Quanto mais tecnologia, mais humanos precisaremos ser.
Fabricio Dore e o SXSW 2023.
Todo ano, durante uma semana, o SXSW transforma Austin (Texas, USA) no centro global de discussões sobre inovação, criatividade e futurismo.
Neste ano, o Itaú foi um dos patrocinadores oficiais do evento e nós, de design, marcamos presença pessoalmente.
Fabricio Dore, nosso Diretor de CX Design, foi o nosso representante no festival. Depois de sua passagem pelo evento — que rendeu até um painel sobre centralidade no cliente — conversamos com ele sobre como as discussões lá no Texas vão impactar nosso negócio aqui no Itaú.
São muitas as reflexões trazidas por ele, mas o assunto é um só e a conclusão é inquestionável: a tecnologia nos forçará a ser, cada vez mais, humanos.
Você confere, nas próximas linhas, a entrevista que fizemos com ele.
Fabricio, para quem não participou do festival, como você resumiria os temas que foram abordados?
Todas as grandes apresentações tocaram no tema de Inteligência Artificial, só que de formas diferentes. Eu saí com uma mistura (de sentimentos) de muito impressionado e com muito medo, ao mesmo tempo, sobre o que vai acontecer daqui em diante. Caiu a ficha para mim. Eu não tinha noção do quão avançado esse assunto estava e do tamanho do impacto que essa tecnologia tem no que nós fazemos e de um jeito muito rápido.
Mas estamos falando de impactos em qual horizonte de tempo?
As implicações são imediatas. A maneira como os adolescentes estão buscando e fazendo resumo de textos para estudar, pessoas escrevendo review de LinkedIn e mensagens usando o ChatGPT. Isso já está acontecendo agora.
Um exemplo foi uma palestra que assisti, sobre computação quântica. A palestrante falou durante uma hora sobre o assunto, se aprofundou nos temas e ao final revelou: “Eu não sei nada sobre esse assunto. Tudo o que eu disse aqui, eu usei o ChatGPT para escrever”.
Então, aqui nos deparamos com uma parte desafiadora: a de não saber quem é que, de fato, está criando o conteúdo. Essa tecnologia tem uma capacidade enorme de absorver e criar informação, inclusive com seus impactos éticos e morais sobre tudo o que é produzido nela. E isso interfere diretamente em como fazemos banking, por exemplo.
Há uma curva de aprendizado necessária, que pode implicar em falhas e erros no uso dessas novas ferramentas. Como encaramos a possibilidade do erro, quando lidamos com o dinheiro dos clientes?
Algumas reflexões me vêm à mente:
A primeira é que não temos como não testar, não participar dessa revolução. A premissa é essa. Precisamos estar envolvidos, trazer a tecnologia e não podemos ser negacionistas. Isso seria um erro para nós.
O segundo ponto é que precisamos de uma maturidade no uso das informações, qualquer que seja o motor que vamos usar. As informações precisam ser corretas e as respostas coerentes.
O último ponto é que ainda vamos precisar, por um certo tempo, de uma supervisão humana para garantir que a interação com a inteligência artificial produzirá as melhores informações.
Falando em informações, nós lidamos com um volume brutal delas. Qual o nosso papel enquanto instituição financeira, nesse cuidado com os dados que detemos, consultamos e produzimos?
Nossa instituição é muito sólida em relação a isso e o nosso papel é o de continuarmos sendo consistentes e robustos no uso das informações. A confidencialidade, a segurança e a confiabilidade nunca foi tão importante.
Com o motor dessas inteligências artificiais, qualquer informação é processada e divulgada com muita facilidade e rapidez. Isso multiplica a nossa responsabilidade comoguardiões dos dados dos nossos clientes. Nosso papel ético de protetores e reguladores dos dados e informações que temos e produzimos será cada vez mais importante.
Com todo esse panorama, você acha que o perfil da nossa interação com o cliente deve mudar?
Essa é outra reflexão que precisaremos fazer. Como o John Maeda (VP Design e Inteligência da Microsoft) trouxe em uma de suas palestras, nos últimos tempos nós nos acostumamos e aprendemos a falar a linguagem das máquinas — a linguagem da programação. Agora precisamos voltar a falar “humano”.
As interações estão voltando a ser humanizadas, mesmo que com uma máquina por trás: o uso de fotos, vídeos, textos, voz. Isso torna tudo mais complexo, pois essa comunicação tem mais nuances do que um simples toque em uma tela. Precisamos passar a entender o que, de fato, o nosso cliente está precisando naquele momento de interação.
Por exemplo: a resposta da pergunta “Posso comprar uma calça?” não passa somente por verificar o saldo da conta do cliente. Isso seria somente transacional. A resposta ideal para um chat que cuida da sua vida financeira envolve tomada de decisão e avaliação de cenários.
Essas mudanças nos forçam a ser muito mais customer-centric do que nós jamais fomos. Nós precisaremos focar nas necessidades e dores reais das pessoas.
Como podemos nos preparar para acompanhar a velocidade que essa tecnologia está nos impondo? Temos alguma lição de casa já mapeada?
A palavra é começar. Nós nunca vamos estar 100% prontos.
Podemos fazer faseado, com grupos pequenos para não ofender nossas bases de clientes.
Mas precisamos testar. É a única forma de avançar.
Além disso, nós precisamos pensar estrategicamente qual o nosso norte usando essas tecnologias. Será que, por exemplo, precisaremos continuar com os nossos canais tradicionais de atendimento no futuro, como nosso aplicativo? Ou as interações poderão ser resolvidas todas via chat? Será que os profissionais que temos e sistemas que usamos hoje serão os mesmos no futuro?
São grandes provocações que, hoje, ainda não têm resposta. Mas o que precisamos fazer é trazer para dentro de casa, aprendermos e fazermos uma reflexão de longo prazo. Precisamos começar de algum lugar e ir avançando.
E quando falamos sobre Design em si? Como o futuro dele está se desenhando nesse novo contexto?
Acredito que uma nova carreira pode estar se desenhando aí, que seria a “AiUx”, odesigner de interação e experiência com inteligência artificial.
Mas para além disso, a tecnologia muda tanto o processo quanto o resultado do trabalho.
O processo muda radicalmente com o ChatGPT operando, gerando testes e opções, para o designer somente refinar e melhorar o resultado. Podemos falar em multiplicar a produtividade de um designer em 10x, de partida.
Por conta de todas as nuances dessa comunicação mais humanizada, os motivos que originam a criação de uma nova experiência mudam. Como ele, as possibilidades de resultados dessas experiências também se multiplicam.
Para finalizar, não podemos deixar de perguntar: como foi a experiência de palestrar no SXSW?
Você nunca sabe como vai ser um painel antes de ele começar, então fica uma expectativa muito grande (risos). Mas foi um sucesso, estava lotado do início ao fim.
Acredito que o sucesso do painel foi por conta da importância do tema que abordamos — sobre como reorganizar as empresas para que elas tenham centralidade no cliente. Isso parece um tema tão “batido”, mas todas essas mudanças de que estamos falando aqui ressaltam ainda mais a relevância dessas discussões.
Nós conseguimos juntar, no mesmo ambiente, empresas com características e tamanhos diversos para falar sobre um tema comum a todas elas: falamos sobre métricas e indicadores quantitativos, gestão de experiência e escala, produtização e equipes. São pautas centrais aqui do Itaú, que nos balizam no dia a dia, principalmente quanto à qualidade do que produzimos.
Mas o tema mais interessante foi quando falamos sobre propósito. Quando falamos sobre centralidade no cliente, nós começamos com dados, mas terminamos sempre falando sobre a mesma coisa: melhorar a vida financeira do cliente — seja isso como for. No fim do dia, todos precisamos estar alinhados a esse propósito para termos produtos realmente relevantes.