribunal dos relacionamentos humanos onde em sua grande maioria das vezes o amor prevalece ao ódio. O perdão se sobrepõe ao rancor. A reconciliação vence a separação. Relacionamentos são restaurados. Famílias são reconciliadas a beira do leito. Lágrimas de dor e alegria se misturam numa tempestade de reflexão e reavaliação do sentido da vida e da nossa própria existência. O que se vê é uma ebulição de sentimentos e reflexões interiores sobre a vida, a família, os amigos, o trabalho e sobretudo o porvir, tanto nos membros da equipe de saúde que lá militam como também no paciente internado. Essa é a realidade.

Por fim, hospital é lugar de conversão. A morte física iminente se torna vida emocional. O fim existencial se converte num começo sem fim. Nossa visão humana e limitada se abre num mundo de eternidade, que ora negando, ora acreditando, nos faz ser pessoas mais simples, humildes e solidárias.

De fato, como seria bom se as pessoas pudessem aprender mais as preciosas lições que o hospital, esteio do quebrantamento, nos ensina. As famílias seriam mais unidas e os conflitos seriam mais facilmente superados e perdoados. Os casais mais alegres e menos distantes. Os pais mais atenciosos. As mães mais amáveis. Os filhos mais responsáveis. As filhas mais obedientes. Enfim, acho que teríamos um mundo um pouco melhor se essas lições e aprendizados do hospital enquanto lugar de quebrantamento pudessem nortear nossa breve passagem nessa vida.

Hospital para uns é cheiro de morte. Para outros é aroma de vida.

Dr. MAURICIO PRICE

Carioca, gestor, médico graduado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com MBA em Gestão em Saúde pelo Instituto COPPEAD da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É palestrante, escritor, debatedor e diretor médico da Anadem. Membro da Academia Evangélica de Letras do Brasil.

E-mail: mauricioprice@gmail.com e www.facebook.com/DrMauricioPrice

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