Um novo lugar no rap: considerações sobre gênero e religião

Redação — Instituto Mosaico
Instituto Mosaico
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16 min readMar 12, 2019

Por Bruno Rocha

Foto: Mídia NINJA

Licença aqui, patrão/Deixa eu me apresentar! [1]

O rap como manifestação popular, gestado e desenvolvido no âmbito periférico das sociedades, carrega símbolos, lógicas e acontecimentos próprios do seu lugar social. Sua abrangência é própria dos corpos que se expressam no cotidiano injusto e violento das cidades, do campo e até das reservas indígenas, como o caso do grupo Brô Mc’s e Kunumi Mc formado por membros da tribo Guarani-Kaiowa e Guarani-Krukutu[2]. Corpos esses submetidos a todo tipo de exploração e privação, destituídos de seus direitos humanos mais básicos, além de carregar em sua essência incontáveis estigmas[3] e estatísticas[4].

“Fogo nos racistas”, “Desrespeito não tamo aceitando”, “A pomba branca tem dois tiros no peito” entre outras, se constituem como protesto cantado/rimado que levaram o rap a ganhar outros lugares em diversas realidades, ultrapassando até mesmo a periferia — como seu lócus primário — para ganhar popularidade nos meios de comunicação e espaços sociais mais abastados. De forma complexa e dialética, grupos e Mc’s não pertencentes às classes sociais mais baixas como Costa Gold, Haikaiss, Cone Crew Diretoria, Fábio Brazza, Kivitz, Filipe Ret, entre outros, assumiram as pautas, a estética e a influencia ancestral de um movimento marcadamente negro e periférico.

Sendo o rap muito maior que o próprio rapper ou mesmo do que o próprio público[5], seria impossível colocá-lo sob uma metodologia específica, sob um jeito autorizado e único de fazê-lo ou manipula-lo. Resumindo, o rap não está restrito a um grupo, a uma pessoa, a um partido, a uma estética, a um gênero, uma classe ou um só tipo de influência musical — haja vista a diversidade regional, religiosa e subjetiva desses e dessas que escolheram esse estilo musical como sua plataforma artístico-política na sociedade[6]. Porém, mediante a essa realidade, é ponto comum que a característica que une, direciona e perpassa todas as gerações do rap nacional, é principalmente a luta política[7] em favor do povo pobre e periférico[8].

Essa mística[9] do rap, que paira sob os sujeitos, tanto os que produzem quanto os que são tocados por sua indescritível atmosfera, é plural e democrática[10]. Utiliza-se da fala, da escrita e das pick-ups, como sendo os meios pelos quais a musicalidade poética dos oprimidos e oprimidas ecoam, transformam e empoderam as (e a partir das) bases sociais, para resistirem às desigualdades presentes desde os bairros periféricos formados por imigrantes jamaicanos nos Estados Unidos (origem do rap), à terra explorada chamada Brasil, América Latina.

Através do ritmo e da poesia, cada MC conta sua realidade e seu contexto; suas referências e suas vivências; seus dramas familiares e suas histórias de rua. Esse movimento natural e cotidiano faz com que o rap esteja atrelado a várias demandas: trabalho, produção, desemprego, estudo, favela, polícia, drogas, violência, sexualidade, poder econômico, relacionamentos, religiosidade, entre muitas outras pautas que consolidam o rap como uma cultura própria, com seus símbolos e linguagens, com sua história e sua ancestralidade particular.

No rap, ego inflado/Os cara se acha

O Brasil experimenta a partir da gestão de Gilberto Gil (2002) no Ministério da Cultura, uma ampliação sobre o significado de cultura, reconhecendo e promovendo sistemicamente manifestações regionais ligadas à etnia e às questões de gênero[11]. Nesse caminho se encontra o rap nacional, conhecido/atrelado ao movimento hip hop, como uma cultura intimamente ligada às questões sociais, raciais e políticas, somando-se ao todo da cultura popular que se desenvolve no país, acompanhado suas pautas e evoluções, a ponto do rapper Sabotage ocupar um lugar de destaque no ano de 2002 em programas de televisão da grande mídia e no cinema nacional[12].

Essa evolução musical e social da qual o rap sempre preconizou e fez parte (apesar de suas limitações classistas, machistas e lgbtfóbicas) chegou também ao momento atual, onde artistas chamados da “velha guarda” começam a ter novas posturas quanto as suas letras e posicionamentos, influenciando diretamente os novos artistas à novos jeitos de se fazer rap[13].

Esse gênero musical passa por inúmeras transformações de público, de artistas e alcance, sendo forçado a dar o espaço antes negado às mulheres[14] e a comunidade LGBTQI+[15], que também se apropriam desse espaço e linguagem, como grupos pertencentes e constituintes da cultura hip-hop. Vale ressaltar que essa narrativa dentro do próprio movimento continua em disputa frente a um número incontável de fãs, meios de comunicações e artistas que ainda fomentam lógicas classistas, racistas, preconceituosas e conservadoras em suas letras e posturas. Assim como em diversos meios, inclusive entre oprimidos e oprimidas, grupos minoritários lutam diariamente para se manter viv@s, para que possam ser ouvid@s e respeitad@s dentro de suas próprias realidades.

Em meio à comunidade LGBTQI+, Rico Dalasam é um grande exemplo de resistência no rap, onde desde 2015 com seu álbum “Modo diverso” milita por espaço não só dentro da sociedade, mas do próprio rap. Além desse marco, o grupo Quebrada Queer, composto por Guigo, Murillo Zyess, Harlley, Lucas Boombeat e Tchello Gomez, aparece em 2018 pela plataforma de conteúdo digital RAPBOX, com uma postura contundente frente às questões LGBTQI+ dentro e fora do rap. Vale ressaltar que, o objetivo dessa reflexão não é a apropriação do lugar de fala de grupos minoritários que possuem suas causas, motivos e história (dos quais possuem lugar e propriedade de fala[16]), mas apontar e trazer à discussão novos paradigmas sobre o rap nacional e o avanço das lutas políticas e pautas sociais na contemporaneidade.

Outro ponto a ser destacado é que o rap sempre dialogou com a religiosidade popular, compreendendo que a religião é algo inerente à formação do povo latino em sua maior parte, tendo o cristianismo e as religiões de matriz afro-brasileiras (aqui se misturam às espiritualidade xamânicas-indígenas) como fator de experiência de formação social-religiosa do povo brasileiro, se estendendo à todos os sujeitos advindos desse processo colonial, inclusive aos MC’s, a possibilidade de desenvolver críticas, reflexões e empoderamento à partir e das experiências místico-sociais[17].

Racionais e suas diversas analogias religiosas[18], Sabotage e sua devoção afro-brasileira[19], Trilha Sonora do Gueto (TSG) e Dexter (509-E) em suas críticas ao discurso evangélico,[20] prenunciam que a religião sempre esteve próximo do povo pobre e das produções musicais periféricas, mas que não só. Essas religiões estiveram próximas também dos que de alguma forma são afetados de forma violenta e ostensiva por um Estado que se confunde em cristandade hegemônica, atrelada à projetos de poder evangélicos e conservadores que financiam guerra às drogas, o aprisionamento do povo negro/periférico, o retrocesso dos direitos sociais das mulheres e da comunidade LGBTQI’s, e que assim, autorizam a morte de pessoas como Marielle Franco, Carlos Mariguela, Matheusa ou qualquer ação que possa se sobrepor ou fazer oposição ao discurso religioso fundamentalista que atinge até mesmo as regiões periféricas[21].

Alice Guél hitou mandando um: Deus é Travesti!

Quebrada Queer vem como profecia ácida dentro do próprio rap[22], estabelecendo o direito de existir na cultura com seus corpos e vozes lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis ou qualquer outra possibilidade de r(e)xsistir enquanto gênero humano; Quebrada Queer vem denunciar uma sociedade de muitos pecados e preconceitos, dos quais a maioria desses males vem do conservadorismo religioso[23]; Quebrada Queer “Mais quente que o Saara/Eu queimo o céu e faço o mar abrir/Prepara os doce, que a festa não parou por aí/ Alice Guél hitou mandando um: Deus é travesti”[24].

“Vidas cinzentas seguidas de um longo inverno/Muito bem preenchidas, somente com amor materno/Entrando em paz com todos meus sentimentos internos/Desvio de alguns crentes que dizem que eu vou pro inferno”, “Eles disfarçam bem, são tipo lobo em pele de cordeiro”, “Então bota pra fuder/Cê quer meter gostoso, mas se enruste atrás do altar”: essas são algumas frases e versos da música “Quebrada Queer” que se relacionam com a dimensão religiosa especificamente cristã, e o que essa representa no todo da opressão à comunidade LGBTQI+. Fazendo-se então, inútil, uma teologia ou uma espiritualidade que desmonte a lógica hermenêutica de gênero no que se refere ao ser divino, que ocasionalmente desarticule a hierarquia heteronormativa ou mesmo homoafetiva da experiência mística. Essa, não se somaria às reivindicações libertárias de uma teologia feminista, negra, indígena, queer, ou de qualquer outra minoria que vocifere, sugira e ratifique uma divindade feminina, mãe, negra, indígena ou Travesti.

Os MC’s de quebrada queer se apropriam de símbolos e linguagens, analogias e metáforas, experiências religiosas das quais são atravessados, para se unirem às demandas políticas libertadoras, desestabilizando a cultura do rap, a sociedade e a religião. Assim, sendo o autor desse texto um homem branco, heterossexual, cristão, pertencente à classe média, se torna cômodo continuar ouvindo rap só de homem, referenciando reflexões como estas com a maioria de rappers homens, financiando o machismo e a LGBTfoboia em práticas capitalistas e heteronormativas. Ao passo que não somaria às reinvindicações libertárias de um rap de mulheres, indígenas, de negros e negras, LGBTQI+, ou de qualquer outra minoria que grite, sugira ou demande um rap livre, inclusivo, democrático, político, gay, queer ou travesti.

Tanto a teologia feminista[25], que redescobre nos textos bíblicos uma hermenêutica da suspeita a partir das mulheres, quanto a teologia negra[26] que busca desvelar um Jesus negro, periférico e empobrecido, a teologia queer rompe o silêncio das vozes bissexuais e transgêneras, para desenvolver um discurso teológico a partir das particularidades sexuais e novas compreensões de gênero[27], além de uma experiência homoerótica com o Cristo crucificado[28]. Nas palavras de André Musskopf em seu livro Via(da)gens teológicas, “uma interpretação bíblica Queer deve estar ligada ao tema da resistência, num sentido mais amplo, à resistência aos padrões heteronormativos”[29].

Falar sobre um Deus que é Travesti (queer) é colocar toda a lógica de um Deus doutrinário, engessado, patriarcal, escondido ou hierárquico em questão, para então abrir novas possibilidade de um teologia que entende a pluralidade dos contextos sociais dos quais os sujeitos se desenvolvem, além de colocar em pauta a efemeridade da própria vida, da fé e de Deus[30], afirmando — nas palavras de Marcela Althaus-Reid — que o “Deus Queer é um Deus inacabado (…) [que está] em processo, ambíguo, de múltiplas identidades, que nunca terminamos de conhecer porque, quando o abarcamos, escapa, há mais[31]”. Falar nesse Deus é falar de um Deus que saiu do armário da tradição bíblica heteronormativa, que abandonou as regras e ideologias linguísticas das culturas patriarcais que o aprisionou à Senhor, Pai, Ele, Deus, Homem, Filho, etc; falar desse Deus Travesti “rompe com a ideologia heterossexual que se estabelece como padrão universal para a sexualidade, predominante na história do cristianismo e da teologia[32]”.

Para a teóloga Genilma Boehler, é imprescindível que se compreenda a fragmentação da pós-modernidade, a disposição e a ciência que esse tempo dispõe em questionar antigas estruturas, contrariando o dogmatismo hegemônico das instituições cristãs. Assumindo essa narrativa, iremos de encontro à uma renovação “pó-estruturalista da busca da transcendentalidade”[33], dando espaço a compreensões de um Deus em movimento, inacabado, plurissexual, não-heteronormativo, que abre caminhos de experiências místicas e espirituais plurais, sem a necessidade de enquadramento, universialimos e absolutismos. Como a teóloga Nancy Cardoso propõe: “Nossas leituras bíblicas continuam reforçando uma perspectiva de Deus impessoal, separada da humanidade e seus corpos, da natureza e seus corpos. Um Deus sem corpo e des-erotizado e, por isso mesmo, melhor e superior a outras divindades marcadas e misturadas a rituais de fertilidade e expressões eróticas”

Reivindicar uma espiritualidade libertadora e popular habita o cerne da experiência espiritual inclusiva com um Deus que é Travesti[34], assim como lutar junto aos grupos que reivindicam um rap libertador e popular acaba sendo o cerne da música rap, afirmando que o rap é feminino, queer, travesti ou de qualquer pessoa que se comprometa com rimas proféticas insuportáveis d@s que clamam justiça[35]. À isso, cabe a todos e todas que constroem as místicas e a cultura hip hop ouvir em silêncio as vozes que por tantos anos foram caladas e mortas em nosso país; cabe ao Estado garantir leis eficazes que previnam e punam atos racistas, sexistas, homofóbicos ou qualquer ação que atente contra a liberdade de andar nas ruas sendo quem se é; cabe àqueles (homens hetoressexuais) que sempre estiveram em situação de privilégio reconhecer a luta e não atrapalhar esse processo revolucionário, até porque “não é só close, é luta/Então vê se escuta/ Aceita, atura ou surta!”.

Referências bibliográficas

ALTHAUS-REID, Marcella; ISHERWOOD, Lisa. The sexual theologian: essas on sex, God and politics. London: T&T Clark International, 2004.

ALVES, Rubem. O Deus que conheço. Campinas: Verus, 2015

______________ Perguntaram-me se acredito em Deus. São Paulo: Planeta, 2013

BOEHLER, Genilma. O Deus Queer: O Deus que temos que libertar do espelho de nossas próprias ideologias. Disponível em < http://ofld.mccchurch.org/download/Garner-Institute/Boehler%20-%20O%20Deus%20Queer(2).pdf>; Acesso em: 08 de mar 2019.

BRUM, Eliane. Revista Época, Edição 329, 06 — ‐09 — ‐2004. Disponível: <http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI63840--‐15230,00--‐

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GOSS, Robert. Queering Christ: Beyond Jesus Acted Up. Cleveland: Pilgrim, 2002

MUSSKOPF, André. Via(da)gens teológicas: itinerários para uma teologia queer no Brasil. São Leopoldo: EST/PPG, 2008

PEREIRA, Nancy Cardoso. Sagrados corpos. Introdução. Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana/Ribla, Petrópolis: Vozes, n. 38, p. 5–10, 2001. Disponível em: < http://www.claudiocarvalhaes.com/uncategorized-pt-br/sagrados-corpos-nancy-cardoso-pereira/>; Acesso em: 08 mar 2019.

Referências discográficas

Alice Guél. “Deus é travesti”. Álbum: Alice no país que mais mata travestis, 2017. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=3jdoszpCb8A> Acesso em: 08 mar. 2019.

BK. “Exóticos”. Álbum: Gingantes, 2018. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=SXhvAS83vKs > Acesso em: 08 mar. 2019

Criolo. “Freguês da meia noite”. Álbum: Nó da orelha, 2011. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=CDwS_EVNs2c> Acesso em: 08 mar. 2019.

______ Álbum: Ainda há tempo, 2016. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=nvJQZyBBUMw> Acesso em: 08 mar. 2019.

Dexter (509-E). “Oitavo anjo”. Álbum: Provérbios 13, 2000. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=kxNjZr7dOac> Acesso em: 08 mar. 2019.

Djonga. “Olho de tigre”, 2017. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=0D84LFKiGbo> Acesso em: 08 mar. 2019.

Emicida.”Triunfo”. Álbum: Pra quem já Mordeu um Cachorro por Comida, até que eu Cheguei Longe, 2008. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=YMJOmIuUwiM> Acesso em: 08 mar. 2019

Facção Central. “Pomba branca”. Álbum: Direto do campo de extermínio, 2003. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=kznYWJLsxpk> Acesso em: 08 mar. 2019.

Karrasco. “Cifra”. Álbum: 2017L, VOL 1, 2017. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=-EGj5wzRDeY> Acesso em: 08 mar. 2019.

Marechal. “Espirito independente” Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=9IzEgoq7oUo> Acesso em:08 mar. 2019.

Quebrada Queer. “Quebrada Queer”. Álbum: Ser. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=FwktAmgku68> Acesso em: 08 mar. 2019.

Racionais Mc’s. “Capitulo 4, versículo 3”. Álbum: Sobrevivendo no Inferno, 1997. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=2LQSFLTiwS8 > Acesso em: 08 mar. 2019.

_____________ “Gênesis”. Álbum: Sobrevivendo no Inferno, 1997. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=9BWtSIcfWWc> Acesso em: 08 mar. 2019.

Racionais Mc’s. “Vida Loka parte 2”. Álbum: Nada como um dia após o outro dia, 2002. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=WxSowXm2Y0M > Acesso em: 08 mar. 2019.

_____________ “Jesus chorou”. Álbum: Nada como um dia após o outro dia, 2002. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ryP3ZvRPJhY> Acesso em: 08 mar. 2019.

Sabotage. “Dama Teresa”. Álbum: Uma luz que nunca apaga, coletânea musical, 2002. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Mdk6wTFeVAk> Acesso em: 08 mar. 2019.

Sabotage. “Cantando pro Santo”. Álbum: Rap é compromisso, 2000. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=fDCnuhAuzDE > Acesso em: 08 mar. 2019.

Trilha Sonora do Gueto . “Já era igreja” Álbum: Purke tudo num mundo é vaidade, 2008. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=CbljRq0A6sQ> Acesso em: 08 mar. 2019.

[1] Há uma opção metodológica no presente artigo, em usar como referência bibliográfica não só livros acadêmicos. Se tratando de rap e produção de cultura e conhecimento popular/independente, é necessário reivindicar às letras e discursos do rap como um lugar de autoridade intelectual popularmente consagrado.

[2] Confira as músicas “O Kunumi chegou”, de Kunumi Mc em: < https://www.youtube.com/watch?v=59naQKUKMRY> e “Koangagua”, de Brô Mc’s em: < https://www.youtube.com/watch?v=IBafJlZxT6s>

[3] “Bunda africana, esses peitos/Eu acabei com o preconceito/Fui pra cama com um preto/Ele tem cara de mau/Ela tem sorriso branco/Ela é da cor do pecado/Que me perdoe os santos/Mas olhe o tamanho da roupa/Ela tava me atentando”. BK. “Exóticos”. Gingantes, 2018.

[4] “Mas não… permaneço vivo, prossigo a mística/Vinte e sete anos contrariando a estatística”. Racionais Mc’s. “Capitulo 4, versículo 3”. Sobrevivendo no Inferno, 1997.

[5] “Não escolhi fazer Rap não, Na moral/O Rap me escolheu por que eu aguento ser real/Como se faz necessário, “tiozão”/Uns rima por ter talento, eu rimo porque eu tenho uma missão” Emicida.”Triunfo”. Pra quem já Mordeu um Cachorro por Comida, até que eu Cheguei Longe, 2008.

[6] “Ali eu encontrei um caminho pra existir no mundo”. Trecho de uma fala do rapper Emicida. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=VFHro9LP1Pg > Acesso em: 19 fev. 2019.

[7] Nas eleições presidenciais de 2018, a maioria dos rappers consagrados no Brasil se uniram em uma campanha “Rap pela democracia”, onde se posicionaram diretamente contra o governo representado em Jair Bolsonaro. Nomes como Emicida, Rael, Rubia, Guigo (Quebrada Queer), Mano Brown, Djonga, Tássia Reis, Rappin Hood, entre muitos outros, se juntaram nesse projeto que rodou as principais redes sociais. Disponivel em: < https://www.youtube.com/watch?v=uvOH6P0YNWE> Acesso em: 19 fev. 2019.

[8] “Eu sou o rap, mano, eu sou do rap, eu sou do hip hop, eu sou da época que é isso aí mano, o hip hop é a esquerda, entendeu. E é como diz a rima do Renan, os cara não entende que ‘nós já era esquerda bem antes do PT’ (…) Nós é esquerda, e quem escutou minhas musicas até hoje e não percebeu isso, se tava ouvindo errado, mano, se tava ouvindo mais as batidas do que o que eu tava falando”. Trecho de entrevista do rapper Rashid ao O Fino da Zica. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=lEG_h_86ddo> Acesso em: 20 fev. 2019.

[9] A ligação entre mística, mistério e espírito no rap, é percebido nas letras e no processo criativo: MC Marechal na música “Espirito independente”: “Minhas rimas ferem teu Espirito”; Mano Brown na música “Vida Loka parte 2” “Dimas, primeiro vida loka da história, eu digo ‘glória, glória, sei que Deus ta aqui’ e só quem é, só quem é vai sentir”; Criolo na TV Cultura antes da música “Freguês da meia noite”: “toda vez que alguma inspiração vem parece que é o divino brincando pra saber se eu to vivo ou não e a partir dai eu tento decodificar com as minhas palavras”.

[10] Haja vista as batalhas de rap entre os MC’s, desenvolvidas em ambientes públicos, gratuitos e democraticamente acessíveis.

[11] RUBIM, A. Políticas Culturais no Governo Lula. Salvador: EDUFBA, 2010.

[12] Participação do rapper Sabotage no programa Altas Horas, na Tv Band, na MTV e outras breves entrevistas como do programa Show Livre. Também atuou nos filmes Carandiru (2003) e O Invasor (2002), tendo nesse último uma de suas músicas como parte da trilha sonora.

[13] Conferir trecho da entrevista na Trip Tv, onde Mano Brown, um dos fundadores do grupo Racionais Mc’s, narra a vez que alguém colocou em seu show a música “Estilo Cachorro”, carregada de uma letra machista. E ele gritou: “Tira essa música (…) Olha o momento do Brasil”. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=LjUiDoQEb9o>; Criolo regravou em 2016 o seu álbum “Ainda há tempo” (2006), e teve algumas de suas letras modificadas e fala à revista TRIP que já usou algumas rimas e palavras preconceituosas por ignorância.

[14] Para ampliar a compreensão da produção feminina no rap, pesquisar as artistas: Negrali, Camila CDD, Dina Di, Carol Conka, Tássia Reis, Clara Lima, Nabrisa, Drika Barbosa, Cynthia Luz, Livia Cruz, Bivolt, Brisa Flow, Mariana Mello, Souto Mc, Azzy, Flora Matos, entre muitas outras das quais o autor desconhece por ignorância.

[15] [15]Para ampliar a compreensão do lugar da comunidade LGBTQI no rap, pesquisar os artistas: Rico Dalasam, Guigo, Murillo Zyess, Harlley, Lucas Boobeat, Tchelo Gomes, Hiran, Linn da Quebrada, Glória Groove, Alice Guél, entre muitos outros dos quais o autor desconhece por ignorância.

[16] “Minha vida sou eu quem canto, nossa vivência quem sabe é nois/Intérprete da minha história, honro a trajetória/Ninguém me dá voz, eu já tenho voz” Música Quebrada Queer, trecho de Lucas Boombeat. Diponivel em: <https://www.youtube.com/watch?v=FwktAmgku68> Acesso em: 23 de fev. 2019.

[17] Sobre o empoderamente religioso na América Latina: “Ópio do povo? Pode ser, mas não aqui. Em meio a mártires e profetas, Deus é o protesto e o poder dos primidos” ALVES, Ruben. O suspiro dos oprimidos. São Paulo: Paulus.

[18] Músicas como “Jesus chorou”, “ Caitulo 4 versiculo 3”, “Gênesis”, “Socorro meu Deus”, além de inúmeras letras com referências às questões religiosas.

[19] “Sempre que cantou pra subir, pode crer/Que eu já vi/Que Oxóssi “Ogum/Cabe a mim me comparar/Com Luther King”, na música Cantando pro Santo: Onilê, o Pai Ogum, Ai ei eô, Mãe Oxum/Filho de Zambi, cansado de ver sangue aqui na Sul/Odara, Odara ao povo Preto, seja obsoleto/Talvez mais ligeiro faça tudo em segredo”. Sabotage. “Dama Teresa”, 2002. E em seus clips Respeito é pra quem tem e Um bom lugar, observa-se imagens religiosas e ritos de um catolicismo popular com a religiosidade afro-brasileira.

[20] Trecho da música “Já era igreja” do Trilha Sonora do Gueto: “Alô, alô, alô, fala que eu te escuta/Me dá o teu dinheiro e vive igual filha da puta/Alô alô alô, igreja é tudo igual/Não importa se é católica ou é Universal/Alô, alô, alô, cuidado meus irmãos/Pega o seu dinheiro e vai comprar alimentação/Alô alô alô, cuidado com o Edir Macedo/Que fala na TV que é rico com o seu dinheiro”; trecho da música “Oitavo anjo” do Dexter: “É difícil ter a mente sã, detenção, pior que o Vietnã/Um cristão me ligou para me dar uma ideia/Disse pra mim que Jesus ta a minha espera/Disse também, pra eu mudar de vida/Ae mano, eu não me escondo atrás da Bíblia/Sou quem sou, assim sigo em frente/Deus está comigo, não preciso virar crente/Nada contra quem é na fé, mas tem canalha que se esconde né?”

[21] Em setembro de 2017 circulou pelas redes um vídeo onde supostos traficantes do morro do Dendê, destroem um centro de Umbanda em nome de Jesus. Em 2018, a estudante de artes da UERJ, Matheusa Passareli, foi morta por traficantes do morro do 18, em Quintino.

[22] “Vai ter bicha no rap sim, e eu nem sou pioneiro” por Murillo Zyess, “Bem, não há rola nesse mundo que nos proíba de ocupar/Não há mano nessa cena que tente nos silenciar” por Harlley, “Sem torcer o nariz, meu rap que clama, soma/Rap de bicha preta/Boombap enlouquece e toma” por Lucas Boombeat na música “Quebrada Queer.

[23] “Nós tá aqui por cada bicha com a vida interrompida/Por causa de homofobia, ódio e intolerância/Resistimos no dia a dia/Pra poder chegar o dia que prevaleça respeito, igualdade e esperança”. Por Murilo Zyess, na música “Quebra Queer”.

[24] “Travesti nossa que estais no céu/Santificado seja o nosso nome/Alice, Cecilia, Eoá, Erica, Olga, Amara/Ela, Ametista, Elixa/Seja feita a vontade das vadias/Assim na terra/Como em qualquer outra esquina (…)Pela Deusa Travesti/A Deusa dos corpos que querem Resistir/Deus é Travesti/A Deusa dor corpos que querem Existir” Alice Guél. “Deus é travesti”. Alice no país que mais mata travestis, 2017.

[25] Para o aprofundamento no assunto, pesquisar as teólogas Ivone Gebara, Nancy Cardoso, Odja Barros, Angélica Tostes e Maryuri Mora Grisales.

[26] Para o aprofundamento no assunto, pesquisar os teólogos Ronilson Pacheco, Marco Davi de Oliveira, André Guimarães, James Cone e Martin Luther King Jr.

[27] GOSS, Robert. Queering Christ: Beyond Jesus Acted Up. Cleveland: Pilgrim, 2002. p. 252

[28] GOSS, Robert. Queering Christ: Beyond Jesus Acted Up. Cleveland: Pilgrim, 2002. p. 3–35

[29] MUSSKOPF, André. Via(da)gens teológicas: itinerários para uma teologia queer no Brasil. São Leopoldo: EST/PPG, 2008. p.139

[30] BOEHLER, Genilma. O Deus Queer: O Deus que temos que libertar do espelho de nossas próprias ideologias.

[31] Quando em 2004 Marcella Althaus.Reidesteve no Brasil, foi entrevistada pela jornalista Eliane Brum3 para a Revista Época: Eliane Brum, Revista Época, Edição 329, 06 — ‐09 — ‐2004.

[32] BOEHLER, Genilma. O Deus Queer: O Deus que temos que libertar do espelho de nossas próprias ideologias. In ALTHAUS‐REID, 2004, p. 2.

[33] BOEHLER, Genilma. O Deus Queer: O Deus que temos que libertar do espelho de nossas próprias ideologias.

[34] Aqui se afirma um pensamento teológico a partir da beleza e da degustação em Rubem Alves: “Assim proclamo o único dogma da minha teologia cristã erótico-herética: ‘Fora da beleza não há salvação’” ALVES, Rubem. O Deus que conheço. Campinas: Verus, 2015. p. 31; “Deus não é objeto de pensamento. É objeto de degustação” ALVES, Rubem. Perguntaram-me se acredito em Deus. São Paulo: Planeta, 2013.

[35] Sobre o teor profético pautado na justiça e seus efeito: “Então o sacerdote de Betel, Amazias, enviou esta mensagem a Jeroboão, rei de Israel: ‘Amós está tramando uma conspiração contra ti no centro de Israel. A nação não suportará as suas palavras’”. Biblia Sabrada (NVI) Amós 7:10.

Bruno Rocha é palhaço, professor e pastor. Formou-se em bacharel em Teologia (FTBSP) e atualmente cursa Teatro (IFF). Seus temas de reflexão são: arte, educação, teologia da libertação e palhaçaria.

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