Pandemia aumenta racismo contra asiáticos no mundo

População amarela sofre com violências verbais e físicas por considerarem o Covid-19 como uma “doença chinesa”

Jornal Anglo Vozes
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4 min readApr 6, 2020

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Foto: Pxhere

Por Camila Mika

Atualmente, a pandemia do coronavírus, ou Covid-19 está protagonizando a cobertura midiática do mundo. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as suspeitas e confirmações acerca de novos casos tendem a aumentar em diversos países, tais como Itália, Brasil, Estados Unidos, entre outros. No entanto, devido ao fato do Covid-19 possuir origem chinesa, casos de xenofobia e racismo contra a população amarela tornam-se cada vez mais frequentes.

No cenário brasileiro, o preconceito para com amarelos é uma realidade anterior à imigração japonesa. Por volta do ano de 1900, período em que começava a discussão sobre a vinda de japoneses ao país, o historiador e diplomata, Manuel de Oliveira Lima, não abdicou de manifestar seu descontentamento ao Ministério das Relações Exteriores. Assim, alarmou sobre o risco de brasileiros possuírem contato com “raças inferiores’’.

A imigração nipônica deu-se a partir de 1908, famílias em situação de baixa renda atracavam nos portos com o objetivo de trabalhar em lavouras cafeeiras. O desejo de ascensão social predominava diante das barreiras culturais e idiomáticas. Contudo, mesmo após o estabelecimento de japoneses no Brasil, tais eram considerados obstáculos à reforma de branqueamento.

Durante a Segunda Guerra Mundial, o cenário tornou-se hediondo. Descendentes de japoneses passaram a receber golpes racistas, previstos pelo Estado. Foram proibidos de falar a língua de origem, impedidos de imprimir jornais, e sendo obrigados a fechar escolas denominadas “gakkou’’ (escolas para descendentes nipônicos que possuem o objetivo de perpetuar os costumes e a língua japonesa). Nos Estados Unidos, nipo-americanos eram acusados de colaboracionismo e aprisionados em campos de concentração. Contudo, após a rendição japonesa, devido as medidas impostas pelos EUA, o Japão foi impossibilitado de expandir seu exército, portanto, voltou-se ao seu desenvolvimento interno. Tal desenvolvimento, atribuiu ao Japão o posto de terceira potência mundial.

Mediante ao desenvolvimento japonês, a figura do amarelo no Brasil atrelou-se ao conceito de honestidade, inteligência e educação. Deste modo, sua imagem sofreu um processo de embranquecimento, portanto, há pouco debate acerca da etnia amarela. Dessa forma, para o senso comum, o asiático se configura como uma minoria modelo, já que possui características instituídas como louváveis para a sociedade. Contudo, tal conceito de “exemplo de raça” é falacioso. Não existe essencialismo de raça, ou seja, ninguém possui comportamentos específicos por ser pertencente a uma determinada etnia. No entanto, devido a pandemia do Covid-19, a figura asiática passou a ser sinônimo de imundice, logo, não mais associada ao branco.

O repúdio atual em torno da imagem asiática leva a agressões físicas e verbais. No dia primeiro de março, uma descendente de japoneses caminhava acompanhada por seu filho de um ano, a vítima foi humilhada por um grupo de jovens que disseram “Coronavírus, volta para o seu país’’. Outro caso ocorreu no dia dezessete de março, uma jovem mestiça de mãe negra e pai amarelo levou borrifadas de álcool em ambiente de trabalho, a colega de trabalho dizia ‘’Estou com a coronavírus aqui do meu lado’’. Assim, diante da cultura asiática construiu-se uma imagem hostil, diante as falácias acerca dos costumes distintos, leva-se a crer que o amarelo perpetua hábitos grotescos. O abismo cultural entre ambas as raças trazem o conceito de barbárie emparelhado a cultura asiática.

Por conseguinte, evidencia-se que o coronavírus trata-se de um pretexto para manifestação de ideais sempre existentes, porém mascarados pela sociedade. A negação da existência da raça amarela atrelada a um preconceito intrínseco, assistem ao ato de dissimular o racismo enraizado por meio de “piadas’’ e “comentários banais’’. Tais como puxar os olhos criando deformidades ou balbuciar palavras inexistentes com o objetivo de caçoar de certo idioma.

Em 2018 o longa Crazy Rich Asians produzido por Jon M. Chu, bateu recorde de bilheteria do ano como comédia romântica. Além de um elenco majoritariamente amarelo, o loga retrata a realidade asiática num cenário contemporâneo, segundo a atriz protagonista Constance Wu: “Isso aproxima as pessoas. É um filme que representa a inclusão’’. Já o diretor Jon M. Chu, possuiu uma história controversa com a cor amarela, e portanto redigiu uma carta a banda Coldplay pedindo autorização para a utilização da música ‘’Yellow’’ em seu filme:

“Eu sei que é um pouco estranho, mas a minha vida inteira eu tive uma relação complicada com a cor amarela. De ser chamado pela palavra de maneira depreciativa ao longo do ensino fundamental, a assistir filmes onde chamavam as pessoas covardemente de amarelas, sempre teve uma conotação negativa na minha vida. Eu acredito que esta é uma situação única em que um filme de Hollywood, com um elenco inteiramente asiático que não interpreta estereótipos ou secundários, mas protagonistas românticos e cômicos. Isso dará a toda uma geração de asiático-americanos, e outros, a mesma noção de orgulho que eu tive quando ouvi sua música.’’

Portanto, conclui-se que, a pandemia do Covid-19 se da apenas como pretexto para legitimar atos racistas,os quais desde sempre estão presentes na sociedade. A ignorância atrelada ao preconceito leva a crença da superioridade racial em conjunto do repúdio a cultura asiática. No entanto, o COVID-19 não faz distinção raça, etnia, gênero, sexualidade, ou localização geográfica, todos estão sujeitos a contrair o vírus, e a disseminação do racismo para com o amarelo não fará com que a doença desapareça.

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Jornal-laboratório da eletiva Anglo Vozes do Colégio Anglo Sergipe.