A luta ainda não acabou

Laura Lima
Jornalismo não é  crime
4 min readNov 21, 2018

Tudo aconteceu por volta das 4h30, hora local. Um esquadrão antiterror da polícia turca invade a residência da família Çorlu. A mulher estava com seu filho de dois anos e meio. Seu marido havia sido preso em Ancara, no dia 5 de abril daquele mesmo ano. Ela foi espancada e levada de seu filho, Serkan.

Meşale Tolu Çorlu

Era maio de 2017 em Kartal, na província de Istambul. A mulher era Mesale Tolu, jornalista alemã. Três anos antes, ela e seu marido, Suat Çorlu, haviam se mudado para a Turquia. Ela trabalhava como repórter e tradutora na agência de notícias “Etkin Haber Ajansı” (ETHA), considerada de esquerda.

A Turquia ocupa a posição 157 no Ranking Mundial de Liberdade de Imprensa 2018, segundo publicação da ONG Repórteres Sem Fronteira. Considerada a maior prisão do mundo para profissionais de comunicação, ser mulher e jornalista é uma dupla opressão.

Mesale Tolu, nasceu em Ulm na Alemanha, no ano de 1984. Nesse mesmo ranking, o país ocupa a 15ª posição. Mas Mesale sempre teve “um pé” no país oriental. Seus avós eram turcos. Ela foi criada por sua avó depois que sua mãe morreu em um acidente de carro durante uma viagem de férias para a Turquia em 1990.

Tolu estudou Ética e Língua Espanhola na Universidade Goethe de Frankfurt. Em 2014, ela trabalhou por um curto período na estação de rádio Özgür Radio (fechada em 2015 por decreto de emergência). Em 2014, após dar à luz ao seu filho, Serkan ela foi para a Turquia.

A prisão

A jornalista foi detida na Prisão Feminina Bakırköy, em 06 de maio. Ela foi encarcerada com mais 24 internos. Após sua prisão, sua residência foi revistada e devastada. Ela entregou o filho aos cuidados de um vizinho quando foi levada pela polícia. Seu irmão, Hüseyin, foi no mesmo dia a Istambul para cuidar da criança. Depois de duas semanas, seu filho foi viver com ela.

Ela foi presa por supostamente produzir “propaganda terrorista”, enquanto trabalhava para a agência de notícias Etkin Haber Ajansi (ETHA). Ela também foi acusada de ser “membro de uma organização terrorista” — o Partido Comunista Marxista-Leninista (MLKP), proibido na Turquia.

O primeiro julgamento ocorreu no dia 09 de outubro, em Silivri, Istambul, na qual 18 suspeitos estiveram envolvidos, inclusive seu marido. Ela rejeitou todas as alegações e reclamou de sua detenção.

Em meados de dezembro de 2017, após 8 meses, o tribunal decidiu libertá-la da prisão. No entanto, ela não foi autorizada a deixar o país e foi obrigada a se apresentar às autoridades todas as segundas-feiras. Seu marido, Suat Corlu, que junto a outros 16 acusados enfrenta acusações semelhantes, ainda tem que permanecer na Turquia.

Em agosto deste ano, ela foi “liberada” para voltar à Alemanha. Sua audiência de decisão estava marcada para o dia 16 de outubro, de acordo com seu pai, Ali Riza Tolu.

Em seu Twitter, ela publicava mensagens de solidariedade a outros jornalistas presos, além de campanhas para ajudar na sua própria libertação

Em coletiva de imprensa, após seu retorno, em agosto, Tolu disse que tinha sentimentos mistos sobre o retorno à Alemanha, porque centenas de repórteres, oposicionistas, advogados e estudantes ainda estão presos na Turquia.

“É por isso que não estou muito feliz em partir, porque sei que nada mudou no país onde fui presa”, disse Tolu. Ela acrescentou que continuará lutando por pessoas que foram presas na Turquia por motivos políticos.

Ela também pediu à chanceler federal alemã, Angela Merkel, e ao ministro alemão das Relações Exteriores, Heiko Maas, que tematizem as violações aos direitos humanos que ocorrem na Turquia durante a planejada visita do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, à Alemanha.

A prisão de Tolu foi uma das muitas questões que dividiu as relações entre Alemanha e Turquia, nos últimos três anos. O ministro Maas afirmou que ao menos sete alemães estão sendo detidos injustamente “por razões politicamente motivadas e incompreensíveis para nós”. Já a Alemanha criticou fortemente a repressão do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, a dissidentes.

O resultado do julgamento

No dia 16 de outubro deste ano, Mesale Tolu voltou para a Turquia. Enquanto não ia a julgamento, a jornalista publicava em seu Twitter mensagens de solidariedade a outros jornalistas presos, além de campanhas para ajudar na sua própria libertação. Mesale Tolu chegou a criar um site, onde falava sobre outros jornalistas presos.

Ela e o marido foram julgados no mesmo dia. Ambos foram libertos e puderam voltar para a Alemanha. Mas a jornalista ainda afirma que não irá sossegar até que todos os seus colegas de trabalho estejam livres.

Mesale ainda publicou um artigo para a SZFamilie sobre como é ser mãe dentro da prisão.

Mesale e seu marido libertos no dia 16 de outubro

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