O Cavalo Crioulo além do status

A influência da Raça Crioula na economia do Rio Grande do Sul

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Ginete executando uma das provas infantis de Cavalos Crioulos da Expointer — FOTO: Desirée Ferreira da Cunha

Por: Desirée Ferreira, Gabriel Alves e Tainá Fontella

Na Expointer do ano de 2017 foram aproximadamente 500 Cavalos Crioulos inscritos para exposição, e o leilão da raça representou cerca de 89% do total de vendas de animais expostos no parque. Aproximadamente R$ 8 milhões foram arrecadados nos leilões de animais, e esses números são avaliados com otimismo pela Associação Brasileira de Criadores de Cavalos Crioulos (ABCCC), pois, embora o número de vendas, comparado ao ano de 2016, tenha decrescido, a liquidez, neste ano, foi maior, ou seja, o que foi exposto foi vendido.

Foi mantida a meta de dominar o volume de vendas na exposição, e com isso, a Raça Crioula, por ser de extrema importância e ter a maior manada de todo o país no RS, acaba sendo um grande colaborador da economia gaúcha, inclusive gerando empregos.

A esquerda, o Vice Presidente de eventos, Eduardo Azevedo e a direita, o assessor da ABCCC, Nestor Tipa Júnior — FOTO: Desirée Ferreira da Cunha

ABCCC: preservando e difundindo o Cavalo Crioulo

A Associação Brasileira dos Criadores de Cavalos Crioulos teve como representante o Vice Presidente de eventos, Eduardo Azevedo, que tratou da importância de a raça trazer empregos diretos e indiretos para o país e principalmente de ser uma raça de muito prestígio para o Rio Grande do Sul. Segundo dados da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ), em 2012 foram 240 mil empregos, com movimentação anual de R$1,28 bilhão na cadeia produtiva.

Por trás de cada cavalo crioulo existem setores como a mão de obra, funcionários, transporte, veterinários e lojas que fazem parte de todo o processo de criação da raça, consequentemente se têm muitos benefícios para a geração de empregos.

O Vice Presidente reforça que “onde se tem um cavalo, há um emprego por trás” e que o RS é o estado que se encontra a maior manada de todo o país, logo sendo um grande colaborador da economia gaúcha. Na Expointer deste ano, foram 500 cavalos inscritos para exposição e mesmo com a turbulência do país, mas dentro da média dos setores, continuou crescendo com liquidez nos leilões da raça, fechando em 2016 na casa dos 100 milhões de vendas e para 2017 as expectativas são de um maior crescimento.

Criador de Cavalos Crioulos, Marcelo Rezende — FOTO: Desirée Ferreira da Cunha

O profissionalismo dos bastidores

O criador de Cavalos Crioulos, Marcelo Rezende, pertence a Cabanha Cala Bassa, que já faz parte do ramo há 70 anos. Seu avô a criou em 1937 e hoje toda a geração segue as tradições da família e do Estado. Marcelo afirma que o Crioulo é responsável por 80% do faturamento de animais na Expointer, e que o principal desafio é manter a ascensão da raça e conquistar novos mercados.

O criador explica que hoje existem diversas modalidades pela qual a raça pode competir e entre elas estão a Morfológica, a Paleteada, o Freio de Ouro e o Laço. Na Morfológica, é possível competir com o animal a partir dos seis aos dez meses. Funcionalmente, é necessário aguardar até a idade da doma, aos dois anos. A partir daí, o cavalo já está pronto para competir em outras áreas.

Sobre qual é o maior custo para manter um animal desse porte, Marcelo é direto: a criação. Isso inclui alimentação, veterinário, moradia e manutenção de modo geral. A rentabilidade se dá por conta de leilões e venda de coberturas, embriões e indivíduos. Quando se fala em manutenção, a figura principal é o tratador, já que é ele quem acompanha a rotina do animal de forma mais direta. É isso que o Douglas Teixeira, de 23 anos, faz há um ano e meio trabalhando na Cabanha Cala Bassa.

Douglas desde pequeno “se criou no lombo do cavalo” e com isso acabou descobrindo sua maior paixão. Ele é o responsável por cuidar da alimentação e por garantir que o animal tenha todo o conforto necessário. Toda sua renda vem do trabalho com os equinos, o que ele realmente gosta de fazer, “é importante ter dedicação e gostar do que se faz”, finaliza.

Criadora de Cavalos Crioulos, Mariana Franco — FOTO: Desirée Ferreira da Cunha

A criadora Mariana Franco está há 25 anos no ramo e sua história se cruzou com a dos Cavalos Crioulos logo no seu nascimento. Mariana é herdeira de Flávio Bastos Tellechea, fundador da marca equina BT em parceria com seu irmão, Roberto Bastos Tellechea. A marca tornou-se um referencial em raça Crioula no Brasil e no exterior, sendo dona de 33 Freios — entre Ouro, Prata e Bronze — além de 51 prêmios em exposições morfológicas de Esteio. Também são ganhadores de cinco grandes campeonatos consecutivos no prêmio Martim Rossel.

Proprietária da Cabanha Basca, a criadora garante que o cavalo crioulo é a sua principal fonte de renda, realizando três leilões por ano. Sendo assim, torna-se um negócio sustentável e lucrativo. Porém, os gastos para o treinamento de um cavalo crioulo para competições, não são poucos e ressalta: “um cavalo para treinar para o Freio de Ouro deve custar em torno de dois mil reais por mês, mais inscrição e transporte. Só o treinamento deve custar isso aí, e nenhum cavalo treina menos que um ano. Um cavalo não gasta menos que 35 mil reais.”

Quem também pertence a Cabanha Basca e acompanha de perto todo o treinamento do cavalo até a sua competição, é o tratador Anderson Amaral, de 27 anos. A paixão pelos crioulos vem de família, e o tratador garante não pensar em seguir outro caminho.

A prova mais esperada da Raça Crioula: O Freio de Ouro

O Freio de Ouro é uma competição anual para cavalos da raça Crioula, onde são comprovadas as habilidades do cavalo e do ginete. A competição é dividida em sete provas, quem obtiver melhor pontuação na soma das etapas é o grande campeão. Na primeira fase é feito o estudo morfológico do animal, e logo depois o julgamento funcional feito a partir das provas de andadura, figura, voltas sobre pata e esbarrada, mangueira, campo e bayard/sarmento (disputada na última fase).

A disputa teve origem na cidade de Jaguarão, em 1977, quando as exposições eram somente morfológicas, mas preocupados com a funcionalidade do Crioulo, alguns criadores do município organizaram a 1ª Exposição Funcional. Em 1982, tendo destaque e atraindo a atenção da ABCCC, o então presidente, Gilberto Azambuja Centeno oficializou a prova campeira que seria realizada durante a Expointer, passando a se chamar Freio de Ouro, e a dividindo em etapas classificatórias por região.

Proprietário da Cabanha Positivo, Jonas de Souza — FOTO: Desirée Ferreira da Cunha

Na edição de 2017 entre os machos, o grande campeão foi o cavalo PN Cambiasso, da Cabanha Positivo, de Portão. Jonas de Souza, proprietário da Cabanha, ressaltou o curto prazo em que o animal levou para atingir o ponto máximo de competição. “Na verdade, a gente já cria cavalos há 15 anos. Mas nós tivemos o auge de começar a correr provas do freio de ouro recentemente, um pouco diferente do que os demais criadores e participantes fazem. Nós temos apenas três anos de participação no freio de ouro e já chegamos ao ponto máximo, isso é um reconhecimento muito rápido”. Entre as fêmeas, o título ficou com a Capanegra Quinta Sinfonia, das cabanhas Capanegra, de Dom Pedrito e Gameleira, de Goiânia.

O resultado já era esperado por parte de Jonas após ter perdido por detalhes no ano passado, ficando em quarto lugar. Com isso, veio para a competição deste ano com confiança em seu animal e convicção que poderia vencer.

“O cavalo sempre foi muito competitivo, no ano passado ele vinha em segundo até o último dia de provas e daí a partir de uma prova que deu errado ele acabou caindo para o quarto lugar. Claro que quando tu participas tu tens expectativas de que tu podes chegar, eu sei da capacidade do ginete e do animal, porém como ele tem a menor nota morfológica até hoje no freio de ouro, então ele teria que fazer muitas provas e não poderia dar nada de errado, e foi o que aconteceu, deu tudo certo”.

A partir desta edição do Freio de Ouro, a ABCCC instituiu também o prêmio Craque Funcional, que premia os animais que chegam até a final e possuem a melhor média funcional do ciclo. Até então, o melhor animal nesse quesito não era premiado oficialmente. Na categoria fêmea ficou com a Capanegra Quinta Sinfonia e na categoria macho, o título foi para PN Cambiasso.

Proprietário da Cabanha Positivo, Jonas de Souza, junto do ginete campeão do Freio de Ouro 2017 entre os machos, Adriano Comunello — FOTO: Desirée Ferreira da Cunha

Surgimento e destaque da raça

Em meados de 1901, a cultura de feiras agropecuárias nascia no Estado do Rio Grande do Sul. Denominada de Exposição Estadual, sua primeira edição ocorreu em 24 de fevereiro, nos pavilhões fechados do Campo da Redenção (atual área do Parque Farroupilha) e do campus central da UFRGS, em Porto Alegre. Nesta ocasião foram apresentados bovinos, equinos, suínos, produtos agrícolas e industriais e artesanatos. Com 2.200 expositores e um público de 67 mil pessoas era gerado o embrião do que 71 anos depois se tornaria a Expointer.

Dentre os equinos que se destacam na feira, está o Cavalo Crioulo. Nascido da origem dos Andaluz e Jacas espanhóis, esses animais passaram por muitas adversidades e desenvolveram duas das suas características mais marcantes: a rusticidade e a resistência. Sendo assim, no século XIX, os fazendeiros do Sul do continente começaram a tomar consciência da importância e da qualidade dos cavalos que vagavam por suas terras.

Esta nova raça passou a ser preservada e a ganhar notoriedade a partir do século XX, quando a seleção técnica exaltou o seu valor e comprovou as suas virtudes. Em 1932, teve origem a Associação Brasileira dos Criadores de Cavalos Crioulos, com a missão de preservar e difundir a raça no país. Cinquenta anos depois, a prova Freio de Ouro veio para ficar, tornando-se uma importante ferramenta de seleção, uma vez que otimizou a raça tanto morfológica como funcionalmente.

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