Tailândia: o país onde ofender o rei pode levar a 15 anos de prisão

Isabela Tomain
Jornalismo não é  crime
3 min readJul 4, 2017

Com uma das leis de Lèse Majesté mais rígidas do mundo, todo cuidado é pouco ao publicar um artigo no país.

Somyot Prueksakasemsuk é um ativista e editor de revista tailandês que foi sentenciado a 11 anos de prisão pela publicação de dois artigos de ficção. Essa frase parece absurda, mas é a realidade que os jornalistas enfrentam na Tailândia. Após diversos golpes de Estado, a população tem cada vez menos liberdade para se expressar.

Somyot Prueksakasemsuk

Em 2006, as Forças Armadas Reais da Tailândia lançaram um golpe de Estado contra o governo do Primeiro Ministro Thaksin Shinawatra. Ao longo dos anos, o novo governo realizou uma série de proibições, além de ter estabelecido uma forte censura e tomado controle dos meios de comunicação. Os que se opunham ao regime criaram a Frente Unida para a Democracia contra a Ditadura, em que os membros são conhecidos por “Camisas Vermelhas”. Somyot faz parte desse grupo.

Somyot era em 2010 o editor da revista Voz de Thaksin, quando publicou, sob pseudônimo, dois artigos sobre um personagem ficcional. A monarquia alegou que tal personagem, na verdade, representava o Rei Bhumibol Adulyad, fazendo então com que a Primeira Corte Criminal de Bangcoc o prendesse sob as alegações de violação da lei de Lèse Majesté e difamação. Mas ativistas especulam que o verdadeiro motivo da sua prisão é a sua participação e importância entre os “Camisas Vermelhas”.

A lei de Lèse Majesté da Tailândia protege os membros mais altos da monarquia contra insultos e ameaças, é considerada uma das mais rígidas do mundo e vem cada vez mais sendo usada. De 1990 a 2005, a justiça tailandesa analisou aproximadamente 5 casos de Lèse Majesté por ano. Em contrapartida, de 2006 a 2011, houve um surto de casos, com mais de 400 sendo julgados.

O artigo 112 do código criminal do país diz que ameaças, difamações e insultos ao rei, rainha, herdeiros ou regente serão punidos com até 15 anos de prisão. Ativistas acreditam que essa lei está cada vez mais sendo usada com motivações políticas e para perseguição dos Camisas Vermelhas e outros indivíduos que apoiam o antigo Primeiro Ministro. E o artigo 112 segue sendo a principal arma de dissuasão para jornalistas, blogueiros e ciber-cidadãos por excelência.

A condenação de Somyot foi recebida com reprovação pela comunidade internacional, que interpretou o episódio como uma violação ao direito de liberdade de expressão. A Tailândia, atualmente, ocupa a posição 142 entre 180 países na Classificação Mundial da Liberdade de Imprensa da ONG Repórteres Sem Fonteiras. Mais de 200 representantes de ONGs e corpos diplomáticos compareceram à Primeira Corte Criminal para acompanhar a sentença. Dentre os grupos que se levantaram em defesa ao jornalista, estão a Anistia Internacional e a Federação Internacional de Direitos Humanos e vários protestos eclodiram não somente na Tailândia como em diversos outros países da Europa.

Somyot já cumpriu alguns anos da sua sentença, mas os esforços para tirá-lo da prisão não se esgotaram. Os advogados continuam com apelações, e Somyot já deixou claro que ele não procura um perdão real.

EDITADO: depois de cumprir sete anos de prisão, Somyot Prueksakasemsuk foi libertado em abril de 2018. Em entrevista a uma emissora de TV, disse que sua prisão chamou a atenção do mundo para a questão dos direitos humanos na Tailândia, e que se ressentia por não ter encontrado a democracia, mas sim um lugar controlado por rígidas ordens do governo.

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