A importância das etapas de imersão em UX Research

Construindo uma base sólida para conduzir pesquisas de experiência do usuário cada vez mais impactantes

Daniel Barros
IxDASJC
7 min readAug 19, 2020

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As pesquisas de experiência do usuário estão ganhando cada vez mais espaço dentro de agências, consultorias, startups e empresas ligadas ao mercado de tecnologia.

Isso é algo relativamente normal, principalmente quando entendemos que a visão do usuário é extremamente importante para evolução de qualquer produto ou serviço.

Porém, mesmo em um cenário tão favorável, precisamos falar sobre algumas etapas importantes e que vem sendo negligenciadas ao longo dos projetos de pesquisa, muitas vezes devido a “falta de tempo” ou “processos que ainda não estão maduros o suficiente”. Entre elas, duas que considero fundamentais para alcançar bons resultados: Mapeamento do perfil do entrevistado; Análise do objeto de estudo.

MAPEAMENTO DO PERFIL DO ENTREVISTADO

Recrutamento

Uma das primeiras etapas de uma pesquisa é o recrutamento, que acontece em paralelo com outros processos e tem como principal tarefa buscar usuários que estejam de acordo com o perfil do estudo.

Para que essa fase corra bem, é necessário direcionar os recrutadores através de uma ferramenta que nós chamamos de Screener: um documento responsável por filtrar quais pessoas são adequadas ou não à pesquisa.

Formulário de Mapeamento do Perfil

Enquanto nossa equipe entra em contato com os participantes, podemos começar a construir nosso formulário.

Este artefato é muito utilizado para apresentar aspectos econômicos, geográficos e culturais do nosso público alvo. Além disso, é possível mapear a maturidade digital do público identificando seu ecossistema e padrões de uso, tudo isso antes das entrevistas acontecerem.

Abaixo, uma lista de aspectos passíveis de serem encontrados:

  • Financeiro: classe social, salário, benefícios assistenciais, aposentadoria.
  • Profissional: empregado, desempregado, proprietário, gerente, líder, subordinado, informal, CLT, PJ, autônomo.
  • Gênero: heterossexual, LGBTQI+, cisgênero, assexual.
  • Relacionamento: solteiro, casado, viúvo, separado, namorando.
  • Família: cônjuge, filhos, enteados, parentes.
  • Moradia: sozinho, com parentes, com cônjuge, com filhos(as).
  • Residência: casa, apto, kitnet, edícula.
  • Localização: urbano, rural, periferia, centro, favela, condomínio, capital, interior, litoral.
  • Psicológico: estressado, tranquilo, preocupado, cansado, realizado, sobrecarregado, ansioso.
  • Físico: paralítico, cego, daltônico, surdo, mudo.
  • Social: comunicativo, introspectivo, reservado, aberto, extrovertido.
  • Digital: muitos aplicativos, poucos aplicativos, apps diversos, apps de um único segmento, mais de uma plataforma (site, app, sistemas).

Por que nós deveríamos saber tudo isso antes das entrevistas?

Devemos analisar estes pontos para conseguir “entrar na pele das pessoas” com quem vamos passar horas importantes do nosso dia, entendendo suas dificuldades, frustrações, sonhos, limitações, dentre inúmeros fatores que constroem sua realidade.

É uma forma de demonstrar afeto, cuidado e preocupação a partir do conhecimento sobre suas vidas, nos ajudando a criar ambientes e diálogos confortáveis durante as entrevistas.

“Tudo, da estrutura das perguntas à linguagem corporal, ajuda as pessoas a pensarem em voz alta e se expressarem com sinceridade.” Jake Knapp

Além disso, ao compreender a jornada diária dos entrevistados, podemos identificar possíveis momentos onde o objeto de estudo é utilizado. Esta é uma informação valiosa, visto que a maioria das metodologias são realizadas em ambientes controlados, que divergem de situações reais, como uma fila de mercado ou estação de metrô, onde fatores externos podem impactar na experiência como um todo.

Ficha do entrevistado

Após coletar as informações dos usuários, podemos construir fichas com seus principais dados para nos guiar antes e durante as entrevistas. Elas devem trazer uma foto da pessoa (se possível), com nome, idade, profissão, gênero e demais informações, de forma simples e objetiva. Assim, conseguiremos moldar nossa linha de pensamento para lidar com cada situação da melhor forma possível, seja controlando nossa postura, gestos, tom de voz, tipo de linguagem, dentre outros aspectos.

As fichas são uma forma de “se recolocar na pele dos usuários”, retomando suas experiências de vida com base no que foi analisado anteriormente.

DICA: Leia as fichas pouco antes das entrevistas e as mantenha com você ao longo do estudo. Faça isso de forma discreta para não assustar o entrevistado ou quebrar o vinculo de confiança.

ANÁLISE DO OBJETO DE ESTUDO

Um objeto de estudo pode ser algo concreto, como um aplicativo ou site, ou algo abstrato, como uma ideia ou tom de voz.

Imersão

Enquanto você não recebe os dados dos usuários, e aguarda seu time de recrutadoras e recrutadores fazer seu excelente trabalho, aproveite o tempo para entender a fundo o material com o qual você vai trabalhar.

Existem várias formas de realizar esse processo, porém, a que vou abordar neste artigo surgiu a partir de muitas tentativas e, até o momento, foi a que apresentou melhores resultados. Ela consiste na realização de uma Avaliação Heurística sobre o objeto a ser estudado.

Como lidamos quase sempre com pequenas partes de um fluxo (uma tela, um componente, uma sequência limitada de eventos) é relativamente simples realizar uma avaliação detalhada sem demandar muito tempo.

Qual o objetivo de aplicar uma avaliação heurística em um objeto que esta sendo estudado?

Existem quatro pontos principais que devem ser compreendidos para responder esta pergunta: Contextualização; Mapeamento dos fluxos; Identificação de problemas; Antecipação das dores.

Contextualização:

Uma vez que você passa por todas as possíveis informações de forma analítica, sua mente vai se acostumando com o cenário onde os usuários vão interagir. Dessa forma, fica mais fácil saber o que perguntar, e quando perguntar, durante a condução dos estudos, evitando surpresas caso os usuários acessem telas que não foram identificadas ao longo do processo de imersão.

Mapeamento dos fluxos:

Muitas vezes, é possível chegar ao mesmo lugar utilizando caminhos diferentes. Sistemas são fluídos justamente para que os usuários consigam ir e vir independente de onde estejam.

Ao mapear todas as possibilidades de fluxo, conseguimos questionar (e entender) os motivos que levaram um usuário a buscar caminhos alternativos. Dessa forma, levantamos fatos que possivelmente não seriam apontados se nossos direcionamentos fossem limitados ao “fluxo feliz” da pesquisa.

DICA: Enquanto você navega, anote as telas por onde for passando e trace suas possíveis conexões. Marque também os trajetos que não fazem parte da pesquisa, mas que possivelmente poderiam levar ao resultado esperado. Posteriormente, você poderá entender com os envolvido no projeto se este caminho seria viável.

Identificação de problemas:

Ao avaliar as telas e mapear os fluxos, é possível identificar situações onde os usuários podem encontrar dificuldades. Uma vez localizados estes pontos, sabemos em que momentos nossa atenção precisa estar redobrada durante a condução do estudo.

Entre os casos que costumam aparecer com frequência, destacam-se:

  • Protótipos incompletos: faltam informações, componentes e as vezes telas completas.
  • Dados inconsistentes: informações que não se mantem iguais ao longo do fluxo, como valores, dados pessoais e característica visuais.
  • Indicadores de ação: algumas ferramentas, como o InVision, te dão a opção de deixar as áreas de clique (hotspot) visíveis, apontando onde o usuário deve interagir.
  • Navegação quebrada: links que não direcionam para onde deveriam, menus contraídos que não abrem, telas que não descem ou sobem.

A partir do momento em que os usuários se deparam com algum destes problemas, estamos gerando ruídos e enviesando os resultados. Isso é grave e impacta de forma negativa nos resultados da pesquisa.

DICA: Anote todos os pontos que encontrar e peça ao solicitante que verifique e corrija o máximo de situações possíveis antes das entrevistas, sinalizando que os resultados podem ser comprometidos.

Antecipação das dores:

Por fim, com todas essas informações em mãos, podemos antecipar possíveis dores que um usuário eventualmente possa encontrar ao longo do estudo. Dessa maneira, preparamos nossos artefatos de pesquisa para coletar estes dados de forma consistente e padronizada, facilitando as etapas seguintes.

Abaixo, listo algumas dores que costumam aparecem constantemente:

  • Falta de conexão entre as informações;
  • Textos confusos;
  • Valores que não condizem com a realidade;
  • Dados repetidos (informações replicadas);
  • Itens estáticos que parecem interativos;
  • Itens interativos que parecem estáticos.

DICA: Sinalize essas dores nos materiais que serão utilizados para condução da pesquisa, como documentos de observação e roteiro. Dessa forma, aumentamos a atenção da equipe diante de situações sensíveis.

CONCLUSÃO:

Quando falamos de pesquisas qualitativas precisamos trazer resultados com QUALIDADE, então, tudo dentro de um projeto é importante e deve ser tratado com seriedade e dedicação.

Uma pesquisa que não leva em consideração o contexto do usuário, e uma análise aprofunda do objeto de estudo, corre o risco de apresentar resultados insatisfatórios. Com isso, pode ser necessário aplicar outros métodos para atingir os objetivos iniciais, impactando em prazos, custos e alocação de pessoas.

Além disso, valorizar a execução destas duas etapas colabora com o restante do estudo, uma vez que os processos são melhores estruturados e as evidências são colhidas de forma consistente.

No próximo texto, irei abordar a importância em se fazer as perguntas certas durante a construção de um roteiro, e como isso pode impactar nos resultados de uma pesquisa de experiência do usuário.

Veja também outros artigos que escrevi sobre o assunto:

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