Planejamento, pessoas e Clube da Luta.

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Jovens Planners
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5 min readSep 10, 2015

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Por Camilla Mota

Somos planejadores, estrategistas e muitas outras coisas. Mas, acima de tudo, somos pessoas, seres específicos e impossíveis de ser catalogados ou colocados em caixas e índices. Da mesma forma que nos sentimos únicos e especiais, a maioria das pessoas se sente assim, mas muitas vezes desconsideramos essa complexidade e tendemos a traçar perfis de pessoas baseados em hábitos e padrões de consumo que nada tem a ver com quem aquela pessoa é, no que ela acredita ou como vê o mundo e os produtos.

Vamos abrir a mente e entrar no Clube da Luta.

De uns tempos pra cá, sempre que vou pensar em públicos de uma campanha procuro pensar no Clube da Luta — uma sábia herança do Bootcamp — e em como as pessoas podem não ser tão simples e previsíveis quanto aparentam.

Jack, visto superficialmente, poderia ser classificado como homem, 35+, executivo, classe C e que sofre de insônia, e assim estaríamos ignorando todo o potencial que Tyler tem a nos apresentar.

Acredito que as pessoas são múltiplas, cheias de seus Tyler’s que, quanto mais sentem que estão sendo enquadradas em um perfil, tendem a se distanciar dele por não se reconhecerem sendo somente isso ou aquilo.

Num dado momento Tyler diz: “você não é o seu emprego, nem quanto ganha ou quanto dinheiro tem no banco, nem o carro que dirige, nem o que tem dentro de sua carteira, nem as calças que veste.”.

E é isso:

Pessoas não se resumem ao que elas compram ou no que trabalham, quantos anos tem, atividades que praticam. Pessoas são a união de Jack’s e Tyler’s, são somas de tudo e jamais iguais e comparáveis.

Tá, mas e aí, o que vamos fazer já que temos que pensar estratégias eficientes para pessoas tão especificas? Sinceramente, eu acredito que os jobs também são complexos e que cada caso é um caso que não deve ser classificado dentro de uma formulazinha mágica. Mas, acho que o olhar sobre as pessoas faz com que uma estratégia, mesmo que massiva, seja realmente eficiente a ponto de gerar identificação.

Só de você entender que ser praticante de esportes radicais não é a mesma coisa que ser alpinista ou praticar rapel, que um empresário pode ser tanto um cabeleireiro quanto um dono de multinacional, que algumas pessoas andam de ônibus por opção e que outros andam de bike por falta de opção, já é uma grande coisa.

Me parece muito mais interessante saber por que a pessoa sonha em ter uma casa própria ao invés de saber que esse é o maior sonho do brasileiro, muito mais expressivo saber o motivo do happy hour do que o que estão bebendo, e muito mais envolvente perceber como os pais se sentem sobre a distância dos filhos do que o número de divórcios no Brasil.

Pessoas não são números, não são caixas, não são coisas.
Pessoas são gente como a gente, “feitos da mesma matéria orgânica em decomposição, como tudo no mundo”.

Isso muda o jogo. E seguindo o que Tyler dizia, que “só depois de perdermos tudo é que estamos livres para fazer qualquer coisa”, temos então que aprender a fazer as perguntas certas, outra herança do Bootcamp.

O Clube da Luta nos ensina a mudar o olhar, ver por outro ângulo. E diante de uma nova ótica, os mesmos dados disponíveis podem virar informações preciosas e realmente relevantes. Sempre penso o quão genial foi a pessoa que cruzou os dados do Bolsa Família com o aumento de divórcios em classes mais baixas e identificou um expressivo número de mulheres que se tornaram independentes através deste benefício, por exemplo, podendo se libertarem de um casamento infeliz ou abusivo.

Sempre penso também no caso, apresentado a mim pelo Fernando Diniz (CSO na DPZ&T) durante o Bootcamp, dos leões que passaram a atacar pessoas por conta de seus hábitos religiosos.

Isso é pensar diferente, é enxergar os Tyler’s.

Claro que pensar assim dá muito mais trabalho e exige muito mais tempo, coisa que normalmente nos falta. Porém, tenho a impressão que tendo esse entendimento menos superficial sobre as pessoas com quem iremos falar, já estamos com 80% do trabalho feito.

Dedicar-se a isso não é perder tempo, é ganhar conhecimento.

E é aí que começa a parte mais difícil, pra mim, nesta tarefa: desapegar das fórmulas, deixar de ver as pessoas como “homens/mulheres, 45+, classe A/B, praticantes de esportes e moradores de São Paulo”.

Acreditem, amigos: é bem mais difícil do que parece, já que fazer isso muda toda a forma de planejar e pensar uma campanha, de olhar para o produto e entender como ele interage com as pessoas. Mas, “sem dor, sem sacrifício, nós não teríamos nada” e não seriamos quem somos. Afinal, “esta é a sua vida e ela está acabando um minuto de cada vez”.

Essa é nossa vida: pensar, observar, olhar além do óbvio, ver o que mais ninguém vê, abrir as caixas e olhar o que está lá dentro.

Isso é muito importante para que sejamos eficientes e não dizermos o que o cliente já sabe, o que a criação já percebeu e o que a mídia já identificou. Tenho ouvido muita gente falar da importância das marcas tornarem-se relevantes e isso somente me parece possível se você souber o que é relevante para aquelas pessoas sem pré-julgamentos ou achismos, sem fazer pensando em você mesmo, sem olhar somente para o Jack de cada um.

E isso serve para nós, planejadores, que temos que todos os dias nos mostrar relevantes dentro da agência. Para tanto, precisamos aprender a identificar o que realmente pode fazer diferença para a campanha. Pra mim, isso significa olhar e entender as pessoas em sua forma mais complexa que torna uma comunicação mais poderosa e assertiva. É lembrar que todo Jack tem um Tyler, e que não perceber isso pode fazer “tudo o que você mais ama o rejeitar ou morrer. Tudo o que você já criou ser jogado fora. Tudo de que você mais se orgulha terminar em lixo.” Ou seja, propaganda sem resultado.

Ah, e uma última coisa que guardei:

“Aprenda a viver, descanse quando morrer. Tudo que você precisa está dentro de você.”.

Será? Tenho procurado muitas coisas em mim, mas confesso que observar o que há dentro de outras pessoas tem se tornado muito mais interessante.

por Camilla Mota: planner na Sr(a) Silva e fanática por desenhos animados e histórias surpreendentes.

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