Odallus: The Dark Call

Kinho Costa
Juiz Cachorro
Published in
4 min readFeb 23, 2016

Uma das coisas de Castlevania: Symphony of the Night que mais me cativaram quando o joguei pela primeira vez lá pra 2000 ou 2001 foi o seu fluxo. A forma de progressão entre seus objetivos não era exatamente nova, mas seu ritmo tornava tudo mais dinâmico e coeso do que qualquer outra coisa que eu tivesse jogado naquela altura. O desenrolar de suas principais ações — descobrir power ups para abrir novos lugares, novos bosses e tudo mais — acontece de forma que o interesse em descobrir mais sempre se renove. Nenhuma de suas etapas se desenvolvia exatamente igual as anteriores, o que fazia com que dificilmente eu me enjoasse ou olhasse pra outros jogos e encontrasse formulas similares, como padrões e chavões que se repetem e tornam esse jogo diferente daquele. Todos os desafios propostos introduzem ou reutilizam conceitos de formas diferentes, sem que o todo deixe de ser sinestésico. Os resultados destes desafios sempre estavam em forma de jogo. Ou melhor, ‘mais jogo’. Não ‘mais jogo’ somente em quantidade, de forma que agrade a quem balbucia desesperadamente sobre o tal do “Fator Replay” tão presente em análises, mas de uma forma que fazia com que cada nova área fortalecesse tanto o avatar — no caso, o boneco que você controla — quanto o seu mundo.

Esse é o fluxo básico que compõe o design de bons metroidvanias e o que torna SOTN tão especial. Impor um ritmo onde suas principais ações não se tornam banais e, consequentemente, desinteressantes é uma das coisas mais difíceis de se alcançar. Se analisarmos o fluxo de SOTN, seria: exploração -> combate -> descoberta, repetindo e repetindo até a sua conclusão. A grande sacada de SOTN é não resumir o seu ciclo apenas nestas ações aproximando-as e integrando-as umas nas outras. Tudo isso é passado no simples ato de jogar. Não há uma exigência de se masterizar conceitos complexos para que o jogo comece a se expandir e a captar a atenção de quem o joga. É algo que parece simples, mas é o ponto principal de toda a proposta. Odallus: The Dark Call se espelha nestes aspectos para se tornar o Castlevania que nós queremos por as mãos há tanto tempo.

Um fato é que a gasolina de todo metroidvania é o seu level design. Um dos aspectos que mais me chamaram a atenção em Odallus foi o seu mapa. Ao bater o olho, automaticamente lembrei de outro Castlevania: o IV. Super Castlevania IV não possui a mesma estrutura aberta de SOTN. São fases numeradas e sequenciais, sem muito a ser explorado além do caminho natural a se seguir. Por conta disso, a princípio, não esperava que seus cenários fossem ser tão expansivos, a ponto de não serem lineares (inclusive com fases secretas) mesmo com a estrutura numerada. Existe um contador de segredos em cada fase e foi aqui, quando percebi que não era possível coletar todos eles na primeira jogada, que me lembrei de SOTN.

Vê, o jogo faz questão de mostrar um mapa com um caminhando trilhado entre aquelas bolinhas das fases, mas isso não quer dizer que exista uma linearidade implícita. Você vai e volta das fases quando quiser, ou quando conseguir tal power up que o motivará a revisitá-las. Aliás, é importante destacar: as fases são bem singulares e ainda assim conseguem manter uma coesão no todo. A variedade não só as torna marcantes por si só como também facilita o backtracking. Ao encontrar vários dos power ups espalhados pelo jogo, é possível identificar quase que instantaneamente aonde seria necessário voltar para desbravar os cenários e encontrar, além de power ups, mercadores e monolitos que descrevem os acontecimentos daquele mundo.

Ah, é claro. A tal da narrativa. Ela existe sim, de forma discreta, porém orgânica. Aqui, Odallus está mais próximo de Super Metroid, que não tinha diálogos ou textos após sua tela inicial, do que de SOTN. Odallus não segue isso a risca pois seus textos e diálogos, embora discretos, ainda existem, porém não acontecem de forma inerente até o último chefe, tendo apenas uma cutscene no começo e outra no final. O sentimento de solidão e abandono não é o mesmo de Super Metroid, porém o entendimento e compreensão de seu mundo fica mais a critério do jogador do que entregue diretamente pelo decorrer de seus eventos.

A impressão que eu tive jogando Oniken e agora com Odallus é que a Joymasher teve aquele sentimento de “É o jogo que eu sempre quis jogar, então eu o fiz” quando produziu esses jogos. Existe um respeito muito grande com suas (ótimas) influências. É uma característica marcante dos jogos da Joymasher, que imprimiu com excelência uma identidade mais próxima de Ninja Gaiden e Hokuto No Ken em Oniken. Importante dizer: Odallus não é, de forma alguma, genérico. Porém, senti falta de uma pegada mais autoral e um pouco mais desprendida de suas inspirações, tanto em conceitos de design como em estética. Entender, estudar e respeitar o legado de suas influências é nobre, e nisso a Joymasher é muito competente, porém tenho curiosidade para ver como seria algo mais original vindo do estúdio. É como nos próprios metroidvanias. As vezes a gente precisa fazer mais pra se descobrir mais e usarmos melhor nossas virtudes, aprendizados e, por que não, nossos defeitos em prol da evolução.

Odallus talvez seja exatamente o Castlevania que as pessoas tanto pediam. Com certeza é o que eu queria. Se me dissessem isso em 2001 depois de ficar “orfão” de SOTN, eu não acreditaria. Se me dissessem que seria brasileiro então, duvidaria mais ainda. Mas resumir somente a isso seria injustiça da minha parte. Prefiro ver Odallus como um filho pródigo não apenas de Castlevania, como também de Demon’s Crest, Berserk e, por que não, de Thundercats.

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