Crítica: Gangsters a Dobrar em Lendas do Crime

Ana Rita Costa
Jump Cuts
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4 min readFeb 1, 2016

Edward Norton (Leaves of Grass (2009)), Lindsay Lohan (The Parent Trap (1998)), Leonardo DiCaprio (The Man in the Iron Mask (1998)), Marion Cotillard (Les Jolie Choses (2001)), Armie Hammer (The Social Network (2010)) e mais uns quantos partilham agora um laço inquebrável com Tom Hardy. Alguém olhou para eles e achou que tinham estaleca para serem gémeos de si próprios. Sejamos honestos, filmes com gémeos interpretados por um única pessoa são sempre fascinantes. Nem que seja só pelas cenas em que falam um com o outro e podemos cair no capricho de imaginá-los a fazer metade do diálogo para uma parede. Eu também prefiro conceber que filmá-los seja igualmente hilariante.

Poucos teriam o estofo de Tom Hardy para dobrar o papel de gangster. O homem com uma incapacidade crónica de falar num tom normal, entrou em Legend (Lendas do Crime, em português) com duas vozes igualmente questionáveis. A minha mãe sempre me ensinou a não falar para dentro, chegou o Tom Hardy e fez disso uma marca, deformou-a para The Dark Knight Rises (2012), renovou-a em Mad Max: Fury Road (2015) e não sei o que raio fez neste, mas acredito que resultou.

Legend conta a história dos gémeos Reggie e Ronnie Kray, duas grandes figuras da história do crime britânica. O argumento é baseado no livro de John Pearson “The Profession of Violence: The Rise and Fall of the Kray Twins” e, caso queiram perceber melhor o papel que estes dois tiveram enquanto gangsters, este filme é inútil. Digo isto com todo o carinho possível. A verdade é que podiam ser os Kray ou qualquer outro par de gémeos com tendências homicidas. A qualidade de gangster serve mais como um traço de personalidade dos protagonistas do que qualquer outra coisa. Mas, tudo isso toma parte do encanto de Legend.

Ronnie é uma amálgama de esquizofrenia, paranoia e homossexualidade assumida (uma destas não é uma doença do foro psicológico), uma amálgama hilariante. Da cena que falhou a classificação de tiroteio à sessão de pancadaria fraterna, o clássico poupa-se à comédia fácil, as piadas são inteligentes, mas não tocam o snobismo. É diversão de qualidade, sem merdas.

Reggie mostra as suas cores à chuva numa das minhas cenas preferidas. As suas mudanças marcam o compasso da ação, este é o gémeo preferido. Também devia ser o gémeo são, mas Ronnie bate-o em consistência. Quem é o maluco afinal?

Não faltam bónus no elenco de Legend. Christopher Eccleston dá um ar de sua graça do lado de fora da TARDIS (é o meu Doctor preferido, deixo-vos julgar esse traço de carácter como preferirem) e isto não era a mesma coisa sem aquele gajo de Kingsman, aquele loiro, mais ou menos desta altura, que não tem nenhum traço físico diferenciador. Taron Egerton veio confirmar a sua rebeldia na tela, o meu medo é que a sua versatilidade se fique pelos esgares de adolescente.

Encaixa na nossa obsessão em glorificar criminosos e permite-se ao romance mais ou menos corriqueiro que agrada a toda a gente. Se essa não é uma das dicotomias máximas do público atual, não sei o que será. Misturar contendas de gangsters com brigas entre irmãos e problemas conjugais é receita para vulgarizar uma trama destas? Talvez. Mas, qual é o vosso problema com filmes simples? Legend é um daqueles que se pode apreciar pela sua simplicidade e, se daqui a uns anos passar na televisão, garantirá um agradável par de horas àqueles que rejeitarem o zapping.

Já agora, “Something Stupid” só pode ter sido a canção predileta lá para os lados de Hollywood em 2015.

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Ana Rita Costa
Jump Cuts

Full time Storyteller and Dream Maker, part time Genius. Also, extremely Modest.