Consolidação e disrupção do jornalismo móvel em 2017

Smartwatches e inteligência artificial estão no horizonte dos pesquisadores de mobile

5 min readDec 6, 2016

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Ao longo dos anos tentando entender como as tecnologias nascem, atingem seu pico e eventualmente morrem ou se transformam, fica claro que a camada cultural que envolve o uso e a apropriação é o ponto decisivo. Evidentemente, temos ainda diversos fatores de maturação de determinada técnica ou mesmo de componentes mercadológicos e legais, mas a real aceitação e incorporação no cotidiano é uma decisão dos usuários.

Não precisamos nos apoiar nos números de institutos de pesquisa para constatar a velocidade com que a internet móvel foi absorvida por milhares de pessoas. Trata-se de uma revolução perceptível nas ruas e no cotidiano. Aliás, a mobilidade trouxe a internet para as ruas e mudou o imaginário das pessoas sobre o que é a rede e como ela pode impactar diretamente as rotinas individuais e coletivas.

Mas, no título deste texto temos a consolidação e a disrupção como tônica desta discussão em relação ao que está por vir em 2017 e além. Como consolidação deste modelo em expansão, temos canais como WhatsApp, Snapchat, Instagram ou Facebook, cada vez mais usados para o jornalismo aqui no Brasil e globalmente. Embora estas redes não tenham nascido para manter os seus usuários informados, as redações estão se adaptando para entender como chegar em seus leitores nesses que são agora o principal espaço de atenção. Este é o ponto em que já se começa a entrar na questão da disrupção, pois são rotinas, tempos de produção, linguagens e até mesmo profissionais com outras formações que desafiam os editores e executivos a reinventarem os seus modelos.

A mobilidade trouxe uma conexão always-on, como explorei na minha tese de doutorado, de 2005, em que não é mais preciso convencer o leitor, ouvinte ou espectador a comprar o jornal, ligar o rádio ou a TV. Ele está 100% do tempo em estado de potencial consumo e produção de informação, o que torna o desafio de comunicação ainda mais complexo.

No Ubilab, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, estamos permanentemente tentando monitorar as fases do jornalismo móvel. Na nossa última compilação, apresentada no 3º Congresso de Jornalismo para Dispositivos Móveis da Universidade da Beira Interior, em Portugal, constatamos sete novas fases:

Fase 1: SMS
Fase 2: WAP
Fase 3: Web Móvel
Fase 4: iPhone e Web Apps
Fase 5: Notificações móveis e Apps
Fase 6: Wearables
Fase 7: Inteligência artificial e assistentes pessoais

Enquanto as fases de 1 até 5 mostram uma evolução do meio, as fases 6 e 7 podem significar novos caminhos de expansão da mobilidade. Os wearables, ou computação para vestir, embora estejam sendo desenvolvidos desde a década de 1990, começaram a chamar mais a atenção do público com o Google Glass. Embora fosse um experimento em protótipo público da empresa, muitos produtores de conteúdo, como New York Times, CNN, The Guardian ou BBC desenvolveram formas de visualizar e transmitir conteúdos usando o device. Por aqui, o Ubilab desenvolveu protótipos para o jornal Zero Hora que não saíram do laboratório. O uso social do Glass ficou um pouco incerto pela inicial sensação de quebra de códigos tácitos de privacidade. Possivelmente, ele deve voltar em outras formas, assim como a tentativa que recentemente o Snapchat fez com óculos que capturam pequenos vídeos para compartilhar em sua rede.

O segmento deste mercado que talvez tenha avançado mais claramente é o dos smartwatches. Estes relógios que são conectados ao smartphone já possuem muitos aplicativos de notícias e serviços. No Ubilab, constatamos que o fato de os smartwatches serem o primeiro contato da pessoa quando recebe uma mensagem push pode significar que esta será a tela em que o leitor receberá um breaking news primeiro. Isso intensifica e amplifica o conceito de always-on.

Uma outra categoria de devices que temos explorado para o jornalismo é a internet das coisas, ou Internet of Things (IoT), que tem se expandido progressivamente pelo barateamento de componentes eletrônicos. Até este momento, o maior uso destes aparelhos está ligado a serviços ou segurança, mas como são objetos conectados, imaginamos uma ligação natural com o jornalismo. Vislumbramos um ambiente doméstico ou profissional em que a cor de alguns objetos possa informar algo, como a previsão do tempo ou um bloqueio das ruas em torno do lugar. Já estamos em fase de prototipação deste experimento e já especulamos diversos usos para diferentes públicos.

Na fase 7 da nossa classificação, inteligência artificial e assistentes pessoais, temos um tópico que é, ao mesmo tempo, a evolução natural da informação móvel e a solução para o problema da superconexão. Com a quantidade de conteúdos e conexões que possuímos hoje, a questão é como vamos conseguir relacionar essas informações para dar sentido ao nível de conectividade que alcançamos. Tanto Google como Apple, em seus últimos sistemas operacionais e em suas últimas aquisições de startups, deixam claro que a antecipação da informação por algoritmos de inteligência artificial estarão no foco de investimentos dos próximos anos. Isso tem um potencial de disrupção com todo o nosso modo de utilização desta tecnologia e da relação que vamos ter com a nossa informação pessoal.

O ponto é que o jornalismo móvel não é somente mais uma tela ou canal pelo qual a nossa audiência vai interagir com as notícias. Quando olhamos para a sua evolução e as potencialidades futuras, percebe-se que estamos na base das transformações do conceito de internet. Talvez no início da década de 1990, a internet fosse percebida de uma forma distante da vida cotidiana. Hoje isto mudou e ainda provocará mais alterações no jornalismo de forma global.

Este texto faz parte da série O Jornalismo no Brasil em 2017. A opinião dos autores não necessariamente representa a opinião da Abraji ou do Farol Jornalismo.

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