QUEM FALARÁ SOBRE OS EXTERMÍNIOS NO BRASIL?

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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3 min readDec 28, 2018

Por Fernando Almeida

Foto: Carol Garcia. Fórum Social Mundial 2018, Bahia/Brasil

A comuna suíça de Davos, na Suíça, era conhecida por sua beleza alpina e por seu sanatório em que que Thomas Mann ambientou o romance “A Montanha Mágica”, no qual esteve internada sua esposa. Desde 1971, por iniciativa do professor Klaus M. Schwab, criador do Fórum Econômico Mundial, sediado em Genebra, Davos passou a abrigar a reunião anual desta organização. Sem fins lucrativos, pretende ser imparcial e se dedicar a estudar o “estado do mundo”, atuando como observadora na ONU. Tem uma contrapartida à esquerda, o Fórum Social Mundial, ou Fórum de Porto Alegre, criado no Brasil, em 2001, com o dístico, conhecido globalmente: “um outro mundo é possível”. Apenas um chefe de Estado participou de ambos os Fóruns, com grande expectativa, em 2003, tendo prometido proferir o mesmo discurso em ambos, o que, de fato, ele fez, foi o ex-presidente Lula.

Agora, as expectativas para nossa participação no Fórum Econômico são de fato inexistentes. Ninguém imaginaria o futuro presidente brasileiro mostrando mínimo interesse pelo Fórum Social.

Destaque-se que, em Davos, de fato são discutidos todos os temas, incluindo os sociais, contudo, o caráter altamente formal do evento, com autoridades empresariais e de governo de todo o mundo, dá-lhe um perfil conservador, e a pequena área em que suas atividades se concentram é protegida por forte sistema de segurança, o que não acontece no Fórum Social. Assim, saiu há pouco, em 18/12, o Ranking de Igualdade de Gênero, divulgado pelo FEM desde 2006, em que 149 países são analisados. Como não poderia deixar de ser, em razão do furor de destruição de avanços civilizatórios no Brasil, em curso desde 2016, recuamos cinco posições neste rol, em 2017 e, agora, mais cinco posições, em 2018. O Conselho do Fórum já avisou que, na próxima reunião, em janeiro de 2019, a igualdade de gênero será um assunto privilegiado na agenda. É possível que qualquer cidadão que viva no Brasil, nativo, ou naturalizado, acredite minimamente que este ponto faz parte de qualquer projeto do governo a ser empossado em 1º de janeiro? A própria base que o elegeu e, agora, a que o sustentará no governo, ou não se interessa, ou é francamente hostil a que sequer se fale neste assunto.

Observe-se que, desde 2015, com a Lei 13.104, que alterou o art. 121 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940), o feminicídio tornou-se circunstância qualificadora do crime de homicídio. Um ano depois, em maio de 2016, em parceria com o governo brasileiro e o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a ONU Mulheres publicou as “Diretrizes Nacionais para Investigar, Processar e Julgar com Perspectiva de Gênero as Mortes Violentas de Mulheres — Feminicídios”.

Pouco adiantou, pois, os crimes continuaram e somos o quinto país que mais mata mulheres (sendo o companheiro o assassino na maior parte dos casos) e detemos o primeiro lugar em extermínio de LGBT.

Infelizmente, os indícios são de que a situação irá piorar. Quem falará sobre isso em Davos?

Fernando Roberto de Freitas Almeida, carioca, economista e historiador, professor adjunto do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF)

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