RIO DE JANEIRO, UM DESASTRE ANUNCIADO

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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3 min readOct 27, 2017
Foto: Martin Lazarev, Rocinha, Behance

Em 1986, após ampla divulgação pelos principais meios de comunicação da questão da violência na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, um candidato conservador prometeu acabar com o problema em pouco tempo. Em momentos como aquele, a população é atraída pelo discurso simplista de aumento do poder coercitivo do Estado e nada mais. Assim, Moreira Franco, autor do Programa Ponte para o Futuro, e um dos políticos mais envolvidos com as articulações de Temer, com seus 3% de popularidade, derrotou um projeto que incluía uma das melhores propostas educacionais feitas no país, os Cieps, do antropólogo e educador Darcy Ribeiro.

Darcy alertou que os governantes que não construíssem escolas, em vinte anos, estariam construindo presídios. Acertou. Apenas dez anos depois, em 1996, publicou-se um livro (“Causas da Inviabilização da América Portuguesa”) cujo autor, João Paulo de Almeida Magalhães, previa o desmembramento do Brasil, em razão das tensões provocadas pela desigualdade. O pior cenário era o da região em que se localiza o estado do Rio de Janeiro.

Previa que um contingente de 100 mil a 120 mil pessoas mantidas pelo narcotráfico controlaria o estado. Tivemos sorte. A descoberta do Pré Sal levou a que o pessimismo fosse eliminado. Com os investimentos da Petrobras, líder de uma cadeia produtiva responsável por 30% do PIB e por 60% do investimento em terras fluminenses, passou-se a aceitar a dependência desse setor.

As “elites políticas” locais mostraram-se despreparadas para adversidades, que viriam inevitavelmente. Não apenas despreparadas. Principalmente, obcecadas com os recursos fartos, geridos de forma frequentemente inescrupulosa. Quando a cidade começou a se preparar para os megaeventos, os indicadores de emprego registraram desempenho excepcional. Tudo isso acabou rapidamente.

Em 2017, vê-se um cenário de terra arrasada na cidade e no estado. Os preços do petróleo desabaram, grandes obras foram paralisadas, como o Comperj e os megaeventos já se foram. A Operação Lava Jato completou o quadro, com profundo efeito sobre a redução dos investimentos da Petrobras e a desativação de uma teia complexa de empresas associadas. Uma nova escalada de violência logo foi iniciada e, mais uma vez, o discurso simplista impera. Não se faz associação do ingresso de armamento farto para o banditismo carioca e fluminense com o corte radical dos recursos para o patrulhamento das fronteiras do país.

O Brasil se tornou um dos maiores fornecedores de drogas do mundo, sem produzi-las, mas poucos sabem que somos também o maior fornecedor de insumos para o refino de cocaína na Colômbia. A ideia propagada de uma “guerra no Rio” não tem cabimento (a Rocinha não proclamou independência) mas é útil para que se coloque em segundo plano a essência da questão: quantas pessoas vivem disso e quem protege as atividades relacionadas? Quantas autoridades dos três poderes vinculam-se de algum modo com essa rede? Quem trará de volta o discurso simplista já sabemos.

Fernando Roberto de Freitas Almeida, carioca, economista e historiador, professor adjunto do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF)

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