Taxa de HIV em Porto Alegre é a maior do Brasil

Estado gaúcho só fica atrás do Amazonas em casos notificados da doença

Por: Cristine Fogliati, Daiana Camillo e Larissa Zarpelon

De tudo que Porto Alegre poderia estar em 1º lugar no quesito saúde pública, a Capital dos gaúchos lidera um ranking preocupante: o de pessoas infectadas pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV). A taxa de doentes no município tem uma diferença discrepante para o resto do Brasil: segundo dados do Datasus, a taxa de detecção do vírus era reagente para 34,7 pessoas a cada 100 mil habitantes em 2016. No Brasil, esse número é de 19,1 na mesma perspectiva.

Segundo tabela do DATASUS, Porto Alegre contabilizou 16.221 mil internações de janeiro de 2015 até março de 2016. Já os valores gastos nos serviços hospitalares foram de R$ 29.179.399,65. E os valores totais somam R$ 35.644.689,96 nos mesmos meses e anos. O valor médio gasto com cada paciente é de R$ 2.197,44. Enquanto a média dos dias de permanência no hospital é de 125 dias.

AIDS, sigla em inglês para a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Acquired Immunodeficiency Syndrome), é uma doença do sistema imunológico humano resultante da infecção pelo vírus HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana). O HIV é um retrovírus que infecta e se replica nos macrófagos e linfócitos humanos que são as células de defesa, que formam o tecido linfoide e fazem parte dos glóbulos brancos, resultando no enfraquecimento do sistema imunológico do corpo com o organismo mais vulnerável ao aparecimento de doenças que vão de um simples resfriado a infecções mais graves como tuberculose ou câncer.

A infecção pelo HIV tipo 1 pode ter vasto aspecto clínico, desde a fase aguda até a fase mais avançada da doença. Entre os indivíduos não tratados, estima-se que o tempo entre o contágio e o aparecimento da doença esteja em torno de dez anos. A infecção aguda é definida como o período que vai das primeiras semanas do HIV até o aparecimento dos anticorpos anti-HIV (soro conversão). Nessa fase, pode aparecer um conjunto de manifestações clínicas, podendo apresentar o que se denomina de Síndrome Retroviral Aguda (SRA).

Apesar dos avanços significativos conquistados nos últimos anos com a terapia antirretroviral, as estatísticas confundem os especialistas e levanta um debate sobre o combate à doença. Ainda motivo de preconceito, ela deixa o paciente em uma situação difícil. Muitas vezes o portador se isola, sai do emprego e sem dinheiro, conta com o Sistema Único de Saúde (SUS) para receber os seus remédios. Conforme artigo sobre a qualidade de vida dos portadores de AIDS de 2011, os que trabalhavam, apresentavam melhores índices em qualidade de vida. Porém em Porto Alegre, a situação se agrava em relação a outras cidades do País.

Internações por HIV nos hospitais de Porto Alegre crescem a cada ano

Entre os hospitais da Capital que atendem o SUS, o que concentra o maior número de internações é o Hospital Nossa Senhora da Conceição, com 3.271 pacientes. O Hospital de Clínicas aparece em segundo na lista com 3.057. O Hospital Santa Casa da Misericórdia está em terceiro lugar no ranking, com 2.419 internações. Já o Hospital São Lucas da PUC registra 1.616 pessoas. A Associação Hospitalar Vila Nova tem 1.285 casos registrados. O Hospital Cristo Redentor, 834, o Hospital Fêmina, 828 e o Hospital Beneficência Portuguesa, 127. O Hospital Divina Providência não apresenta pacientes com AIDS. Conforme o artigo de 2015 sobre a AIDS no Rio Grande do Sul, no período de 2000 a 2011, foi registrado 16.804 óbitos no Rio Grande do Sul. Dentre as mortes, 5.765 foram em Porto Alegre, correspondendo a 35,8%.

Os desafios na contenção do HIV/AIDS, segundo o site da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (Ufcspa) está em saber a razão por trás das estatísticas gaúchas da doença serem muito superiores à média nacional. Segundo os docentes da faculdade, duas palavras podem resumir as medidas necessárias para fazer um avanço à doença: prevenção e diagnóstico. Em relação à primeira, falta consistência de certas campanhas promovidas pelo poder público. E em relação ao diagnóstico, ainda existe um número reduzido de pessoas que realizam o teste, que é a porta de entrada para a rede de atendimento.

De acordo com o portal do Governo Federal sobre a AIDS, o medicamento dolutegravir para o tratamento de HIV passa a fazer parte da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) em 2017, do Sistema Único de Saúde (SUS). Desde janeiro deste ano, o medicamento é oferecido aos pacientes que desenvolveram resistência aos medicamentos anteriores e também as pessoas que estão em fase inicial de tratamento antirretroviral pela primeira vez. O efeito é considerado mais eficaz e com menos efeitos colaterais. A implantação deste novo tratamento coloca o Brasil na posição de protagonista da resposta global ao HIV/AIDS. Por outro lado, entre os medicamentos para o HIV, foram excluídos o Fosamprenavir 700mg e as Didanosinas Entéricas de 250mg e 400mg em razão de substituição por outros antirretrovirais com melhor eficácia e comodidade para o paciente.

Grupo de Apoio à Prevenção da Aids é fechado em Porto Alegre

Referência no Estado e no País, o Grupo de Apoio à Prevenção da Aids (Gapa) foi fechado em agosto de 2017. O Governo do RS, responsável pelo pagamento do aluguel do local, ficou cerca de oito anos sem realizar a quitação, culminando na ordem de despejo do grupo. O local luta agora para recuperar seus documentos e colocá-los em um depósito até uma definição de sua nova sede. A Prefeitura de Porto Alegre é a responsável por ceder o prédio, mas ainda não tem previsão de quando isso ocorrerá.

Porto Alegre é a cidade brasileira com mais casos de HIV/AIDS registrados no Brasil, segundo o Boletim Epidemiológico da Secretaria do Estado do Rio Grande do Sul. Ainda segundo este documento, a média nacional de detecção é de 19,7 pessoas a cada 100 mil habitantes, mas, na capital do Estado a taxa é de 94,2 pessoas. Os homens foram os mais atingidos em 2016. Os casos notificados do vírus HIV no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) chegaram a 887 no sexo masculino e 548 no sexo feminino. A faixa etária mais atingida foi dos 20 aos 24 anos, com 217 notificações. E na escolaridade, pessoas entre a 5ª e a 8ª série do Ensino Fundamental são as mais atingidas, com 293 casos. Os dados captados pelo Sinan entre 2007 e 2016, mostram que a população branca é a mais atingida pelo HIV. Foram 9.154 casos no total, representando 66,1% do total. As pessoas negras, ficaram em segundo lugar com 1.834, 13,2% do total de casos notificados.

Um dado preocupante, é a tendência crescente ao aumento da taxa do vírus em jovens. De 1980 a 2011, ocorreram 12.891 casos na faixa-etária entre 13 e 19 anos. A taxa de mortalidade em Porto Alegre, embora tenha apresentado uma queda entre 2010 e 2015, ainda é superior ao resto do Estado. O SUS ainda segue buscando alternativas para lutar contra o aumento das taxas em Porto Alegre, que segundo um estudo realizado em 2016 pela estudante Maíra Rossetto para obtenção do título de doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), entre 2009 e 2013, as regiões onde mais houve notificações, internações e mortalidade pela doença na Capital foram os bairros Partenon e Lomba do Pinheiro, ambos na zona Leste de Porto Alegre.

Segundo um estudo publicado em 2016, os fatores baixa escolaridade, idade avançada e serviço de saúde foram preditores significativos para o óbito de pacientes infectados pelo HIV. Embora haja diversos casos da doença na cidade, ainda sim as políticas públicas na área da saúde para o combate e a prevenção ainda são escassas. Ações como testes rápidos para identificar o HIV e distribuição de preservativos ocorrem ocasionalmente em Porto Alegre. Mas sendo a cidade com maior percentual de infectados, esse tipo de serviço deveria ser mais amplamente divulgado e organizado.

Fontes consultadas:

Boletim Epidemiológico HIV/AIDS 2016

http://www.saude.rs.gov.br/upload/arquivos/carga20170416/27141658-boletim-epidemiologico-rs-hiv-aids-2017-compressed.pdf

Os novos desafios da AIDS

https://www.ufcspa.edu.br/index.php/sala-de-pautas/2051-os-novos-desafios-da-aids

Tendência da mortalidade por aids segundo características sociodemográficas no Rio Grande do Sul e em Porto Alegre: 2000–2011

http://www.scielo.br/pdf/ress/v25n3/2237-9622-ress-25-03-00477.pdf

Datasus — Índices de HIV

http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sih/cnv/nirs.def

Estudo epidemiológico sobre coinfecção TB/HIV/AIDS e fatores de risco para internação e mortalidade em Porto Alegre, no RS

http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/141045/000990702.pdf?sequence=1

Qualidade de vida de portadores de HIV/AIDS e sua relação com linfócitos CD4+, carga viral e tempo de diagnóstico

http://www.scielosp.org/pdf/rbepid/v15n1/07.pdf

Caracterização dos fatores preditores de mortalidade relacionada à Aids em Porto Alegre

https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/148847/001002019.pdf?sequence=1

Vivências do adolescente com HIV/AIDS*

http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/917

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Cristine Fogliati
Jornalismo Econômico UniRitter Fapa

Jornalista. Contadora de histórias. Fotógrafa nas horas vagas. Instagram: @cfogliati