A hipocrisia familiar que reina no Natal

Jo Melo
ShutDiaries
Published in
3 min readDec 23, 2019

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É, chegou aquela época que deveria ser de festa, não sei porque, talvez pela tradição cristã do nascimento de Jesus Cristo ou por ser mais uma data que a gente tem de comemorar porque todos estão fazendo. Dizem que o Natal é o momento certo para reunir a família e parentes, aquelas pessoas que brigam o ano todo, se bloqueiam no Whastapp, falam mal, não ajudam, expulsam, batem, dizem palavras que marcam a nossa vida toda, mas todos têm de estar reunidos para quando for meia-noite, os abraços e felicitações soem da maneira mais dissimulada, ops, bonita possível. Vamos apagar as mágoas, afinal, é Natal!

A maioria das famílias que se dizem cristãs e cultuam o nascimento de Jesus esquecem seus ensinamentos (olha eu aqui, agnóstica falando sobre isso), mas é real. Quem conhece o mínimo da fábula, sabe que o que mais Jesus pregava era amor, ledo engano, mal sabia que as pessoas deturpariam totalmente o sentido dessa palavra e a usassem de uma maneira tão odiosa. “Amarás o próximo como a ti mesmo”, menos se ele for gay, trans, travesti, lésbica, negro, pobre, mulher, prostituta.

A maior hipocrisia da família cristã é isso, dizer que seguem o grande mestre ao mesmo tempo que destroem o psicológico dos seus filhos, desejam a morte de quem vai contra ou, pelo menos, critica o seu modo de conduzir sua religião. Há quem diga que prefere ver os filhos serem bandidos a se relacionarem com pessoas do mesmo sexo. É, os valores mudaram mesmo, Jesus. Ta foda!

Quantas pessoas passarão as festas com seus amigos porque não são mais aceitos em casa? Muitos, creio eu. As redes sociais não mentem quanto a isso, é de se provar, é o assunto do momento. Só ver. E se vão ao encontro da família, se deparam com perguntas íntimas e, muitas vezes, com intuito de humilhar. É um tal de “seu primo tá fazendo estágio na PQP, olha como ele é bom?”, “já se formou?”, “e os namorados?”, “quando vai casar?”, “quando vai ter filhos?”, “não tá na hora de fechar a fábrica?”, “você é um revoltado(a) por andar com esse pessoal” (pessoal que briga por direitos humanos, taokey?), pior, ouvir isso daquele tio que bate na mulher, assedia os funcionários e daquela tia que é obreira, mas não perde a oportunidade de falar que é puta, a moça que aos 30 ainda não casou e tem um filho de cada pai.

Aquelas pessoas que por estarem vestidos de “família perfeita”, acham que estão isentos de serem uns belos cuzões! A hipocrisia natalina reina, todos sentam à mesa, fazem oração, comemoram e acham que todas as barbaridades ditas e feitas ao longo do ano, serão apagadas com um simples peru e uma cereser da cesta, mas vou te contar um segredo, não precisa ser assim. Não mais!

O conceito de família vem sendo questionado tem alguns anos e estamos nos dando conta que família é alem de teros mesmos genes e herdar as mesmas doenças. Família são aquelas pessoas que estão com você a todo o momento. Te dando puxões de orelha? claro, mas ao seu lado, apoiando suas escolhas. Para os tradicionais, não importa se você está morto por dentro por não conseguir conviver com pessoas que te fizeram mal a vida toda, eles são seu sangue e você deve se dispor a isso, mas não. Você não precisa ter contato com quem te faz mal. Pensar na sua sanidade e saúde mental é sempre o mais importante.

E antes que eu me esqueça, feliz natal!

Originally published at http://joymeloblog.wordpress.com on December 23, 2019.

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Jo Melo
ShutDiaries

Mãe, autista/tdah com hiperfoco em escrita e premiada na Suíça. Escrevo sobre autismo, mulheres, maternidade. @jomelo.escritora. Aqui tem textos desde 2016.