Preso no estádio

Alex Torrealba
Jornalismo não é  crime
4 min readNov 26, 2018

Um jornalista chileno que foi preso em estádio de São Paulo por culpa da violência entre torcedores

(Foto: Reprodução/Facebook)

O espetáculo do futebol dificilmente consegue ser superado por outros fatores existentes no estádio. No entanto, infelizmente, isso aconteceu no dia 05 de maio de 2017, quando Corinthians e Universidade Chile se enfrentavam pela Copa Sul-Americana, na Arena de Itaquera, zona leste de São Paulo. Uma briga entre torcedores chilenos, no setor Sul do estádio, resultou em 26 prisões pela Polícia Militar.

Entre um dos detidos estava Cristopher Antúnez, 27 anos, jornalista chileno que estava fazendo a cobertura da partida para rádio La Magia Azul, a qual cobre exclusivamente a “La U”, como é conhecida a Universidad Chile. Ele estava localizado nas arquibancadas junto da torcida do Corinthians, com credenciais e devidamente registrado, até o momento que começou uma confusão entre torcedores chilenos entre si no setor visitante.

Antúnez estava comprando um lanche ao final do primeiro tempo, e se deparou com o tumulto. Ele pegou seu celular para registrar o que estava acontecendo e publicou em sua conta oficial no Twitter um vídeo do ocorrido.

“Avancei uns metros e vi que estavam colando um torcedor, vendado e muito machucado, em uma ambulância fora do estádio. De imediato comecei a gravar e perguntar sobre sua prisão”, contou o jornalista. Imediatamente, policias bateram em Antúnez, fizeram ele subir na mesma ambulância do outro homem e o colocaram em uma sala da Arena. “Expliquei diversas vezes que era jornalista credenciado, mostrei minha pulseira que provava isso, mas eles só me xingavam e me batiam”, disse o jornalista, que tentou conversar com o Capitão da PM, mas parecia estar falando com uma parede.

De acordo com matéria do portal UOL, outros jornalistas chilenos tentaram ajuda-lo explicando aos policiais que Cristopher estava só gravando a confusão. Os colegas de profissão que estavam trabalhando na partida também tentaram contato com o consulado do Chile em São Paulo, mas não tiveram sucesso imediato.

Antúnez acabou ficando em cela diferente dos outros 25 torcedores chilenos que estavam com ele na delegacia. No entanto, o jornalista contou que, apesar disso, “foram horas difíceis porque você fica se perguntando que merda está fazendo ali”. Seu confinamento durou 14 horas e ele revelou detalhes de tudo que aconteceu:

“Tudo é feio, quando tiraram fotos minhas como se eu fosse um delinquente, quando me contaram como violentaram selvagemente outros presos, e tantas outras coisas que eu prefiro esquecer. Foi uma experiência muito negativa, seguramente foi o pior dia da minha vida”.

Antunez foi liberado após intervenção do consulado chileno, e o jornalista agradeceu a preocupação e o carinho demonstrados.

Mais de um ano depois do ocorrido, Antúnez ainda aguarda uma explicação da Polícia Militar e do Corinthians, que era o mandante da partida. O jogo acabou sendo esquecido pelo jornalista, que acabou não vendo a vitória da equipe paulista por 2 a 0 contra La U.

Torcedores de La U são reprimidos por policias militares em São Paulo (Foto: Reprodução/Photosport)

A violência dos barra bravas

A confusão entre os torcedores chilenos não foi caso único no mundo do futebol. Tanto no Brasil, quanto em países da América do Sul, torna-se comum a violência entre torcedores de outros times e até mesmo entre a mesma equipe. Na América Hispânica são conhecidos com barra bravas — grupo de torcedores, ou indivíduos que fazem parte do mesmo, organizados dentro de uma torcida de um clube de futebol, e mais conhecidos por participarem de incidentes violentos dentro e fora dos estádios.

Em muitos países latinos estão sendo realizadas prevenções duras a esses grupos de torcedores. No Brasil, por exemplo, mais especificamente em São Paulo, os clássicos estaduais têm apenas a presença da torcida mandante. Outro exemplo mais recente foi a final da Libertadores de 2018, entre Boca Juniors e River Plate, a qual teve torcida única em cada jogo disputado, e mesmo assim muitas confusões ocorreram.

No Chile, as barra bravas também são presentes nos grandes clubes. A responsável pelo tumulto que resultou na prisão de Cristopher Antúnez foi a torcida conhecida como Los de Abajo, a qual frequentemente está envolvida em confusões em outros estádios, tanto do Chile, quanto de outros países. Até por isso, em 2014, na Copa do Mundo realizada no Brasil, foi proibida a entrada de qualquer barra brava, não importando o país de origem, para evitar tumultos nas ruas e nos estádios.

Para o jornalista argentino Daniel Scioli é “imprescindível ter uma lei para enfrentar os barra bravas”. Atualmente existe tecnologia capaz de reconhecer os causadores de tumultos e, assim, proibi-los de frequentarem estádios novamente. Somente com leis e prevenção que jogadores, torcedores e jornalistas terão paz para fazer seus respectivos trabalhos e deixar o espetáculo para dentro do campo de futebol.

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