O preço do fotojornalismo
#FreedomForShawkan, uma campanha para libertar um fotógrafo detido no Egito. Por Emily Mallorca e Bruna Rohleder
Com marcantes traços egípcios, de olhos fundos, rosto longo e fino, o jornalista Mahmoud Aboud Zeid ou Shawkan, 29 anos, ficou conhecido por carregar sua câmera para onde estivesse. Além de sua companheira, o jornalista, levará consigo para sempre o dia 14 de agosto de 2013. Pois, foi o dia em que perdeu sua liberdade, a de expressão e a de andar livremente com sua câmera pelas ruas.
De acordo com a Anistia Internacional, Shawkan foi preso em seu país de origem, no Egito, enquanto cobria a dispersão violenta das forças de segurança do governo diante um protesto pacífico no Cairo, capital do país, na praça Rabaa Al-Adawiya.
Na prisão, Shawkan foi espancado, torturado e teve sua câmera e celular confiscados. Atualmente, o jornalista está há mais de três anos na prisão sem condenação. Ele é acusado de assassinato, pertencimento a grupo proibido (a Irmandade Muçulmana), participação em manifestação ilegal e posse de armas. Shawkan pode ser condenado à prisão perpétua ou pena de morte.
O código penal egípcio estipula um máximo de dois anos para os indivíduos presos sem julgamento. Em setembro de 2015, o caso de Shawkan foi encaminhado ao tribunal, portanto, o fotojornalista teve seu julgamento adiado sem motivos específicos.
Jornalismo
Antes de ser preso, Shawkan trabalhou para veículos como Time Magazine, Die Zeit, BILD, Media Group e agência de fotografia Demotix. As imagens do jornalista são utilizadas até hoje por organizações de direitos humanos que incluem a Index on Censorship, Anistia Internacional, Open Democracy, IFEX e Global Voices.
“Sem essas fotos você não pode saber o que está acontecendo no Egito. Sem os fotógrafos e os fotojornalistas nós não saberemos nada. Tudo ficaria em branco” (trecho de carta escrita por Shawkan, em março de 2015, quando completou 600 dias atrás das grades).
O Egito
O Egito, país em que Shawkan foi preso, é dominado pelo Exército desde 1952. Mohamed Morsi foi o primeiro presidente a ser eleito democraticamente no país. Ele pertence à Irmandade Muçulmana, que é alvo de repressão por parte dos militares. Esse movimento luta para estabelecer as leis do Islamismo (“sharia”) com base para governos e unificar os países de povos muçulmanos, como nações do Oriente Média, Ásia e África.
De acordo com matéria do G1, em 2013, Morsi foi destituído do seu cargo pelo Exército e foi acusado por dirigir uma “organização ilegal” e “instaurar um governo ultra-extremista”. Ele foi condenado à morte, prisão perpétua e 20 anos de prisão em três casos distintos. No ano seguinte, Abdel Fatah al-Sissi foi eleito presidente democraticamente. Ele já fez parte do Exército e também é contra a Irmandade Muçulmana.
Após a destituição de Mohamed Morsi, em 2013, o Governo tem limitado a liberdade de expressão. A Anistia Internacional ainda afirma que no Egito, qualquer um que desafia a narrativa oficial das autoridades, critica o governo ou expõe violações de direitos humanos corre o risco de ser jogado na cadeia, frequentemente com duração indefinida, sem acusação formal ou julgamento.
Dados gerais sobre o Egito
- Dez jornalistas foram mortos desde 2011.
- Segundo a ONG Repórter Sem Fronteiras, o país ocupa o 161º do Ranking de Liberdade de Imprensa de 2017.
- O país se tornou uma das maiores prisões do mundo para jornalistas.
- Desde 2013, o governo de Sissi organiza uma caça aos jornalistas suspeitos de serem próximos à Irmandade Muçulmana, assim como uma “sissização” das mídias.
- Adotada em agosto de 2015, a lei antiterrorismo impõe aos jornalistas o respeito à versão oficial durante coberturas de atentados em nome da segurança nacional.
- Grande parte da região do Sinai é proibida aos jornalistas e defensores dos direitos humanos.
“Freedom For Shawkan”
O advogado de Shawkan contou ao Comitê para Proteção dos Jornalistas que o fotojornalista, mantido na prisão de Tora, no Cairo, foi diagnosticado com hepatite C e sua saúde está se deteriorando cada vez mais, sem a presença de médicos no presídio.
A luta atrás das grades pode ser pesada para Shawkan, porém, ele não está sozinho. Amigos, família e a mídia têm se esforçado para chamar atenção de autoridades através da Campanha #FreedomForShawkan. Além do Facebook, a campanha segue no Twitter, na mídia e através de uma exposição em Nova York, em que um amigo de Shawkan apresentou as fotos tiradas pelo jornalista a fim de sensibilizar a população.
Shawkan foi destaque na campanha Press Uncuffed, que aumenta a conscientização sobre os jornalistas presos, liderados por estudantes de jornalismo da Universidade de Maryland em parceria com o Comitê para Proteção dos Jornalistas (CPJ).
O Comitê de Proteção para Jornalistas (CPJ) fez parceria com a produtora Egyptian See Media para produzir um documentário, Under Threat, que entrevistou a família de Shawkan.
O caso de Shawkan e de muitos outros jornalistas servem para mostrar que o jornalismo não é fácil e, ainda existem muitos lugares que não podem contar com a liberdade de expressão. Portanto, essa luta não é só deles, é de todos os jornalistas, para que possam registrar, sem medo, os fatos. E que a maneira de se fazer jornalismo seja livre, seja solta, assim como Shawkan e outros jornalistas presos, injustamente, devem ser para seguir mostrando, aqui fora, o cotidiano do cidadão.