O impacto do abandono americano ao Acordo de Paris

Matheus Closs
Jornalismo de Dados — UniRitter
4 min readJul 10, 2017

Ao deixar o tratado, os EUA dificultam uma possível solução global frente à mudança de clima e arriscam seu protagonismo no mercado

Foto: Gage Skidmore

“Para cumprir o meu dever solene de proteger a América e os seus cidadãos, os Estados Unidos vão se retirar do acordo climático de Paris”. Ao determinar a saída dos Estados Unidos do acordo, em discurso realizado no último dia 1 de junho, o presidente norte-americano, Donald Trump, rumou contra os interesses, não apenas da população preocupada com o futuro do planeta, mas com os próprios líderes industriais, responsáveis diretos pelo processo de mudança de clima.

O Acordo de Paris surgiu no 21° encontro da Conferência das Partes (COP21) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC na sigla em inglês), que é o tratado das Nações Unidas (ONU) responsável pela estabilização da concentração de gases do efeito estufa (GEE) na atmosfera. Selado em dezembro de 2015, contou com o apoio dos 195 Estados Partes da UNFCCC que se propuseram a manter o aquecimento global abaixo dos 2°C até 2100. É o primeiro acordo internacional em que cada país pode traçar suas próprias metas de redução de emissão de GEE, em especial do dióxido de carbono (CO2).

Embora Trump tente ignorar, as mudanças do clima são reais, e os Estados Unidos é um dos maiores protagonistas deste acontecimento. Segundo dados da Gapminder Foundation, o país é o que mais emitiu CO2 desde 1960, com mais de 240 milhões de quilotoneladas (kt). Atualmente, é o segundo maior poluidor, atrás apenas da China.

Confira os 10 maiores emissores de CO2 aqui.

Com o Acordo de Paris, os EUA havia se prontificado a reduzir 17.89% de suas emissões de CO2. Essa redução levaria o nível de emissões de aproximadamente 5,3 milhões de kt, registradas em 2011, para cerca de 3,8 milhões de kt até 2100. O acordo também previa que os EUA, junto com China e Índia, totalizariam 42% do total de redução de emissões, o que daria um largo protagonismo a estes países no caminho de uma economia limpa e sustentável para o planeta. De acordo com a média anual de emissão de CO2, ao deixar de lado o acordo, os Estados Unidos em 2060 já teria ultrapassado a China em emissões do gás. Seriam 7,7 milhões de kt no ano.

Trump já deixava claro que não trataria os problemas climáticos e ambientais como prioridade em seu governo ao nomear Scott Pruitt como diretor da Agência de Proteção Ambiental (EPA, em inglês), órgão que possui forte atuação em controle e pesquisa de emissões. Pruitt, antes procurador-geral do estado de Oklahoma, foi responsável por iniciar 14 processos contra a EPA, principalmente pelos planos de redução climática e energia limpa do ex-presidente Barack Obama.

O presidente norte-americano bate o pé para defender as indústrias mais poluidoras — como a de carvão e petróleo — e a geração de empregos. Entretanto, a decisão pode ser muito desfavorável do ponto de vista de mercado, afinal, os EUA estariam fechando as portas para empresas deste mercado emergente, como analisa o ex-secretário do Tesouro e Estado dos Presidentes Richard Nixon e Ronald Reagan, George Schultz, em artigo no The New York Times. “Se a América não honrar um acordo global que ajudou a construir, as repercussões vão comprometer as nossas prioridades diplomáticas em todo o mundo”, observa. Não é preciso fugir da lógica para saber que o crescimento de um novo setor no mercado americano, como o da indústria de energia limpas, aumentaria a competitividade frente ao mercado externo e atrairia investimentos, consequentemente, gerando empregos. Com tal postura, os EUA oferecem o domínio deste mercado em evolução à China.

Mesmo os estados republicanos possuem maioria favorável ao Acordo de Paris (Yale University)

Ao rejeitar o protagonismo americano no caminho do bem-estar climático no planeta, Trump ignora a posição da grande maioria de executivos das principais empresas do país, como a Exxon Mobil e Shell, favoráveis ao acordo. Além disso, segundo pesquisa realizada pela Climate Change Communication da Universidade de Yale, a maioria da população dentro dos 50 estados americanos é a favor do Acordo de Paris.

Trump exime-se de um dos maiores desafios do século ao fazer os EUA ignorar o clima, ainda que tenha assumido a presidência com o seu inflamado discurso de tornar a América grande novamente. Difícil fazê-lo ignorando tendências globais e a boa diplomacia.

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