Web Summit

Web Summit 2021: um retorno à complexidade

Carolina Guimarães
ioasys-voices
Published in
10 min readNov 30, 2021

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As consequências do momento atual parecem ser tão profundas e ao mesmo tempo tão difíceis de enxergar quanto a era da internet no final do século passado. Estamos vivendo um momento único — e é muito importante que todos saibam disso. Nesse texto, vamos compartilhar uma leitura do Web Summit 2021, a partir do ponto de vista da inovação.

O Web Summit é um dos maiores eventos de tecnologia do mundo. Acontece anualmente e reúne as principais empresas e startups, além de nomes importantes do mercado de tecnologia, governos e pesquisadores. Este ano, o evento foi mais especial ainda, por marcar um retorno às atividades presenciais em meio à flexibilização da pandemia do COVID-19 que deu o tom para várias das reflexões levantadas.

Mais de 40 mil pessoas de 168 países se reuniram em Lisboa, para acompanhar 2 mil startups e assistir a diversas palestras e masterclasses. Em meio a tanta troca e informação, o que ficou claro é que estamos no momento da mudança.

O futuro parece exigir mais capacidade de adaptação e resposta rápida — e ninguém quer ficar para trás.

Vem com a gente conferir os principais destaques!

Metaverso

Bem-vindos ao metaverso

O avanço de inúmeras tendências tecnológicas que vinham se delineando ao longo das últimas décadas tornaram possível uma nova configuração de realidade que vamos passar a experienciar de maneira mais intensa a partir de agora.

A grande mudança que estamos falando é que o espaço digital passa a ser imersivo — o que muitas pessoas têm chamado de metaverso. E o que isso quer dizer?

Que a tecnologia vai ser cada vez mais utilizada para aumentar a realidade.

Imersivo, nesse contexto, quer dizer que o que antes era restrito à algumas dimensões, agora passa a englobar tudo. É um universo muito além do que existia até recentemente. Na medida em que as barreiras entre o mundo físico e as diversas possibilidades do digital ficam cada vez mais fluídas, se torna possível criar novas realidades e experiências compartilhadas.

A tecnologia permite acrescentar novas camadas à experiência humana, com o potencial de revolucionar o mercado de trabalho, de bens, serviços, saúde e educação e muito mais.

“Não quero viver em um mundo totalmente oculto. Eu quero viver no meu mundo físico e ter esse mundo aumentado para mim. Essa é a verdadeira promessa do metaverso, é para onde acho que estamos indo” Peggy Johnson — CEO da Magic Leap

Não é de se surpreender que a palavra da vez do Web Summit tenha sido metaverso.

Vale destacar que o evento aconteceu dias depois do anúncio do Facebook se posicionando como Meta, e que o destaque da noite de abertura foi a Frances Haugen a whistleblower da vez que denunciou práticas questionáveis do grupo dando ainda mais força para o assunto.

Apesar de ter tido poucas palestras focadas no tema metaverso propriamente dito, nos Q&As e nas palestras que abordavam outros assuntos, foi muito comum haver desdobramentos que orbitavam em torno da temática. Muitas vezes atravessadas, pouco maduras ou até mesmo incipientes, emergiam reflexões sobre como seria o marketing, o comércio, a segurança e até mesmo o dia a dia de trabalho dentro do metaverso.

Mesmo os momentos dedicados à temática não foram capazes de abordá-la em sua total complexidade. É um assunto novo, que demanda muita reflexão e isso o Web Summit trouxe em abundância.

“Não quero viver em um mundo totalmente oculto. Eu quero viver no meu mundo físico e ter esse mundo aumentado para mim. Essa é a verdadeira promessa do metaverso, é para onde acho que estamos indo” Peggy Johnson — CEO da Magic Leap

Mais perguntas do que respostas

Ficou evidente que foi um evento que girou muito mais em torno dos impactos da tecnologia do que da tecnologia em si.

E isso tudo pautado por um senso de urgência — não estamos mais falando de um futuro longínquo, mas sim do amanhã, ou até mesmo do agora. Foi possível perceber um tom humano tangível, uma responsabilização coletiva, um convite ao debate. Transparência, propósito e co-criação foram termos amplamente utilizados, o que faz total sentido quando pensamos no espírito do tempo em que estamos vivendo.

O evento foi permeado por muitas provocações sobre como imaginamos o futuro, mas trouxe muito peso para o que vamos fazer no amanhã.

O amanhã é o futuro acionável. É o primeiro passo para o futuro.

“Acredito que nós somos aqueles pelos quais temos esperado. Temos a oportunidade de acelerar a implementação de nossos valores. O poder de mudar o que está errado ainda está em nossas mãos, mas a hora é agora” Ayo Tometi — Co-fundador do Black Lives Matter

O que aprendemos enquanto humanidade ao longo da história é que esses momentos de inflexão reestruturam o planeta. A ascensão da revolução tecnológica que vamos presenciar, que timidamente denominamos como metaverso, vai trazer grandes oportunidades, mas também grandes ameaças e implicações sociais em diversos âmbitos.

O que ficou claro no evento foi uma volta à complexidade, em que é necessário parar, divergir e fazer perguntas antes de tentar buscar as respostas.

Precisamos deixar as conversas mais nítidas, democratizando o conhecimento. Precisamos encontrar maneiras de discutir sobre temas tão complexos de uma maneira mais tangível, para que seja possível trazer mais pessoas para a conversa.

“O maior desafio de quando acontece uma mudança profunda nas regras do jogo da vida é conseguir compreendê-las rapidamente, não apenas para poder continuar jogando, mas para ganhar vantagem competitiva — as pessoas que as entendem desbloqueiam um poder extraordinário” Martha Gabriel — Futurista

Uma lição importante que se desdobra desse senso de urgência é que não podemos mais estar falando sobre a vanguarda da inovação digital e apenas tangenciar temas como Blockchain, Criptomoedas, NFT, Biohacking, Phygital e metaverso. Tudo indica que estes vão ser termos que vão estar cada vez mais presentes nas conversas a partir de agora. Discutir sobre eles de maneira superficial não é mais suficiente para surfar o tsunami de mudanças que está por vir.

Com grandes inovações, vêm grandes responsabilidades

Mas ao mesmo tempo em que é importante entender estes novos fluxos, avanços técnicos e ser um life-long learner em constante atualização, não podemos deixar de lado o ativismo. A tecnologia tem aberto espaço e nos dá o poder para criarmos o que quisermos, o que implica em uma grande responsabilidade.

“As pessoas que trabalham com tecnologia precisam ter formação humana. Temos muito poder em nossas mãos” Frances Haugen — Facebook Whistleblower

Em consonância com o caráter humano desta edição do evento, foi discutido muito também sobre o futuro da sociedade.

O Web Summit contou com um palco dedicado a esse tema, que foi permeado por temáticas relacionadas ao ativismo. Um dos destaques nesse âmbito foi o Siyabulela Mandela, neto do Nelson Mandela, que levantou uma reflexão importante sobre o papel da comunicação na transformação social.

A tecnologia é um acelerador do tempo. Ao mesmo tempo que pode trazer transparência para a sociedade, pode colaborar também para a disseminação de não-verdades. Siyabulela fez um chamado importante para o jornalismo responsável e a regulamentação como estratégias para combater a disseminação de fake news, além de democratizar informações e conhecimentos — atuando como um agente da transformação social.

Tendo em vista que o futuro que se delineia inevitavelmente passa pela Inteligência Artificial, os Emirados Árabes, por exemplo, já se adiantaram e anteciparam o problema, instituindo um ministério para lidar com regulamentações e assuntos relacionados à IA.

A regulamentação e a responsabilização coletiva foram temas que estiveram em alta durante o evento como um todo. Daniela Braga, fundadora da Defined.ai, trouxe várias reflexões a respeito dos desdobramentos sociais da Inteligência Artificial (IA), ressaltando que temos dois grandes experimentos em curso: os EUA e a China.

Ambos avançam na evolução da tecnologia, mas sob dois diferentes regimes de valores. O primeiro é guiado pelo capitalismo, com pouca regulação e muito poder na mão das empresas. O segundo, é guiado pelo estado, que controla os desdobramentos da tecnologia a partir de uma ideologia comum.

Daniela ressaltou que ainda não está claro quais são os impactos de cada um, mas que nenhum destes modelos é efetivamente capaz de mitigar todos os impactos sociais negativos da IA. A questão é mais profunda. Em sua visão, a próxima evolução da Inteligência Artificial deve inserir a ética dentro dos algoritmos.

Christopher Wyile, diretor de pesquisa da H&M e Whistleblower da Cambridge Analytica, trouxe ainda uma reflexão sobre a importância da responsabilização dos engenheiros de software sobre o que é criado nas empresas de tecnologia. Christopher acredita que, da mesma maneira que um engenheiro civil é responsável por garantir tecnicamente a segurança de uma construção, os engenheiros de software devem ser responsabilizados pelos produtos digitais.

A questão se complexifica ainda mais quando acrescentamos à discussão as evoluções do Machine Learning. Daniela Braga ressalta a necessidade de refletirmos sobre como vamos criar estas automações, defendendo que devemos educar os robôs da maneira com que educamos as nossas crianças: a partir da ética.

Espaços sintéticos, mas fundamentalmente humanos

Nesse contexto de mudanças é muito fácil se perder e se sentir sobrecarregado.

Nesses momentos, é importante lembrar que existem algumas constantes que não mudam e que, em grande parte, a tecnologia abre espaço para endereçarmos de maneira diferente o mesmo conjunto de necessidades humanas que existem há séculos.

Um grande exemplo disso, que foi muito relevante durante o evento, são as comunidades.

Pessoas são naturalmente seres sociais. Fazer conexões, colaborar e compartilhar são premissas básicas do comportamento humano que tem sido potencializadas pela tecnologia — abrindo possibilidades para marcas criarem comunidades fortes que compartilham objetivos comuns.

Além de facilitar que marcas aproveitem a sabedoria da multidão conectada, a aceleração tecnológica abre portas para o estímulo de que os consumidores cocriem com as marcas, atuando em colaboração constante.

Com o boost do Social Commerce, as Brand Communities, estratégias de Loyalty e embaixadores de marca se tornam pedras angulares. Nesse cenário, se destacam as marcas que criam narrativas longas, autênticas e que incorporam os inputs dos consumidores em sua trajetória.

Entretanto, para criar relações significativas com os consumidores na era da transparência, ter um propósito forte é uma premissa estratégica. Marcas que enxergam seus colaboradores como ativo principal para a construção de uma cultura sólida ganham força. Modelos de Hackathon e Crowdsourcing se tornam cada vez mais fortes para empoderar a criação descentralizada e ágil.

Assim, a construção de comunidades internas ganha tanto valor quanto as externas. Em sua palestra sobre post-purpose brands (marcas pós-propósito), Alain Sylvain, CEO e fundador da SYLVAIN, defendeu que as culturas das empresas do futuro dependem de um propósito que seja mais do que um discurso. Ele tem que ser colocado em prática e estar na mão dos colaboradores. Além disso, o propósito deve ser autêntico.

Em busca do que é realmente autêntico

Em um contexto cada vez mais marcado pela massificação de tudo, o único, autêntico e original se destaca como estratégia para criar experiências e produtos genuinamente significativos.

Um grande exemplo disso são os NFTs, que ganham força como uma maneira de possibilitar a valorização do único e do colecionável em um ambiente de replicação infinita.

“Como seres humanos, colecionamos coisas há séculos. A exclusividade não foi construída na web como a conhecemos. O NFT é uma nova maneira de desbloquearmos estas experiências” Nicolas Julia — CEO da Sorare

Já falamos por aqui sobre a desmistificação da criatividade como dom. Temos uma tendência natural de romantizar inovações revolucionárias, mas está se tornando cada vez mais claro que o segredo é aprender a explorar os limites e potencialidades ao nosso redor. E o Web Summit deixou isso muito claro.

O avanço da tecnologia abre espaço para que o ser humano abrace o seu lado criativo. A Creators Economy, cada vez mais em alta, valoriza e possibilita um retorno à arte, que procura o autêntico em meio a complexidade. Na medida em que a se torna possível criar até mesmo novos universos, o segredo está em empoderar as pessoas para abraçarem a sua identidade, potencializando a sua voz.

Estamos entrando em uma era que se mostra altamente tecnológica, mas fundamentalmente humana. Uma era permeada por máquinas humanas e humanos máquinas, em que será muito mais importante pensar nos sistemas sócio tecnológicos que construímos não apenas na tecnologia em si.

Para lidar com todas essas mudanças, Amy Poehler dá uma dica importante:

“Esteja aberto, permaneça flexível e pronto para ideias diferentes. Não fique na defensiva” Amy Poehler — fundadora da Amy Poehler’s Smart Girls

Por fim, vale ressaltar que a startup vencedora da competição de pitches no Web Summit este ano foi uma empresa que transforma cinzas em diamantes, um passo importante para o redesign da vida.

Apesar de não ser uma ideia inédita, o questionamento ainda continua relevante quando pensamos no legado que queremos deixar. É um convite para assumir um papel que vai além do reagir às mudanças se trata de nos tornar protagonistas, até mesmo no pós-vida.

Mais um forte indicador de que estamos realmente na era de ressignificação.

Nada melhor do que terminar este texto com uma pergunta, que espero que se transforme em várias outras: qual é o futuro desejável que vamos construir com toda essa tecnologia?

Ficou com dúvidas ou quer trocar mais ideias sobre inovação?

Na ioasys, usamos a diversidade como catalisador criativo para transformar problemas complexos em soluções simples, por meio de processos de inovação estruturados.

Assim, facilitamos a transformação digital de empresas ousadas e cocriamos experiências únicas de pessoas para pessoas. Se interessou pelo assunto? Venha nos conhecer!

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Carolina Guimarães
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Arquiteta e designer, apaixonada por tecnologia. Acredito que inovação move o mundo e que podemos impactar positivamente as pessoas através dela :)