O valor do Design para análise de cenários, decisões gestoras e estratégicas em época de incertezas

Julio Cesar De Freitas
Integrativa
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5 min readJul 8, 2020

Tínhamos uma realidade relativamente controlada no desenvolvimento de produtos e serviços. Nossos processos eram, na maior parte das vezes, pensados, planejados e desenhados. Tínhamos atividades corriqueiras e cotidianas de atualização dos processos que já estavam mapeados e também, em sua maioria, uma dinâmica de constante revisão, atualização e melhoria desses processos.

Bom, o que podemos ver com esse parágrafo anterior é que o que nós tínhamos de verdade era um discurso bem elaborado sobre, muitas vezes, uma prática que se limitava a um grande desejo não só de um indivíduo gestor, mas de todo um time de área ou mesmo de toda uma comunidade de organização que sabia das suas deficiências operacionais. Que também muitas vezes possuía algumas iniciativas isoladas de documentação e gestão dos processos e dos procedimentos, mas que, na entrega final, se deparava com retrabalhos, descontentamentos e com aquilo que nós chamamos na FLUXE de baixo coeficiente de fluidez.

Uma outra realidade

Agora, sem mais nenhuma novidade, o que a gente tem é todo um parque industrial e todo o conglomerado riquíssimo no Brasil de empresas prestadoras de serviços, diante não apenas de uma revisão e melhoria de processos, mas de uma necessidade sem precedentes de redesenho dos seus próprios modelos de negócio. A presença marcante e mais incidente das tecnologias digitais (como demonstrado por muitas das fontes de reflexão, pesquisa e notícias), acelerou o processo de transformação digital das empresas.

Mas constatamos que sozinha ela não é capaz de acelerar um processo de transformação de modelo de negócio, que muitas vezes é encarado ou percebido pelas empresas como a simples mudança de um processo manual para um processo automatizado ou, então, transferir atividades manuais para todo um ecossistema de tecnologia digital mediada por SaaS (Serviços prestados por meio de sistemas digitais), com grandes recursos de armazenamento em nuvem e caríssimos processamentos de dados dialogando com o conceito de Big Data.

O que nós devemos, na verdade, é ponderar sobre o fato de que a transformação digital impulsiva não dará conta do auxílio ao redesenho dos negócios que sofreram com esse “tsunami” que nos atropelou e que estamos vivendo no mundo todo e, em particular, aqui no Brasil.

Redesenhando negócios e estratégias

Um claro indício de que existe a real necessidade de se redesenhar os modelos de negócio foi o movimento de várias organizações na inesperada urgência de se migrar do trabalho presencial para o trabalho remoto, seja com uma parte dos colaboradores ou com a totalidade deles. Essa atitude fez com que todo o arsenal de recursos tecnológicos das empresas fosse revisto no primeiro momento e, claro, repensado no momento seguinte. Também se verificou a mudança de olhares e posturas sobre a própria essência do trabalho remoto e reconheceram-se as diferenças entre trabalhar remotamente ou trabalhar em Home Office. Tivemos que enfrentar novos desafios, como por exemplo o de como entregar a liberdade de acesso aos recursos tecnológicos com mobilidade, uma vez que o colaborador está remoto e acessando a rede da empresa por diferentes dispositivos sem prejuízo da segurança dos ambientes que abrigam as informações sensíveis nas organizações ou, ainda, qual a infraestrutura mínima necessária para se trabalhar em Home Office (uma vez que por se tratar de um ambiente privado familiar, o recurso tecnológico poderia ser utilizado de forma compartilhada abrindo assim de cara fragilidades no conceito de segurança).

E todas essas questões em um indissociável diálogo com as premissas clássicas das Leis Trabalhistas nos fizeram, então, redesenhar também os modelos de contratos de trabalho,redefinindo parte das responsabilidades do colaborador e uma grande parte das responsabilidades do contratante.

Passou-se a falar com mais intensidade — e não menos seriedade — sobre a importância da ergonomia nas estações de trabalho, mesmo em atividades gerenciais. Recorde-se que no passado a ergonomia era muito observada em postos de trabalhos de produção, mas com essa necessária mudança de modelos de negócios e de modos de operação das empresas que resistem ao choque da pandemia, a ergonomia passou a fazer parte de um olhar muito atento, uma vez em que, no ambiente de trabalho nas circunstâncias remotas ou em Home Office, não se tem necessariamente o controle de aspectos e de premissas estabelecidas pela NR 17 (Portaria MTb n.º 3.214, de 08 de junho de 1978).

Bem, por todas estas e outras várias questões que envolvem a necessária remodelagem dos negócios, saber identificar possibilidades e caminhos para definir as ações tornou-se uma habilidade indispensável no enfrentamento das consequências econômicas da pandemia pela resistência de um bom modelo, não só de gestão dos nossos negócios, mas também do negócio como um todo.

Uma nova matriz para um novo cenário

Para darmos conta disso, foi necessário o desenvolvimento de matrizes de análise e Design de cenários. Para produção dessas matrizes, reúnem-se (num olhar atento e preciso), um conjunto de elementos necessários para que o gestor possa decidir pelo cenário mais apropriado em consonância com o planejamento estratégico da empresa. Planejamento este que, em suas estruturas, também promovem-se alterações a partir do impacto sentido pelas oportunidades percebidas, gerando um ciclo virtuoso aberto para novas percepções e aplicações que resultem em maior eficiência na gestão do negócio.

Como consequência das ações vivenciadas no atual contexto, podemos afirmar que três pilares sustentam uma boa condução de enfrentamento às consequências econômicas geradas pela pandemia.

O primeiro pilar é o das pessoas. Essas estão sensibilizadas, impactadas e ao mesmo tempo motivadas pela manutenção dos seus empregos, pela preservação de sua saúde e pela melhoria da maneira como desenvolvem suas atividades e seus relacionamentos nas empresas em que trabalham.

O segundo pilar é o da tecnologia. Essas tecnologias hoje, felizmente, estão amparadas pela existência da internet, que permitiu uma atividade remota até então questionada pelas corporações tradicionais, mas que demonstraram imensa eficiência suportando um elevado tráfego de informações e dados durante as atividades parcialmente ou totalmente remotas e estimularam os seus propositores no desenvolvimento de novos produtos e serviços adequados a essa nova realidade.

E, por último, o pilar da infraestrutura. No passado, a infraestrutura no trabalho muitas vezes referia-se exclusivamente a uma edificação de um prédio, salas de escritórios, mobiliários, ar-condicionado, cabeamento lógico e computadores. Atualmente, a infraestrutura extrapola os limites físicos das empresas nas suas atividades presenciais e invade a residência dos colaboradores, solicitando ajustes no encontro entre uma demanda de velocidade, eficiência e segurança, contra, muitas vezes, a precariedade de uma infraestrutura residencial particular e pré-instalada.

A observação destes três pilares deve viabilizar qualquer iniciativa na construção de análise e design dos cenários a partir de um conjunto imenso de possibilidades e caminhos a serem seguidos pelas empresas e seus colaboradores. Eu acredito que o design de processos, aliado às metodologias de desenvolvimento técnico e criativos, vão auxiliar as corporações e seus profissionais a atravessarem esse período e então estabelecerem uma nova maneira de trabalhar, continuar produzindo e entregando produtos e serviços cada vez melhores e alinhados com um propósito de gerar valor positivo de conforto à vida das pessoas.

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Julio Cesar De Freitas
Integrativa

Designer, Head de Negócios da FLUXE Operações Fluidas e Sócio-Fundador da Eduxe Escola de Inovação e Gestão da Fluidez. Professor Universitário.