CRÍTICA: Iguais, de Drake Doremus

Onde o romance se confunde com a depressão, e tudo é terrível.

João Silva Santos
Jump Cuts
4 min readJul 3, 2016

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O ser humano muito gosta de distopias futuristas. Permitem-lhe redefinir-se e reinventar-se aos olhos da audiência, obliterar os erros do passado para os voltar a cometer num futuro não muito distante.

Este tipo de histórias salta entre o niilismo resoluto e o pessimismo diligente: em Mad Max: Estrada da Fúria (2015), o homem — o ser masculino — continua a dominar e destruir um mundo que já sofreu demasiado às suas custas; em Snowpiercer (2013), a guerra de classes é perpetuada mesmo quando o planeta está no fim dos seus dias. A vontade de reescrever a história do ser humano ou, aliás, de a reinterpretar através do futuro, é sempre ultrapassada pelo derrotismo que nos é intrínseco como espécie. Queremos imaginar um futuro melhor, sem os problemas de hoje, mas acabamos por repetir os mesmos erros de sempre.

Iguais pertence a este tipo de filmes distópicos, mas tenta distinguir-se do mainstream ao centrar-se na relação amorosa dos seus dois protagonistas, e na própria necessidade de conexão do ser humano.

Em Iguais, Silas (Nicholas Hoult) é um ilustrador que vive numa Terra onde as emoções da humanidade foram suprimidas geneticamente. Não há romance, não há paixão; ninguém sente nada por ninguém. São todos — dun dun dun — iguais uns ao outros. Então, é infetado por uma doença (S.O.S — switched on syndrome), e apaixona-se pela sua colega de trabalho, Nia (Kristen Stewart).

Tanto Hoult como Stewart são MVPs deste tipo de romances impossíveis: Hoult já protagonizou um zombie romântico em Sangue Quente (2013), e não podemos esquecer a oh-tão-amada Bella da saga Crepúsculo, que preencheu o calendário de Stewart durante meia década. Porém, nos últimos anos, ambos têm experimentado bastante e crescido como atores, culminando em Iguais com duas performances sólidas e texturizadas, que só pecam por não conseguirem elevar o guião do seu aborrecimento sensaborão.

O que é pena, porque de um ponto de vista meramente estético, este quinto filme de Drake Doremus é um autêntico regalo. Os tons azulados e alaranjados que coloram os vários cenários servem para contrastar com o interior acinzentado das personagens, criando inúmeros pontos de interesse visuais mesmo quando a história se arrasta pela metafórica lama. A trilha sonora (composta pelo músico de eletrónica Apparat e Dustin O’Halloran) eleva cenas injustificadamente melodramáticas, puxando os nossos cordelinhos emocionais, em vez de só sentirmos apatia perante todas as lágrimas e soluços que Stewart e Hoult vão dando ao longo do filme.

Porque, caramba!, são necessárias tantas lágrimas assim? Quer dizer, Silas é um homem cujas emoções despertam num corpo geneticamente predisposto para as ignorar — um símbolo da necessidade inextricável do ser humano em se relacionar com os outros — , e tudo o que faz é sentar-se deprimido em cantos e chorar o seu amor por Nia?!

É aqui que a realização de Doremus mais peca. O cineasta californiano quer contar uma história do “despertar dos sentidos”, do “amor no Homem”. Em vez disso, enche o seu filme de aborrecimento existencial e depressões constantes. Não há sexo, música, alegria, joie de vivre; a relação de Silas e Nia baseia-se em beijinhos tímidos misturados com lágrimas em catadupa. Eles não estão apaixonados — estão perturbados, tristes. O que despertou neles não foi romance, foi dor. Doremus contradiz-se constantemente, tornando desnecessariamente confuso um filme que durante 50% da sua duração não é nada mais que sentimentalismo enfadonho. Demonstra um ponto de vista demasiado cínico e amargo que não combina com o estilo romântico e jovem que Iguais parece almejar.

No fim, Iguais falha redondamente no que pretende dizer à audiência, apelando à supressão do sentimento humano em vez de o celebrar. Recomenda-se apenas pela sua palete de cores extremamente apelativa e pela dupla de interpretações centrais, nada mais.

A não ser que gostem muito de ver duas pessoas bonitas a chorar. Para isso vale a pena.

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