Alvorada: uma cidade dormitório

Leticia Szczesny
Jornalismo Econômico UniRitter Fapa
5 min readOct 6, 2017

Por Leticia Szczesny e Vinicius Moura

O termo cidade dormitório costuma ser utilizado para se referir a municípios que apresentam baixo desenvolvimento econômico e social, precárias condições de assentamento de vida para população e nítida dependência econômica de um polo regional. Essa definição apresentada no artigo “O estigma de morar longe da cidade: repensando o consenso sobre as ‘cidades-dormitório’ no Brasil”, de Ricardo Ojima, Eduardo Marandola, Rafael Henrique, Moraes Pereira e Robson Bonifácil, exemplifica o que ocorre diariamente em algumas cidades do Rio Grande do Sul.

De acordo com dados do estudo “Arranjos populacionais e Concentrações Urbanas do Brasil”, disponibilizados em 2016, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 195. 673 habitantes de Alvorada (RS), cerca de 55. 760 se deslocam diariamente para Porto Alegre (RS). Sendo assim, 28 % da população alvoradense percorre aproximadamente 21 km para trabalhar e/ou estudar na capital.

Alvorada é um dos municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre que apresenta as maiores taxas de mobilidade da população, segundo o estudo “Movimento pendular da população na Região Sul”, realizado em 2009 pelo grupo de pesquisa e planejamento urbano e social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O documento baseado no Censo Demográfico de 2000, mostra que 3.864 pessoas se deslocaram de Alvorada para Porto Alegre, em 1995. Ou seja, comparado aos dados atuais, esse número vem crescendo cada vez mais.

Taxa de mobilidade pendular por AEDS da Região Metropolitana de Porto Alegre — 2000 / Imagem ilustrativa retirada do estudo “Movimento Pendular da população na Região Sul”

Por que trabalhar em outra cidade?

A economia é um dos vários fatores pelos quais as pessoas saem de suas cidades para trabalhar em outros municípios. De acordo com dados do IBGE DE 2015, o salário médio mensal dos trabalhadores de Alvorada é de 2,5 salários mínimos. Já quem trabalha em Porto Alegre, recebe 4,2 salários mínimos. Pode-se dizer que como a renda é maior na capital, as pessoas optam por se deslocar, por mais que tenham gastos com transporte.

Outra questão que ocasiona o movimento pendular entre as cidades é a falta de emprego. Quando a população não encontra vagas para trabalhar na região onde mora, vai em busca de outros lugares que lhes ofereçam o que procuram. Porém, de acordo com dados divulgados em agosto deste ano pela Fundação de Economia e Estatística (Fee), Fundação Gaúcha do Trabalhador e Ação Social (FGTAS) e Departamento Intersindical de estatística e estudos socioeconômicos (Dieese), o aumento dos pontos de trabalho levou à queda da taxa de desemprego na Região Metropolitana de Porto Alegre. A taxa fechou o mês de agosto em 10,4%, em comparação aos 11% apurados em junho.

A capital desempenha um papel importante na rede urbana brasileira, especialmente como centro de gestão econômica e territorial e de serviços para a Região Sul do Brasil, de acordo com o livro “Porto Alegre: transformações na ordem urbana”, publicado em 2015 pelo Observatório de Metrópoles. Mesmo com o desenvolvimento econômico nos outros municípios, a capital continua polo, onde as pessoas buscam empregos, quando os mesmos não são bem remunerados nas cidades onde residem.

Segundo o estudo “Conjuntura Urbana — como anda Porto Alegre” de 2009, realizado pelo Observatório das Metrópoles, o eixo rico da Região Metropolitana de Porto Alegre se concentra ao norte. Ao sul ficam as maiores concentrações de pobreza. Alvorada pertence ao leste onde existem poucas cidades com níveis baixos ou muito baixos de altos rendimentos. O município tem 31,9% da sua população nessa situação. Apresentam as mesmas condições Viamão, Canoas, Nova Santa Rita e Cachoeirinha. Porém, mesmo com a baixa renda, Alvorada possui altos níveis de empregos formais, que se concentram na região central da cidade.

Transporte

De acordo com um levantamento feito pela Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional (Metroplan) os tempos ou a duração das viagens médias para os transportes coletivos estão em torno de 30 minutos. Os valores são compreensivelmente mais baixos para Porto Alegre (cerca de 28 minutos) — onde há altas densidades de habitações e postos de trabalho com um bom atendimento por ônibus e lotações — e mais altos na Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA) sem o polo, em consequência das expressivas distâncias nos deslocamentos de pessoas de municípios periféricos, que necessitam chegar aos polos de empregos e serviços percorrendo trajetos maiores. Já em relação aos transportes individuais (por automóvel), os tempos fora de Porto Alegre são menores, acusando uma preponderância de movimentos locais em menores distâncias.

Porto Alegre é o município com maior taxa de entrada de pessoas do Rio Grande do Sul, conforme o Censo de 2003. No ano da realização do censo foram totalizadas 213.408 entradas. Nenhuma outra cidade do Estado chegou perto desses números. Porém, Porto Alegre, também foi a cidade que registrou o maior número de saídas, foram 24.017. Somente Novo Hamburgo se aproximou desse total, com 12.496.

Intensidade dos deslocamentos para trabalho e estudo na Concentração Urbana de Porto Alegre/RS / IBGE, Censo Demográfico 2010

Fazendo história

Alvorada e outros municípios da região metropolitana desempenharam, historicamente, funções de cidades dormitório no contexto metropolitano, somando 20,21% da população total (751.590 habitantes), segundo o Censo Demográfico de 2002 realizado pelo IBGE. Paralelamente à ocupação do espaço metropolitano pela função residencial, em meados dos anos 1970, implantaram-se dois importantes distritos industriais nos municípios de Cachoeirinha e Gravataí. Esse processo de instalação de indústrias permitiu uma melhoria na rede viária e de infra-estrutura e equipamentos, além da implantação de conjuntos habitacionais e parcelamentos de glebas rurais e de loteamentos, provocando a densificação desse eixo. Portanto, de acordo com o IBGE, 81,87% da população estão nos dois eixos, restando apenas 18,13% aos demais municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre.

Deve ser ponderado que tanto as características de dormitório de algumas cidades como a sua pouca oferta de postos de trabalho e proximidade territorial com Porto Alegre contribuem para esses percentuais elevados. Isso fica evidenciado ao se constatar que os percentuais de menor valor correspondem a municípios mais distantes do polo e com maior autonomia urbana, tais como Campo Bom, Dois Irmãos, Ivoti, Nova Hartz, Parobé, Portão, Sapiranga e Taquara.

O artigo publicado pela revista online Scielo, “Mobilidade populacional na região metropolitana de Porto Alegre nos anos 90”, mostra que com o passar dos anos, Alvorada e Viamão expandiram-se como continuidade das áreas periféricas de Porto Alegre. Embora algumas mudanças estejam se verificando nessas localidades — como a instalação de indústrias e o incremento da moradia de camadas médias — elas ainda se mantêm como “dormitório”, característica que se confirma no estudo dos fluxos pendulares.

Fontes consultadas:

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