Velho

Guilherme Cardoso
Jornada
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2 min readMay 30, 2017
Bench at the Lake Painting, de Chetna S.

Sento-me sobre um banco posto em meio à floresta, não sei há quanto tempo ele está lá e nem quem o colocou. Fito meu comprido reflexo nas águas calmas do pequeno córrego, que são abaladas apenas pelos peixes e aves que desafiam seus limites. Vejo apenas minha imagem espelhada, é tão parecida comigo e ao mesmo tempo tão diferente, enquanto olho-a, essa olha toda a paisagem e tudo que a cerca, esse outro eu é maior, mais velho. Mais Sábio. E enquanto pensava sobre meus fúteis futuros arrojos, aquele outro par de olhos pensava novamente no seu redor, como tudo vinha e para onde tudo iria, se é que fosse. Olhava cada folha daquela vasta mata, e sentia cada uma delas. Olhava para o céu e ouvia cada uma vida indo ou vindo, em uma canção de desdenho e medo. Ele não tinha medo, talvez porque estivesse ocupado demais vivendo a vida, aquela que ninguém mais sabia viver.
Esse velho levantou-se antes de mim, mostrando a verdadeira juventude, também nunca vista por ninguém, pegou uma das flores que beiravam seus velhos sapatos, e a cheirou. Sorriu um titânico sorriso e abaixou a flor até suas coxas, e, com a outra mão, puxou de um dos bolsos de seu casaco um velho livro de capa arruinada, prendendo a flor coletada entre as costas da capa e a primeira página. Abriu o volume em uma folha qualquer.
— Quer ouvir uma história? — Nunca mais levantei.

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Guilherme Cardoso
Jornada
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Bacharelando em linguística, kenshi, mestre de rpg e escritor amador.